O GLOBO - 20/08/11
Por mais que os principais líderes da base aliada, e em especial a própria presidente Dilma Rousseff, tentem esvaziar de sentido político a luta contra a corrupção, transformando a já célebre "faxina ética" em uma invenção da mídia, ou consequência natural de casos pontuais de denúncias, sem que haja um combate sistêmico determinado como agenda política do governo, o processo dificilmente será estancado, embora já esteja claro que ele pode se transformar em "fogo de palha" sem um forte movimento da sociedade.
É sintomático dessa tentativa de esvaziar de conteúdo esse combate à corrupção a atuação, que parece orquestrada, dos ministros que substituem os demitidos por escândalos.
Todos eles fazem rasgados elogios a seus antecessores e minimizam os "problemas" em suas pastas, como se os antecessores tivessem saído do ministério sem motivações graves.
Esse comportamento pode ser um péssimo sinal de conivência.
O envolvimento de diversos setores da sociedade, aliás, já aparece em variadas manifestações nas redes sociais, que repercutem desde iniciativas isoladas a institucionais, com o lançamento, na quarta-feira da semana que vem, do "Observatório da Corrupção", pela OAB federal, com adesão da CNBB e de diversas outras entidades.
Há também uma manifestação pública sendo articulada por diversos grupos da sociedade civil para o dia 20 de setembro na Cinelândia, no Rio.
No âmbito legislativo, não são apenas senadores independentes que se mobilizam. Um grupo crescente de deputados, a partir da Frente Suprapartidária contra a Corrupção, cobra prioridades na pauta para a votação de projetos que apertem o cerco contra os ladrões do Erário.
A crise política brasileira deriva de tensão em dois planos, na análise do deputado federal Chico Alencar, do PSOL: a do governo com sua base clientelista predominante, em inédita "greve legislativa" na Câmara pelo pagamento das emendas e contra investigações sérias em ministérios, e a do Estado republicano, com a corrupção sistêmica e larvar, que está enraizada em todas as instâncias do Poder Público - e capturando as instituições.
Por isso, um grupo suprapartidário de senadores e deputados está fazendo um périplo em vários órgãos de controle para conferir o estágio das investigações. Na CGU, avisaram ao ministro Jorge Hage que entendem que a Controladoria Geral "é da União e não do governo de ocasião".
Irão também à Procuradoria Geral da República, ao Tribunal de Contas da União e à Polícia Federal. Dentro desse mesmo espírito, que é, afinal, o de defender o Congresso, o deputado federal Miro Teixeira, do PDT, disse ao ministro do STF Luiz Fux que os parlamentares esperam que o Supremo julgue com rapidez os processos contra políticos, para que fique claro para a opinião pública quem é quem no Parlamento.
Dentro desse mesmo espírito, que é o de servir ao público e não à corporação, o PPS e o PSOL apresentarão o nome do auditor Rosendo Severo, indicado por várias entidades da sociedade civil, como Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, Auditoria Cidadã da Dívida e Instituto Ethos, à vaga aberta no TCU, a ser preenchida por decisão, em voto secreto, dos deputados.
Outras medidas que serão apoiadas por esse grupo suprapartidário:
Rediscutir as emendas orçamentárias individuais, fonte reiterada de clientelismo e desvio de recursos;
Insistir na cobrança junto ao presidente da Câmara, deputado Marco Maia - que tem se mostrado reticente -, para que coloque na pauta os vários projetos de lei, já prontos para serem votados, que ampliam a transparência e o controle na gestão pública;
Reforma política substantiva;
Estímulo à mobilização da sociedade contra a roubalheira e por democracia real.
Esse grupo suprapartidário vai insistir na Comissão Parlamentar Mista da Corrupção, cujo requerimento alguns da base já assinaram por convicção, e vários outros, por mera chantagem.
A adesão à petição popular em apoio à CPI Mista da Corrupção cresce a cada dia, e por si mesma representa mais uma pressão popular para que o combate à impunidade aconteça, mesmo que a CPI não tenha assinaturas suficientes para ser convocada.
Ao mesmo tempo em que deputados da base aliada assinam ou insinuam estar dispostos a assinar a CPI, há na oposição um desentendimento sobre a melhor ação a tomar.
Enquanto o senador Álvaro Dias, do Paraná, critica o apoio da oposição às ações do governo Dilma no combate à corrupção, acusando-as de serem meras mistificações, e quer a CPI, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que não tem rejeitado sinais de apoio à presidente Dilma, teria aconselhado o PSDB a não insistir na CPI para não enfraquecer o trabalho que a presidente vem fazendo no combate à corrupção.
Há muitos na oposição que temem que a insistência em uma CPI da Corrupção possa tornar a presidente Dilma Rousseff refém dos políticos fisiológicos da base aliada e a force a recuar na tal faxina ministerial para conseguir a unidade de sua base política.
Entrevista:O Estado inteligente
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