O GLOBO
É um bom sintoma do amadurecimento da nossa democracia que não tenha tido a menor repercussão o comentário do presidente Lula sobre a possibilidade de ter um terceiro mandato na Presidência. Como quem não quer nada, Lula tirou do bolso do colete o tema do continuísmo com tal naturalidade que era como se fosse um assunto sobre o qual ele e o vice José Alencar conversam com frequência. A tal ponto Lula foi indiscreto que Alencar passou as mãos pela face, sorrindo, como se estivesse constrangido com a exposição em público dos desejos mais recônditos dos dois ou, quem sabe, nervoso pela revelação que não deveria ser feita.
Mas é sabido que Lula é um hábil manipulador da política, que não faz nada sem um objetivo, não prega prego sem estopa. Ele não faria um comentário daqueles simplesmente por ser um boquirroto.
"Poderia ser mais se o pessoal quisesse, não é, Zé, mas o pessoal não quer", lamentou-se um bem-humorado Lula, para depois adicionar mais tempero à sua fala: "Ficam discutindo o negócio aí de encurtar os mandatos, nós dois até que aguentaríamos mais uns cinco anos de batente, de batalha. Mas, como democratas, nós estamos quietinhos, vamos esperar o jogo ser jogado".
Foi a primeira vez que Lula admitiu que gostaria de permanecer no governo por mais um período. E, mais grave ainda, deixou no ar a possibilidade de que as regras do jogo ainda possam ser mudadas. Se não, qual seria o sentido de dizer que está "quietinho" esperando "que o jogo seja jogado"?
A que jogo ele se refere, às negociações sobre a redução do mandato presidencial para cinco anos? Esse é um assunto sempre levantado pelos tucanos, numa tentativa de compor melhor a base de sustentação da candidatura à Presidência da República.
Por essa tese, o governador de São Paulo se comprometeria a apoiar a mudança da regra eleitoral que permite a reeleição, com objetivo de garantir o apoio do governador de Minas, Aécio Neves. Com um mandato de cinco anos, sem direito à reeleição, o governador mineiro aceitaria, quem sabe, até ser o vice de Serra na eleição de 2010.
Houve um início informal de negociação, lá pela altura de 2007, entre PT e PSDB, onde esse tema foi colocado com todas as letras. Havia até mesmo a hipótese de prorrogação por um ano do mandato do presidente Lula, para que cumprisse os cinco anos de mandato, que valeriam para o seu sucessor.
Nesse caso, a prorrogação atingiria também os governadores e prefeitos em todo o país, mas a rejeição da opinião pública seria grande.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi quem abortou, dentro do PSDB, essa ideia, não apenas porque considera que o sistema de reeleição ainda precisa ser mais testado, mas porque temia que a mudança da regra eleitoral poderia dar a Lula um pretexto para tentar concorrer a um terceiro mandato consecutivo.
Com o fim da reeleição, e com um mandato de cinco anos, haverá sempre uma interpretação legal, advertia o ex-presidente, de que as mudanças eleitorais zeravam o jogo, que poderia ser jogado a partir daí até mesmo por Lula novamente.
Não ficou claro se Lula se referia a essa possibilidade quando disse que iria esperar que o jogo fosse jogado, e sempre será possível ao presidente refrasear seus pensamentos, tirando-lhes a carga de imprevisibilidade que, propositalmente ou não, deixou no ar.
Mas qualquer cidadão comprometido com as normas democráticas sabe que não há nada o que esperar, o jogo já está jogado e as regras já estão estabelecidas.
Se anteriormente, quando o prazo legal permitia que fossem feitas modificações na legislação eleitoral, não houve clima na opinião pública para que o debate sobre o terceiro mandato consecutivo prosperasse, agora a violência seria muito maior.
Estamos a menos de um ano da realização das eleições gerais de 2010 para presidente, governadores, deputados federais e estaduais e dois terços do Senado. Já não há o prazo legal para alterações, e tentar reduzir esse prazo com ele já vencido seria muito acintoso.
Já houve mesmo, na eleição de 2006, a tentativa de reduzir esse prazo para seis meses antes da eleição, e a iniciativa não prosperou porque não encontrou respaldo popular.
O presidente Lula passou o tempo inteiro negando que tivesse interesse em disputar um terceiro mandato consecutivo, embora se soubesse que, nos bastidores, não vetava iniciativas de deputados petistas muito ligados a ele, como foi o caso de Devanir Ribeiro, o mais notório dos defensores de um terceiro mandato.
Ao contrário do que recomenda a prudência política, Lula ainda nem terminara o primeiro ano deste seu segundo mandato e já estimulava o debate sucessório, mantendo a expectativa de poder em torno de si com mensagens contraditórias quanto a um eventual terceiro mandato seguido, ora negando essa possibilidade enfaticamente, ora deixando no ar frases indicando exatamente o contrário.
Como no dia em que, ao ouvir do ministro Franklin Martins que ele não estaria mais no Planalto quando determinado fato aconteceria, Lula deixou no ar o comentário, em meio à reunião do Conselho Político do governo: "Quem sabe?".
Ou permitindo que seu amigo, o deputado Devanir Ribeiro, insistisse na apresentação da emenda que autorizava o presidente a convocar plebiscitos sem autorização do Congresso.
O fato de o presidente voltar a esse tema inopinadamente, mesmo sem obter repercussão política, pode significar que já tema pela consistência da candidatura da ministra Dilma Roussef. Ou que queira reforçar a ideia de que, não sendo possível sua candidatura, o jeito é votar na sua representante.
Entrevista:O Estado inteligente
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