A polêmica legislação israelense determina que, para assumir o poder, um partido precisa do apoio de pelo menos a metade mais um dos deputados. Com a fragmentação do sistema partidário e a pulverização dos sufrágios (12 legendas terão cadeiras na próxima Knesset, por exemplo), os mais esdrúxulos arranjos se tornaram rotina na política nacional. Do que pode resultar, no caso presente, que Netanyahu, embora tecnicamente derrotado por Livni, com quem compartilha amargas rivalidades, seja o novo premiê, numa aliança que eventualmente inclua o próprio Kadima. Um terceiro cenário seria o do revezamento de ambos na chefia do governo.
O retrospecto indica que é mais fácil para Netanyahu atrair os partidos religiosos e, sobretudo, a força emergente da ultradireita nacionalista, o Israel Beiteinu, fundado pelo imigrante judeu moldavo Avigdor Lieberman - para quem os 20% árabes da população israelense devem ser objeto de medidas tais que eliminem a ameaça supostamente representada por eles para o Estado judeu. Inequívoco sinal dos tempos em Israel, o xenófobo Lieberman deixou de ser apenas uma expressão da parcela lunática da população do país para se tornar o dirigente de uma agremiação que acaba de conquistar mais cadeiras (15 a 13) do que o histórico Partido Trabalhista, reduto de uma linhagem de estadistas, de Ben-Gurion a Itzhak Rabin.
Qualquer que venha a ser, o desfecho das enoveladas negociações em andamento será desalentador para a solução do conflito árabe-israelense. A dura realidade, expressa sem a menor sombra de ambiguidade nas urnas, é que a maioria dos israelenses é contrária à criação do Estado palestino, a pedra de toque para a paz no Oriente Médio, que abriria caminho para a normalização das relações entre Israel e os seus vizinhos prevista no plano apresentado pela Arábia Saudita em 2002 e aprovado pela Liga Árabe. À época, quando a Autoridade Palestina era presidida por Yasser Arafat, o argumento israelense para justificar o status quo era a ausência de um "parceiro para a paz".
Arafat foi sucedido por Mahmoud Abbas - e nem o mais desconfiado dos israelenses poderia desejar um interlocutor mais confiável em uma negociação pela paz. Mas o governo de Israel não moveu uma palha para impedir que ele se tornasse uma figura cada vez mais irrelevante, desde que o seu partido, o Fatah, foi expulso da Faixa de Gaza pelo Hamas. Nada fez, por exemplo, para melhorar o cotidiano na Cisjordânia, cuja população precisa passar por intermináveis postos de controle para ir, por assim dizer, de uma esquina a outra. Principalmente, não conteve o crescimento dos assentamentos judaicos no território ocupado, que já reúnem 300 mil colonos.
A expectativa unânime entre os observadores imparciais, para não falar dos próprios palestinos moderados, é que o novo governo - cujo centro de gravidade oscilará entre a direita e a extrema direita - manterá a ocupação e as expansão das colônias, confiando na política de "retaliação desproporcional", adotada implacavelmente em Gaza agora há pouco, para dissuadir qualquer reação palestina. "A construção dos assentamentos vai continuar, as incursões vão continuar", desespera-se o veterano negociador palestino Saeb Erekat - e ninguém dirá que ele não sabe do que está falando.
Só há uma incógnita nesse sombrio horizonte: o fator Obama. O presidente dos Estados Unidos despachou um emissário para a região, o ex-senador George Mitchell, crítico da colonização na Cisjordânia, e deu início a um processo de reaproximação com o Irã. Israel não vê com bons olhos nem uma coisa nem outra.