Os investimentos dessas empresas oscilaram de US$ 28,6 bilhões em 2006 e US$ 18 bilhões em 2007 para US$ 20,5 bilhões em 2008. O processo de internacionalização, contudo, começa a dar sinais de arrefecimento. A recessão nas economias desenvolvidas, o desaparecimento das facilidades de crédito externo e a retração do consumo, consequências da crise econômica internacional, são responsáveis por essa atitude mais cautelosa por parte das empresas brasileiras, a exemplo do que ocorre com empresas de outros países.
Há, no entanto, dois outros fatores dificultando a expansão das empresas brasileiras no exterior.
Na pesquisa da Sobeet, a dupla taxação do lucro, no Brasil e no exterior, é apontada como uma das principais causas da perda de competitividade das companhias nacionais. Ao contrário de outros países, como Espanha e Japão, o Brasil não oferece nenhum incentivo tributário à internacionalização de suas companhias. Por isso elas procuram compensar esse desequilíbrio conciliando fatores como qualidade, produtividade, eficiência e baixos custos. Para as empresas brasileiras que decidem expandir seus negócios para além fronteiras não é fácil enfrentar a concorrência, assinala a pesquisa da Sobeet.
O Brasil dispõe hoje de 27 acordos para evitar a bitributação. Com aplicação complexa, a lista não inclui parceiros importantes, como EUA e Reino Unido. Quando embaixador no Reino Unido, recebi pedido formal de todas as empresas brasileiras sediadas em Londres para que o governo brasileiro abrisse negociações para assinar esse acordo, que iria beneficiar os executivos das empresas e as próprias empresas. O mesmo ocorreu quando estive em Washington. Passados 15 anos, a situação permanece inalterada e o Brasil continua sem negociar tais acordos.
Acontecimentos recentes envolvendo empresas públicas e privadas brasileiras na Bolívia e no Equador chamam a atenção para outro potencial obstáculo à expansão das empresas brasileiras no exterior: a ausência de tratado de proteção e garantia do investimento.
O Brasil assinou 13 acordos de garantia de investimentos para proteger investimentos estrangeiros em nosso país. Outros 16 já haviam sido assinados, mas o atual governo retirou esses acordos do Congresso Nacional, onde estavam em processo de ratificação, em função da não-aceitação da submissão das disputas sobre investimentos às cortes internacionais de arbitragem, do mecanismo de solução de controvérsias e das regras de indenização por expropriação. A inexistência de casos de nacionalização sem compensação e o fluxo regular e crescente de investimento externo direto, mesmo sem os acordos de garantia de investimento, também contribuem para retirar a urgência em negociar esses acordos.
A internacionalização das empresas brasileiras, sobretudo na América Latina, na África e na Ásia, demanda que se examine esse assunto sob outra perspectiva. O Brasil passou a assumir um papel de investidor, e não apenas receptor de investimento. Agora, as empresas brasileiras é que devem receber do governo apoio jurídico para evitar arbitrariedades de governos populistas que buscam inimigos externos para se fortalecer internamente.
No que se refere aos acordos de proteção e garantia de investimentos, a posição do governo até recentemente poderia ser explicada pelo reduzido número de empresas e pela consequente ausência de investimentos brasileiros significativos no exterior. Mas a situação nos últimos anos mudou radicalmente, com pesados investimentos brasileiros no exterior e com a repetição de problemas de cumprimento de contratos e de acordos. Em vista disso, o governo brasileiro deveria repensar sua análise e sua posição no tocante à inclusão desse tipo de acordo nas negociações prioritárias, especialmente com países da América Latina e da África.
O Conselho Estratégico da Fiesp examinou a delicada questão, tendo a presidência da instituição transmitido ao governo, em Brasília, a urgente necessidade da abertura de entendimentos sobre esse tipo de acordo.
O Brasil não dispõe de nenhum acordo de proteção e garantia de investimento com os países da América do Sul, onde os riscos para as empresas multinacionais brasileiras estão aumentando rapidamente. Quando Evo Morales ocupou, manu militari, duas refinarias da Petrobrás, o governo brasileiro não recorreu ao acordo de garantia de investimentos entre a Holanda e a Bolívia, recurso cabível, já que a compra foi feita por subsidiária da Petrobrás sediada nos Países Baixos.
Estando em jogo o interesse das empresas brasileiras no exterior, não propor a negociação de acordos que protejam os investimentos em nossos vizinhos ou nos países onde a atuação delas seja mais intensa só pode ser explicado por considerações ideológicas, que permeiam muitas das decisões de política externa.
A crescente projeção externa do Brasil tem aspectos muito positivos, como maior visibilidade e crescente responsabilidade externa, mas também tem aspectos negativos, como a percepção de que o País começa a atuar como uma "força imperialista" ou de dominação.
O Brasil tem de começar a se acostumar com o ônus da maior visibilidade e presença externa e as empresas nacionais têm de passar a contar, cada vez mais, com políticas públicas que apoiem sua continuada expansão no exterior.