O GLOBO
O caso do PAC paulista é exemplar da incapacidade da oposição de se opor ao governo do presidente Lula, até mesmo pela irritação que causa ao governador José Serra a comparação. Se é possível uma crítica à política de Lula para enfrentar a crise econômica internacional, é justamente em relação às supostas obras de infraestrutura que ajudariam a criar empregos. Além de não representar aumento significativo dos investimentos do governo federal, que continuam na casa do 1% do PIB há anos, com ou sem Programa de Aceleração do Crescimento, a maioria das obras é municipal ou estadual e estavam previstas muito antes da crise e até mesmo muito antes de serem reempacotadas pelo governo federal, num programa puramente eleitoreiro.
Pois não é que o governo de São Paulo resolveu lançar seu próprio PAC, antecipando obras que já estavam anunciadas, numa demonstração de que o programa federal estaria na direção correta? As obras do Rodoanel e do metrô paulista estão incluídas nos dois PACs, numa duplicidade de verbas e de criação de empregos que só tem efeito publicitário.
A incapacidade de fazer oposição de maneira objetiva está exposta também na acusação de que, ao alongar as dívidas das prefeituras com o INSS, o governo federal estaria rompendo a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Ora, como autores da lei, os tucanos deveriam saber que o que ela proíbe é a renegociação de dívidas de financiamentos, e há pareceres dizendo que a contribuição previdenciária é uma dívida tributária que pode ser prorrogada, assim como já o foi em vezes anteriores, até mesmo no governo de Fernando Henrique.
O que a oposição devia falar é que isso não vai resolver em nada a situação das prefeituras, especialmente das pequenas. O problema é que as prefeituras têm uma dependência muito grande do Fundo de Participação dos Municípios, que é formado por um percentual da arrecadação do Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Esses dois impostos foram muito bem nos últimos anos porque a economia cresceu, e a arrecadação cresceu mais ainda em cima de lucro do setor financeiro, que melhorou muito o Imposto de Renda, e vendas da indústria automobilística e exportação, que melhoraram o IPI. O setor da construção civil e o comércio atacadista são outros setores que foram muito bem.
A arrecadação de IR e IPI aumentou muito, mas, quando a crise veio, pegou justamente esses setores que estavam crescendo mais. A arrecadação vai ser atingida gravemente, já está desabando. De concreto, o que eles tinham que fazer é cortar despesas, coisa que, aliás, vários prefeitos anunciaram, e Lula foi para a televisão dizer que eles estavam errados. Se não cortarem despesas, e a receita não entrar, o que fazer?
O governo poderia utilizar o PAC para aliviar o orçamento dos estados e prefeituras, mas, para garantir os efeitos políticos, centraliza a verba na Casa Civil sob o comando da ministra Dilma Rousseff.
A distância entre o discurso e a realidade, entre o anúncio e a efetiva execução, tem na ineficiência administrativa e gerencial do governo federal a explicação mais evidente.
Os dados oficiais mostram que o que mais melhorou no ano passado foram os repasses para estados e municípios. Essas transferências de verbas devem estar respondendo por quase 40% do PAC, e os estados e municípios sabem fazer obras mais rápido e melhor do que o governo federal.
O problema do governo é que, ao centralizar as verbas, com fins políticos, ele perde a eficiência econômica. O Ministério das Cidades, do Marcio Fortes do PR, por exemplo, é muito mais eficiente no repasse para as prefeituras.
O governo federal tem então que inaugurar obras regionais, e por isso tantas viagens do presidente com a Dilma a tiracolo, para não perder a paternidade (e maternidade) das obras.
Outro ponto que a oposição não explora é a famosa afirmação do presidente Lula de que o Brasil é o país mais bem preparado para enfrentar a crise econômica. Um estudo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) mostra que a indústria brasileira teve queda maior do que até mesmo economias desenvolvidas que, teoricamente, estão no centro da crise.
O Brasil registrou, em dezembro, queda de 12,4% na comparação com o mês imediatamente anterior, assim como 15 outros países, nessa mesma base de comparação. No entanto, a Coréia (-10,7%) e o Japão (-7,6%) em novembro frente ao mês de outubro, tiveram quedas menores, assim como a indústria dos Estados Unidos, que registrou queda de apenas 0,6% na passagem de outubro a novembro.
Na comparação do resultado da indústria de transformação brasileira com os de economias periféricas com semelhante grau de desenvolvimento, o relatório do Iedi observa que, em dezembro de 2008, a produção manufatureira do Brasil registrou queda recorde de 14% em relação a igual mês do ano anterior.
A Rússia registrou retração semelhante, de 13,2%. Mas as indústrias de transformação da Argentina e da Índia mostraram vigor, a Argentina elevando o nível de produção em 2,6% na comparação com dezembro de 2007, enquanto a indústria indiana registrou variação de 2,4% em novembro de 2008 com relação a novembro do ano anterior na mesma base de comparação.
São dados de uma economia que não parece tão mais bem preparada que outras para enfrentar a crise, assim como o crescimento do PIB brasileiro nos últimos anos, embora melhor do que as médias anteriores, não se destacou da média dos emergentes.
Certamente não são dados que possam mudar a percepção popular de que o país vai bem, mas deveriam servir para balizar o discurso oposicionista contra uma visão cor- de- rosa que não corresponde à realidade.