Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, junho 25, 2014

Horizonte da indústria Míriam Leitão


O Globo

A indústria parece não encontrar o chão. Esta semana as projeções do mercado, na pesquisa feita pelo Banco Central, foram reduzidas fortemente e entraram no terreno negativo. Há um problema estrutural na indústria no mundo inteiro que a faz ter um percentual menor do PIB de todos os países, mas há uma questão específica no Brasil que é a soma de incertezas que tira o horizonte do setor.

Os economistas consultados pelo Banco Central revisaram de 0,51% para -0,14% a projeção industrial deste ano. Normalmente, as quedas são lentas, esta mudança foi forte demais; de 0,65 ponto percentual em apenas uma semana No início do ano passado, o mercado ainda acreditava que fosse possível fechar 2014 com um crescimento no setor de 3%. Em janeiro deste ano, a projeção já havia caído para 2,2%, mas continuava positiva. Ontem, foi para o negativo, tornando ainda mais difícil o panorama industrial. São projeções e, por isso, podem mudar, mas há poucas razões para uma inversão positiva dessa curva.

Na última semana, a crise cambial argentina ficou pior com a decisão da Suprema Corte dos EUA, e os argentinos são compradores de manufaturados brasileiros. O calote de 2001 ainda gera consequências para o país, que está com baixas reservas cambiais ao mesmo tempo em que vê aumentar a conta que ainda precisará ser paga aos credores. Seu volume de reservas vai emagrecer mais ainda. O cenário provável é mais restrições de importações. O Brasil e sua indústria vão sofrer com a Argentina jogando toda na retranca.

Quando se olha para o país, a perspectiva também não é boa. O varejo vinha sustentando um ritmo forte de crescimento, e, embora a concorrência com o produto importado sempre tenha sido uma grande reclamação da nossa indústria, havia demanda por produtos brasileiros. O problema é que o comércio também está perdendo fôlego. A Fecomercio de São Paulo divulgou que o índice de confiança dos consumidores na capital caiu em maio para o menor nível já registrado:

"O atual cenário socioeconômico, com baixo crescimento, aliado à persistente alta da inflação foram os principais motivos que resultaram no pior nível histórico do Índice de Intenção de Consumo das Famílias na cidade de São Paulo, chegando ao patamar de 113,6 pontos (em maio)."

De janeiro a abril, o emprego industrial caiu 2% em relação a 2013. O número está negativo em 11 dos 14 locais pesquisados e em 14 de 18 setores. São Paulo, centro industrial do país, teve queda de 3,1% no emprego da indústria. No Rio Grande do Sul, retração de 4%. A indústria de máquinas e aparelhos eletroeletrônicos fechou 6,3% dos postos de trabalho; máquinas e equipamentos, -4,7%; e até refino de petróleo e produção de álcool eliminou 7,9% das vagas. A política de venda de carros dos últimos anos não está segurando empregos nesse setor industrial. Em maio, o Caged já apontou fechamento de 28 mil vagas na indústria de transformação.

Os números frios não combinam com o clima de Copa, com a animação que se vê das torcidas vitoriosas nos bares das cidades onde os jogos aprisionam a atenção. O que os especialistas dizem é que a animação de torcidas não muda um quadro que já vinha minguando. Os muitos feriados pioram ainda mais a atividade industrial nestas semanas do evento.

A disputa é curta e a cada etapa há menos times em campo. O que há de explicação mais permanente é mesmo a falta de expectativa para a indústria. Os empresários têm medo da excessiva intervenção no câmbio, que tira espaço dos exportadores. Quem vende apenas para o mercado interno teme o efeito da inflação na renda. Investidores temem fazer plano sem saber algumas variáveis de custo importantes, como o preço dos combustíveis e da energia no ano que vem. Os preços represados viraram mais um fator de incerteza. Esse é o pior ambiente para quem quer investir.

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