O Estado de S.Paulo - 11/10
O relatório do FMI sobre o Panorama da Economia Mundial, divulgado esta semana, é um documento sombrio imerso em dúvidas e incertezas. Tudo nele é "condicional." O Fundo prevê que o PIB mundial vai crescer 3,3% este ano, o que não seria tão grave, comparado com a previsão de 3,6%, feita em julho. Seria um recuo até simbólico, uma tolerância estatística. Mas esta é a segunda retração da economia global que o FMI registra - a anterior foi em abril. E é o menor índice de crescimento desde 2002 (que foi 2,9%) com exceção dos dois anos da crise financeira de 2008.
Não é a recessão. Mas, de qualquer forma, a economia mundial, pode-se dizer, está longe da recessão. Não é bem assim, diz o FMI. Em um dos cenários prováveis, que constam do estudo divulgado em Tóquio, o Fundo é muito claro. Se nada for feito agora, o risco de recessão na zona do euro é de 80%, 25% no Japão e 15% nos Estados Unidos. E isso só poderá ser evitado "se" os Estados Unidos e a os países da zona do euro frágeis adotarem nos próximos meses medidas urgentes e vigorosas de incentivo econômico. Fiscais, tributárias, financeiras, monetárias, para gerar demanda do governo (leia-se gastos e investimentos) e emprego. É urgente porque as duas economias estão fragilizadas. O PIB dos Estados Unidos cresce menos de 2%. Na zona do euro e na União Europeia, é a recessão, com PIB negativo de 0,4%, que se infiltra e se instala sem ser até agora incomodada. Está feliz com a política de severa austeridade fiscal que implica mais impostos, menos gastos e investimentos. Uma política que está sendo aplicada há mais de dois anos e não dá certo. Ninguem é contra austeridade a não ser quando ela é aplicada em dose suicida, como está ocorrendo na Europa.
Em seminário organizado pelo Fundo, em Tóquio, o presidente do Banco da Itália e vice-presidente do Banco Central Europeu, Vitor Constancio, alertou que os governos europeus devem acompanhar atentamente os planos de cortes no orçamento para se certificarem de que eles não prejudicarão muito o crescimento econômico, como está acontecendo agora. Isso só tornará mais difícil alcançar as metas de equilíbrio fiscal e orçamentário. No Fundo, ninguém é contra uma política de austeridade, desde que não seja suicida.
Hipótese hipotética. Como nos Estados Unidos, tudo vai parando até os resultados da eleição - e que seja Obama, por favor, porque seu opositor, Romney, defende a mesma política suicida da zona do euro. A hipótese de o FMI contar com os dois blocos, que representam 50% da economia mundial, para alguma recuperação é apenas isso, uma "hipótese hipotética". Nem o FMI acredita nela. O Fundo indica um longo período de um mundo mais pobre, inseguro e doloroso.
E para o Brasil? O que o Panorama da Economia Mundial do FMI prevê? Vai afundar com os outros? Parece que não, diz o Fundo. É um caso de contrastes. O Brasil foi o mais atingido pelas revisões do FMI, que previa em julho um PIB de 2,5% e agora,dois meses depois, apenas 1,5%, índice de crescimento pobre que o governo admite. Mas o Fundo reconhece que a economia brasileira voltou a crescer e projeta um salto do 1,5% do PIB para 4% no próximo ano. Deve ser o país que mais vai crescer em 2013, depois de China (8,2%) e Índia (6,8%). A Rússia fica perto na previsão do Fundo, 3,8%, seguida do México, 3,5%. Os motivos apontados pelo FMI para esse resultado quase isolado e distante são do conhecimento do leitor da coluna e foram amplamente noticiados no caderno de Economia.
Riscos. Mas o relatório do FMI não é só elogios, há sérias observações sobre o risco do endividamento excessivos das pessoas físicas, das empresas, a exposição ainda existente à crise financeira na zona do euro, a dependência excessiva dos preços das commodities e uma inflação que, mesmo estabilizada, é de 5%. Mas comparando com a recessão europeia, a desaceleração americana e chinesa são desafios mais fáceis de enfrentar. E mais uma vez, como em 2008, o País vai ter de contar com investimentos no seu mercado interno para não ser contaminado pelo pífio crescimento de 3,6% da economia mundial em que nem mesmo o FMI acredita muito. O Brasil tem a vantagem de sair de 2012 crescendo 4% com mérito próprio enquanto os outros lá fora desaceleram por inércia. Temos desafios que são mais fáceis de contornar do que o risco de recessão que existe lá fora, para o qual o FMI alerta em vão até agora.
Entrevista:O Estado inteligente
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