O ESTADÃO - 16/10
Aconselhou os companheiros a deixar de lado, por enquanto, o julgamento do mensalão e concentrar seus afazeres na eleição, notadamente em São Paulo.
Tanta amenidade causou certo estranhamento. Não houve a esperada ordem à reação aguerrida contra as sentenças nem um chamamento a ataques ao “tribunal de exceção”, como levavam a crer declarações de simpatizantes e militantes desde que se desenhou a condenação.
Dirceu limitou-se a fazer dois discretos discursos orientando o partido a adiar quaisquer atos de contra-ataque até a conclusão das eleições municipais. “Agora o que interessa é o segundo turno, vamos às ruas, à luta”, conclamou.
Nada há de estranho na atitude que, antes, revela destreza e estratégia.
Dirceu percebe que o PT corre o risco de afugentar o eleitorado se hostilizar o Supremo Tribunal Federal nesse momento. Se contestar com virulência, desconfiança e desqualificação uma instituição que vem sendo celebrada como instrumento de redenção à ancestral impunidade e lançar suspeitas sobre ministros tratados nas ruas como heróis, flertará como perigo de despertar sentimentos fortes de antipetismo adormecido.
Pode levar o eleitor a perceber o PT como aquele anterior à Carta aos Brasileiros que, com suas posições agressivas, radicais e sectárias, perdeu três eleições presidenciais.
Duas medidas. Quando começar o julgamento do processo em que o tucano Eduardo Azeredo figura como beneficiário de esquema de financiamento ilegal de campanha,haverá gritaria e confusão.
O Supremo Tribunal Federal será cobrado por mercadoria que não pode entregar: isonomia total em relação ao julgamento de agora.
Há o traço base de união entre os dois casos: Marcos Valério Fernandes de Souza no papel de operador de arrecadações públicas e privadas em troca de trânsito livre ao tráfico de influência.
Valério fez primeiro para Eduardo Azeredo na tentativa frustrada da reeleição ao governo de Minas, em 1998. Eleição perdida, os ilícitos ficaram restritos à campanha.
Talvez se tivesse vencido Valério usasse as mesmas companhias para implantar em Minas e que viria a executar sete anos depois no plano federal.
Com a derrota, não se materializou esquema de compra de apoio parlamentar ao Executivo nem foram gerados os conflitos que em 2005 levariam Roberto Jefferson a quebrar a lei da Omertà e denunciar a existência da organização ora condenada como criminosa.
Quando se reclama da demora no julgamento do “mensalão mineiro” não se leva em conta que só foi descoberto muito depois, já nomeio do escândalo capitaneado pelo PT.
A despeito das diferenças, quando o caso for julgado os tucanos não correrão o risco de ir para a cadeia, mas não escaparão de responder pela proteção dada a Azeredo, na época da descoberta senador e presidente do PSDB.
Outra freguesia. A proposta do prefeito do Rio, Eduardo Paes, de fazer do governador Sérgio Cabral candidato a vice na chapa pela reeleição de Dilma Rousseff, só prospera em duas hipóteses: se Cabral sair do PMDB ou se alterar completamente a correlação de forças internas.
Caso a vaga continue com o partido, só será entregue a alguém tido como correligionário de raiz. O governador do Rio é visto como produto de “uma circunstância”.
Nessa condição Cabral não teria compromisso com os interesses do partido quando (e se) sentado na cadeira de vice-presidente.
Considerando que Eduardo Paes conhece perfeitamente essa realidade e que não falou por falar, alguma motivação mais elaborada por trás desse “lançamento” deve haver.