Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, outubro 25, 2012

De volta para o passado? - JOSEF BARAT


O Estado de S.Paulo - 25/10



Após 17 anos de estabilidade monetária, surgem sinais que apontam para eventual retrocesso nas conquistas alcançadas. A preservação da moeda baseou-se no tripé metas de inflação, superávit fiscal e câmbio flutuante. Em sentido mais amplo, a estabilidade econômica e o ambiente de negócios mais favorável se deveram às mudanças institucionais voltadas à redução da presença estatal - por meio das privatizações e concessões de serviços públicos, com ação reguladora -, além da responsabilidade fiscal.

O problema, hoje, é atribuir a essas importantes mudanças o baixo ritmo de crescimento da economia, trazendo de volta a tentação do intervencionismo estatal. Volta-se a velhos argumentos do passado, pelos quais "um pouco" de inflação pode propiciar crescimento, a desvalorização do real recompõe a competitividade e o relaxamento do superávit primário aumenta a capacidade de investimento público. Portanto, por esses argumentos, afrouxar o tripé da estabilidade pode resultar em taxas mais altas de crescimento.

Afrouxar, porém, as regras da estabilidade, além de grave erro, desvia das verdadeiras causas do baixo crescimento, que são: 1) reduzida taxa de investimento; 2) baixos níveis de produtividade do trabalho, por falta de escolaridade e qualificação; 3) carga tributária extorsiva e irracional, que inibe e contamina o ambiente de negócios; 4) gargalos e ineficiências das infraestruturas de transporte, energia e comunicação; e 5) exacerbação do consumo das famílias, com reflexos na capacidade de investimento. Assim, em vez de enfrentar as causas estruturais do baixo crescimento, opta-se pelo retorno meio torto do velho discurso contra o "modelo neoliberal". Não custa lembrar que este modelo foi mantido no governo do presidente Lula, com o mérito dos desdobramentos mais amplos da distribuição de renda e ampliação de oportunidades.

Portanto, se, em vez de reinventar a roda, o governo atacar as verdadeiras causas do baixo crescimento e da perda de competitividade, o País poderá aprofundar a sua inserção na economia mundial, preservando o respeito alcançado pela forma madura como conduziu a política econômica. Trata-se de afastar preconceitos e aprofundar o processo de concessões e parcerias público-privadas nas infraestruturas, ou seja, capital privado e supervisão pública, com agências reguladoras fortalecidas. Com isso, reanima-se o investimento - diante da baixa margem que o governo tem para investir -, desde que se disponha de uma carteira de projetos consistente e haja pré-qualificação dos participantes nas concessões e parcerias.

O que dificulta hoje este roteiro é a preocupação dos investidores com a tendência intervencionista do governo. Basta relembrar, por exemplo, o que vem ocorrendo com a Petrobrás (contenção dos preços dos combustíveis, política industrial protecionista e indefinição nos royalties), o setor elétrico (revisão das concessões e redução forçada das tarifas) e o novo modelo adotado para as ferrovias (que transfere os riscos do negócio para o governo). Preocupante, ainda, é a insistente tendência de reduzir as taxas de retorno do capital nas concessões, o que tende a afastar bons investidores e ampliar o assédio de aventureiros.

Estamos assistindo, mais uma vez, ao confronto entre o velho e o novo. Por artes da dissimulação, o velho se apresenta como partidário do progresso, induzindo mudanças que levam ao retrocesso. Aflora o conflito entre os setores econômicos altamente competitivos, que querem e precisam da maior inserção do País no mundo globalizado - portanto, de maior liberdade de comércio, fluxos de investimentos e protagonismo econômico. Estão sendo confrontados, todavia, pelos setores tradicionais, que querem se tornar competitivos por meio de medidas protecionistas, quando se sabe que a conta do "custo Brasil" é nutrida pelas graves deficiências nas infraestruturas e pela carga tributária. Um conflito subterrâneo de bom tamanho, que poderá (ou não) determinar novas alianças políticas e um patamar mais elevado de credibilidade do País.

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