O Globo - 10/08/2010
Alguns cientistas políticos estão dizendo que a eleição já está decidida. A democracia tem um processo mais rico de escolhas que sempre surpreende os especialistas e seus vaticínios precoces; a parte mais importante da disputa começa agora com entrevistas mais decisivas, a propaganda eleitoral eletrônica, e o acirramento dos debates. Os próximos 55 dias serão mais definidores.
A análise econômica erra muito; a análise política, também. Uma das teses é que o governo Lula teria feito uma clivagem entre ricos e pobres após o mensalão.
Pobres teriam ficado como sua base, e os riscos se afastaram. Para acreditar que é simples assim, e que o Brasil é tão dividido em classes, é preciso não ter lido o manifesto dos empresários que faz uma defesa aguerrida e politizada da manutenção de uma das escolhas do atual governo que é a de recriar no BNDES o passado mais que pretérito. É preciso também ignorar a abundância das contribuições dos maiores grupos empresariais brasileiros ao financiamento da campanha da candidata do governo.
A ideia de que há uma divisão entre pobres e ricos, que os pobres passaram a ser parte de uma espécie de curral eleitoral eterno do Lulismo e que os ricos ficaram definitivamente com o PSDB, é uma estultice. Simplesmente há pobres e ricos na base de apoio de todas as candidaturas.
O processo de escolha de cada eleitor passa por caminhos menos automáticos.
As políticas sociais e econômicas dos dois principais partidos do país têm superposições e pontos em que se diferenciam.
Mas nem é essa análise comparada das políticas que dará a resposta sobre quem vencerá as eleições de outubro no Brasil. Os caminhos da escolha de cada um tem a ver com uma teia mais complexa de emoções, sensações, interpretações, conversas de amigos, êxitos e fracassos de cada campanha de passar seus principais recados.
Há mudanças de última hora, há fatos surpreendentes, há oscilações fortes. Tudo isso vimos em eleições para diversos níveis nos últimos tempos.
Em resumo: o eleitor não vota como um resultado automático de uma equação.
A complexidade da escolha é que encerra a beleza do processo.
Há uma lista grande de “óbvios” políticos que não se confirmaram e uma sucessão de inesperados. O exuberante carisma de Lula e o uso da máquina, em 2006, não foram suficientes para ele derrotar Geraldo Alckmin no primeiro turno, um político conhecido por sua falta de carisma. A ampla base municipal do PMDB jamais foi suficiente para levá-lo a ganhar a disputa presidencial e há quatro eleições ele sequer postula o cargo. Na última em que participou, em 1994, com o experiente Orestes Quércia, o PMDB ficou em último lugar. Naquela vez, Quércia, Brizola e Espiridião Amin ficaram atrás de Enéas. A aguda crise econômica e a recessão de 1998 não foram suficientes para tirar de Fernando Henrique a vitória no primeiro turno.
Luiza Erundina estava derrotada em todas as pesquisas até que venceu a eleição para a prefeitura de São Paulo, em 1988. Fernando Collor de Mello, que começou com 1% das intenções de voto e um partido inventado como veículo da candidatura, derrotou políticos experientes ou com máquinas partidárias como Ulysses Guimarães, Mário Covas, Paulo Maluf, Leonel Brizola e Lula da Silva. O PT tinha ainda uma publicidade inovadora e apaixonante que fez a classe média e artistas cantarem o “Lula lá”. Naquela eleição, Lula e Brizola chegaram empatados no segundo lugar, só um percentual mínimo de votos é que levou Lula para a disputa com Collor. Em 2002, mesmo com o desgaste do governo FHC e a força do “Agora é Lula”, ele não conseguiu ganhar no primeiro turno. Em 2002, Ciro Gomes, concorrendo pelo PPS, um partido pequeno, teve uma onda favorável em que ultrapassou 20% de intenção de votos e depois, por seus erros de comunicação, murchou e terminou atrás de Garotinho. Na atual eleição, houve quem dissesse que Dilma era um “poste” e que não passaria dos 30%, e depois passou-se a se ter como certo que ela já ganhou, apesar de só agora ter começado, de fato, a campanha. A história das eleições livres aqui e no exterior está repleta de inesperados e de viradas de jogo. Por tudo isso, a fase mais interessante da campanha começa agora e não será menos decisiva do que em qualquer outra eleição.
O momento de conforto econômico criado pelo crescimento com baixa inflação e ampliação do crédito, como já disse aqui na coluna, cria um ambiente favorável à candidatura governista. Isso somado à popularidade do presidente Lula e ao uso abusivo da máquina pública na propaganda dão à candidata Dilma Rousseff a força que jamais teria se contasse apenas com seus atributos pessoais nessa campanha.
Mas ter favoritismo é diferente de já estar eleita de véspera.
Mesmo que se confirme a previsão mais repetida, e Dilma Rouseff ganhar a eleição, isso não está garantido agora. Para confirmar o prognóstico, ela terá que atravessar as próximas 8 ou 12 semanas de campanha garantindo o favoritismo e administrando o seu maior risco: ela mesma.
Entrevista:O Estado inteligente
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