O Estado de S. Paulo - 23/07/2010
Espremido por novas urgências e, especialmente, pela aguda falta de recursos, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, está anunciando isenção de Imposto de Renda para aplicações de longo prazo, notadamente debêntures, cujos recursos se destinarem à cobertura de investimentos.
O governo Lula precisou chegar ao final de um período de administração de oito anos para só agora sentir a urgência de uma atitude. O índice de poupança do brasileiro é quase insignificante, de apenas 16% a 17% do PIB. E o investimento também não passa muito disso aí. E sem poupança e investimento não é possível dar conta dos projetos de expansão da infraestrutura e nem sequer garantir o aumento de capacidade de produção da indústria de transformação para que haja um avanço sustentado do PIB de 5% ao ano.
Não está claro como o ministro dará isenção de Imposto de Renda para títulos que precisarão ser redescontados e revendidos no mercado, como também acontece com os títulos do Tesouro Nacional. Dois instrumentos de captação a longo prazo isentos de Imposto de Renda destinados à construção civil são as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e as Letras Hipotecárias (LH). E, no entanto, seus ativos são insignificantes, mesmo levando-se em conta a forte escassez de recursos para o setor habitacional. São tão insignificantes que nas estatísticas do Banco Central aparecem somados aos depósitos a prazo e às letras de câmbio. Por que, afinal, o que não está dando certo no caso das LCI e das LH pode dar certo no segmento das debêntures de longo prazo? Também não ficou claro como será evitado que esses ativos briguem no mercado com os demais títulos de curto prazo e, nessas condições, criem distorções. Mas esse não é o problema mais grave.
Também nessa questão, o rombo é mais embaixo. Trata-se da profunda aversão do governo aos investimentos privados, especialmente na área de infraestrutura. O discurso prevalecente dentro do governo é o de que qualquer incentivo ao setor privado para que canalize suas energias para essa área deva ser considerado "privataria". Esta administração pretende estatizar tudo sem que o Tesouro disponha de recursos para isso. Não teve munição para capitalizar o Banco do Brasil e não vai ter para capitalizar a Petrobrás.
Nem mesmo foram colocadas em marcha as Parcerias Público-Privadas (PPPs), proclamadas pelo governo como solução para a falta de capitais para investimento uma vez dispensada a privatização. Afinal, qual a participação nos investimentos tocados hoje pelas PPPs? Elas foram acoimadas de "privataria disfarçada".
E agora vem esse sufoco de um governo em final de mandato engolfado por uma imensidão de projetos e que, de repente, se vê sem recursos para o PAC, para as obras da Copa do Mundo, para as da Olimpíada, para o trem-bala, para financiar a expansão da produção para que a economia cresça pelo menos 5% ao ano.
É que falta uma política de fôlego que garanta o investimento, que inclua o desenvolvimento robusto do mercado de capitais. A ideia do lançamento de debêntures isentas do Imposto de Renda não passa de casuísmo, como tantos outros neste governo. Não faz sentido isentar debêntures da carga de impostos se a compra de máquinas e de equipamentos e se todas as iniciativas de expansão da capacidade de produção continuam sobrecarregadas por montanhas de impostos.
Mais acerto que erro
É leviandade sustentar que o Banco Central esteja sempre errado. Pode, em algum momento, ter errado na dose dos juros, mas não na direção da política adotada. Quando acontece, esse erro de dosagem não é tão irremediável como às vezes apontam alguns analistas. Pode ser corrigido, seja por manutenção por mais tempo do aperto monetário, seja por manutenção por mais tempo da política de afrouxamento.
Sintonia fina
As principais críticas sobre a decisão de quarta-feira foram dos que entenderam que teria sido melhor puxar um pouco mais os juros básicos, em 0,75 ponto porcentual e não em 0,50 ponto porcentual. Mas há espaço para uma sintonia fina...
Mais baixo, não dá
No mais, os juros básicos são altíssimos no Brasil porque temos essa política fiscal gastadeira, baixo nível de poupança e investimento e uma batelada de juros subsidiados, como os do BNDES, que exigem uma compensação... nos juros básicos.
Entrevista:O Estado inteligente
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