O GLOBO - 02/04/10
O presidente Lula, surpreendentemente, está se debatendo em sentimentos conflitantes na hora de deixar o poder. Desde que Dilma Rousseff saiu do ministério para dar início a sua campanha à sucessão presidencial, Lula não deixa espaço para ela, ocupando todo o noticiário com a mensagem surpreendente: não quer deixar o protagonismo político.
Mesmo que tenha sido ele o inventor de Dilma, e que ela faça questão de exibir sua dependência a cada palavra que pronuncia, assumindo o papel de sua criatura eleitoral, Lula não se mostra satisfeito.
Ela chegou a usar 28 vezes o tratamento de "senhor" ao se referir ao presidente Lula no seu discurso de despedida do ministério, o que é um sinal de subserviência não condizente com o papel de candidata à Presidência da República.
Dilma não se preocupa em explicitar sua subalternidade em relação a Lula, e o presidente não se preocupa em liberá-la para uma atuação mais autônoma.
Um das qualidades do presidente Lula é a de ser espontâneo no seu relacionamento com o distinto público, pois revela suas emoções e se torna um íntimo dos eleitores. Pois ele não está escondendo a dificuldade com que está lidando com a perspectiva do fim do poder.
O presidente Lula está parecendo até aqueles funcionários que não querem se aposentar, mesmo que a lei os obrigue a isso.
Impedido de disputar o terceiro mandato consecutivo de presidente da República, ele está se colocando na disputa de maneira direta, sem ao menos tomar cuidado com o que isso possa causar de prejuízo à candidatura de Dilma.
Pela segunda vez em dois dias, o presidente Lula se colocou como agente direto da disputa presidencial. Na quarta-feira, na despedida dos ministros, surpreendeu a todos quando disse que, "para me derrotar", os adversários terão que trabalhar mais, "meter o pé na lama".
Ontem, retomou o tema dizendo ter certeza de que "muita gente não vai conseguir" derrotá-lo nas eleições de outubro, porque seus adversários terão que trabalhar muito mais do que ele para executar ações que estão em curso no governo federal: "Eu ainda tenho nove meses de trabalho. Vou trabalhar que nem um desgraçado.
Quem quiser me vencer terá que trabalhar mais do que eu, fazer mais do que nós fizemos".
Trata-se de uma reação natural de reafirmação de seu poderio, pois Lula não tem se mostrado tão bom de voto quanto sua popularidade atual indica.
Perdeu duas vezes no primeiro turno para Fernando Henrique Cardoso, o que certamente é sua maior frustração, e venceu duas vezes no segundo turno.
É o segundo dia seguido que Lula afirma que vai "trabalhar que nem um desgraçado", prenunciando um esforço inaudito de fim de governo para se impor a seus adversários.
Dá a impressão de que não acredita que Dilma sozinha possa enfrentar o tucano José Serra. Mais do que isso, passa a ideia de que, se sua candidata for derrotada, ele será derrotado, apesar da popularidade espetacular com que vai terminando o governo.
Lula já havia dito que fazer a sucessora seria o fecho de ouro de uma administração bem avaliada, sem levar em conta que alguém que gosta de seu governo pode não concordar com sua escolha.
Encarar a alternância de poder como uma derrota é uma maneira de querer continuar no poder eternamente, como, aliás, já desconfiavam a senadora Marina Silva, a candidata do PV à Presidência, e o ministro Ayres Britto, do Supremo.
Mas o mais grave, tanto para Dilma quanto para Serra, é que Lula, se desdizendo, afirmou que não será apenas "um ex-presidente", anunciando pela primeira vez sua disposição de continuar na atividade política.
Ele já havia feito diversas declarações sobre ser ex-presidente.
Quando seu adversário preferido, Fernando Henrique Cardoso, dá suas opiniões, Lula sempre reclama indiretamente, dizendo que ele não se comporta como um ex-presidente.
Esquecendo-se de seu aliado José Sarney, que continuou na vida política se elegendo senador depois de sair da Presidência e tendo uma atuação política importante nos anos seguintes a seu mandato.
Outras vezes, o presidente Lula dava a entender que poderia ter uma atuação política internacional, e era comum a crença de que ele estaria, a partir de 2011, no comando de uma ONG para cuidar da fome no mundo, a exemplo do que fazem os ex-presidentes dos Estados Unidos.
Os mais otimistas o viam à frente da ONU, como secretáriogeral, ou pelo menos na OEA.
O próprio presidente havia dito certa vez que não se meteria num eventual governo Dilma, e que ela não era candidata para um mandato só, negando assim que se dispusesse a disputar novamente a Presidência da República em 2014.
Mas ontem Lula disse que os que pensam que ele será um simples "ex-presidente" ao final de seu segundo mandato vão "quebrar a cara", pois, garantiu, está "apenas no começo de uma caminhada", já que "falta muito" para o governo fazer no Brasil.
Quem pensava que a primeira referência na primeira pessoa, colocando-se como o centro da disputa, poderia ter sido um ato falho, ontem teve a confirmação de que tudo foi dito de modo pensado.
Pode ser uma estratégia para grudar a imagem da candidata Dilma à sua. Pode ser que queira garantir que ele estará por trás da candidata oficial caso ela vença a eleição. Ou pode ser simplesmente uma reação de quem não está aceitando o fato de que o poder estará passando para outras mãos dentro de nove meses.
Se Dilma vencer, vai querer tutelá-la. Se vencer Serra, Lula vai comandar uma oposição ferrenha contra aquele que o tirou do poder
Entrevista:O Estado inteligente
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