Folha de S. Paulo - 16/04/2010 |
Por exemplo, reduzir as enormes perdas na distribuição, como no caso paradoxal do "linhão" de Itaipu. Pelos dados disponíveis, o atual projeto é inviável, e um eventual plano B não é apenas desconhecido, mas expressamente negado pelo governo. A hipótese pela qual a usina geraria 4,6 mil MW de energia firme depende da construção de outros quatro reservatórios a montante, com custos adicionais inestimados. Sem isso, a energia firme ficaria, em meses mais secos, entre 690 e 2,2 mil MW, dependendo de diferentes estudos disponíveis. Há também duas estimativas no meio, de 1,1 e 1,8 mil MW. Apesar da margem de incerteza, todas elas tornariam o Valor Presente Líquido (VPL) do empreendimento negativo. Note-se que energia firme significa produção máxima contínua e ininterrupta, e não energia média: é como confundir renda média per capita com renda mínima. Por outro lado, os impactos das barragens complementares parecem de natureza e tamanho inaceitáveis na sociedade contemporânea: o próprio governo nega terminantemente a hipótese de sua construção, sem, porém, assumir isso formalmente. Em suma, realiza um leilão deixando de fora aquilo que poderia tornar o investimento viável, e joga para governos futuros a incômoda escolha entre sacrificar mais recursos do contribuinte ou mais capital natural e social do país. Também ficaram fora da conta as chamadas externalidades, ou seja, os próprios custos ambientais e sociais desta primeira fase. Isso não é privilégio de Belo Monte, sendo procedimento padrão nas demais grandes obras do PAC, mas nesse caso elas seriam muito expressivas: passivos oriundos da realocação de dezenas de milhares de pessoas, da perda de biodiversidade, da emissão de gases estufa, do comprometimento da atividade pesqueira, dos custos sociais para atender o fluxo populacional para a região, entre outros. Para dar uma ideia, trata-se de secar 100 km do curso de um enorme rio e afetar pelo menos 100 mil pessoas, com cerca de 30 mil a serem realocadas. Tais custos deveriam ser bancados pelo mesmo poder público que também bancaria o resto da obra, com recursos do Tesouro Nacional, do Fundo de Amparo do Trabalhador e de fundos de pensão das estatais. Ao incorporá-los, o VPL da obra se tornaria ainda mais negativo. Prova é que esta usina nunca seria construída se dependesse do setor privado assumir o risco: jamais empresas aceitariam se engajar em um empreendimento que nem sequer demonstra capacidade de remunerar o investidor. Por essa razão, no caso de Belo Monte o subsídio público teria de abranger tudo: obra, empreendedor e tarifa. A decisão de convocar o leilão às pressas foi assumidamente política: contraria o parecer formal da equipe técnica do Ibama, que havia atestado a impossibilidade de conceder a licença, assim como as advertências do Tribunal de Contas da União. Este apontou para inúmeras falhas, como o fato de que "estudos cartográficos possuem elevados níveis de incerteza, incompatíveis com o porte da obra", alertando: "Somando-se aos problemas apresentados em Belo Monte, há casos de projetos de responsabilidade tanto da iniciativa privada quanto públicos que tiveram aumentos consideráveis de custos como consequência de erros, omissões ou falta de detalhamento de estudos de viabilidade". Concessão de licenças por decisão política não é novidade, e pode até passar imune na guerra de liminares em primeira instância, mas fatalmente irá complicar as obras na medida que o contencioso atingir o julgamento do mérito. Não é razoável empurrar goela abaixo do país uma obra a respeito da qual existe, pelo menos, incerteza fundamental na esfera da viabilidade econômica. Preocupações com cronograma eleitoral não deveriam pautar a agenda de bancos estatais ou de fundos de pensão, que deveriam se pautar pela cautela. Pior, para viabilizar os subsídios haverá mais sangria do Tesouro em prol do BNDES, que já comprometeu boa parte de sua carteira em outros investimentos além da prudência, como os de Jirau, Santo Antônio e alguns frigoríficos: coincidentemente, todos também caracterizados por expressivos passivos socioambientais. |
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
sexta-feira, abril 16, 2010
"Xingubras", uma aposta na incerteza ROBERTO SMERALDI
Arquivo do blog
-
▼
2010
(1998)
-
▼
abril
(259)
- DORA KRAMER Em nome da História
- Os 'hermanos' se afagam EDITORIAL O Estado de S.Paulo
- MERVAL PEREIRA A busca do diálogo
- O MST sem aliados Alon Feuerwerker
- MÍRIAM LEITÃO As duas faces
- Belo Monte Rogério L. Furquim Werneck
- Anatomia de um fracasso Nelson Motta
- A nova cara dos britânicos Gilles Lapouge
- China só promete, não cumpre Alberto Tamer
- Coisas simples /Carlos Alberto Sardenberg
- Um tranco nos juros Celso Ming
- A política da eurozona:: Vinicius Torres Freire
- DORA KRAMER Ficha limpa na pressão
- MÍRIAM LEITÃO Última escalada
- LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS Bravatas de Lula e ...
- MERVAL PEREIRA Direitos humanos
- Lula celebra Geisel em Belo Monte DEMÉTRIO MAGNOLI
- Cavalo de Troia na Europa:: Vinicius Torres Freire
- MERVAL PEREIRA 'Irã é indefensável'
- JOSÉ NÊUMANNE Turma do sítio de dona Dilma bota pr...
- MÍRIAM LEITÃO Contágio grego
- Democracia reduzida Merval Pereira
- Novo ciclo Miriam Leitão
- Mercosul e integração regional Rubens Barbosa
- NICHOLAS D. KRISTOF Jovens super-heróis numa cabana
- As crises previstas por Ciro Gomes EDITORIAL - O G...
- ''Audiência'' para Ahmadinejad EDITORIAL - O ESTAD...
- Debate eleitoral brasileiro nos EUA VINICIUS TORRE...
- A candidata Bengell Jânio de Freitas
- Uma estranha no espelho Dora Kramer
- A farsa Celso Ming
- Usina de alto risco ADRIANO PIRES E ABEL HOLTZ
- O jogo duplo do Planalto no trato com os sem-terra...
- O dono da festa Luiz Garcia
- Norma Rousseff Fernando de Barros e Silva
- DENIS LERRER ROSENFIELD Viva Marighella!
- Omissão oficial é coautora de crimes Demóstenes To...
- A desindustrialização gradual no Brasil Paulo Godoy
- FERNANDO DE BARROS E SILVA Ciro Gomes: modos de usar
- MARIANO GRONDONA ¿Muere o renace el ciclo de los K...
- O valor da UNE -Editorial O Estado de S.Paulo
- Suely Caldas - Os que têm tudo e os que nada têm
- Primeiro aninho Ferreira Gullar
- O peso das palavras Sergio Fausto
- JOÃO UBALDO RIBEIRO Planejamento familiar
- DORA KRAMER Sequência lógica
- GAUDÊNCIO TORQUATO O OLHO DA NOVA CLASSE MÉDIA
- REGINA ALVAREZ Ampliando o leque
- O maior dom DANUZA LEÃO
- Governo criará "monstro", diz ex-diretor da Aneel
- Plebiscito de proveta-Ruy Fabiano
- Ciro Gomes: "Estão querendo enterrar o defunto com...
- Depois de Belo Monte Celso Ming
- Ciro frustra o Planalto e irrita Lula com elogio a...
- MAURO CHAVES A propaganda subliminar
- Hora da verdade MARCO AURÉLIO NOGUEIRA -
- DORA KRAMER Baliza de conduta
- Arrebentou FERNANDO DE BARROS E SILVA
- UM VAGA-LUME NA SELVA EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO ...
- Pobres vão pagar caro pela crise dos ricos Rolf K...
- Dever de casa Regina Alvarez
- Amazônia peruana é nossa Marcos Sá Correa
- Estatais apontam que Belo Monte é inviável
- Belo Monte, o leilão que não houve:: Vinicius Torr...
- Economia brasileira e importações:: Luiz Carlos Me...
- JOÃO MELLÃO NETO Por que a nossa política externa ...
- LUIZ GARCIA Da carochinha
- BARBARA GANCIA Ordem do Rio Branco pelo correio!
- CELSO MING O rombo está aumentando
- DORA KRAMER Pior é impossível
- A conta fictícia de Belo Monte Editorial de O Est...
- VINICIUS TORRES FREIRE Belo Monte, o leilão que nã...
- A notícia linchada Antonio Machado
- NELSON MOTTA Movimento dos Sem Tela
- DORA KRAMER De boné e outros males
- MÍRIAM LEITÃO Decisão britânica
- CELSO MING O vizinho roubado
- A diplomacia do gol contra EDITORIAL - O ESTADO DE...
- Sinais contraditórios EDITORIAL - O GLOBO
- PAULO RENATO SOUZA Salários na educação paulista
- CARLOS ALBERTO SARDENBERG Brasília, um equívoco caro
- Uma carta do Diabo ROBERTO DaMATTA
- Erro até o final Miriam Leitão
- O jogo bruto da candidata
- Dom de confundir Dora Kramer
- RUY CASTRO Zero hora para a mudança
- A bolha de imóveis brasileira Vinicius Torres Freire
- DORA KRAMER Proposta estratégica
- MÍRIAM LEITÃO Custo do inesperado
- CELSO MING A pressão do consumo
- ENIGMA AGRÁRIO XICO GRAZIANO
- A recuperação da economia americana é real Luiz Ca...
- Paulo Guedes É hora de enfrentar o Leviatã brasileiro
- Celso Lafer O Brasil e a nuclearização do Irã
- Carlos Alberto Di Franco Drogas, ingenuidade que mata
- JOSÉ GOLDEMBERG A nova estratégia nuclear dos Esta...
- Yoshiaki Nakano Juros e câmbio de novo!
- Ferreira Gullar Os políticos do lixo
- CELSO LAFER O BRASIL E A NUCLEARIZAÇÃO DO IRÃ
- GAUDÊNCIO TORQUATO CAMPANHA DO MEDO?
-
▼
abril
(259)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA