Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, novembro 03, 2009

Sarkozy no chuveiro Ivan Lessa


Ivan Lessa em ilustração de Baptistão

Dessas notícias que a gente pega nos jornais distribuídos grátis no metrô ou suas cercanias. Tem sempre algo que a grande mídia não se interessou muito. No caso em questão, duas colunas apenas na primeira página, mas cabeçalho em corpo respeitável, dizendo respeito ao presidente francês Nicolas Sarkozy, conhecido em meios irônicos, como “o pequeno gigante”.

Tratava, e informava o texto, da conferência realizada ano passado em Paris quando o “Napoleão de nos jours” (também coisa dos círculos debochados) ocupava o cargo rotativo de presidente da União Europeia e, como bom francês, insistiu em fazer as honras da casa dentro das tradições pródigas da pátria que deu ao mundo vários baixinhos de grande importância (Toulouse-Lautrec, Robespierre, Emile Zola, etc).

Foi nesse espírito, sempre segundo o jornal, que leva o título deMetro, pois no metrô é que se folheia, que Sarkozy resolveu dar um banho no palácio que ocuparia durante uma cúpula da União Europeia, o Grand Palais, situado a 10 minutos de distância do Elysée. E dar um chuveiro de luxo, mas luxo mesmo, para ele próprio e mais ninguém.

Fez construir então, para a reunião com a duração marcada de três dias, em julho de 2008, seu chuveiro particularíssimo e baseado em especificações adiantadas pelo próprio “pequeno grande polegar” (segundo… pois é, eles mesmos).

Nicolas Sarkozy tem 1m60 de altura, e fala grosso em francês de luxo. Assim teria de ser, e foi, o tal chuveiro. Tinha ar condicionado, rádio com surround sound e outros adereços imponentes que os auditores, que só agora apresentaram o resultado de seus trabalhos. Quer dizer, os números relevantes: quanto se gastou e em que se gastou.

Sarkozy tinha, graças à sua posição como presidente duplo (França e União Europeia) verba ilimitada, cortesia dos contribuintes franceses, não poupando assim esforços para abrilhantar os aspectos mais relevantes da cidade-luz, ainda considerada, apesar de certas críticas maliciosas, uma dos maiores atracões do mundo.

Impressionar chefe de estado europeu dá trabalho e custa caro, como ficou demonstrado pela auditoria. Esse o assunto do momento na França e não o filme com o falecido Michael Jackson ou um possível lançamento de CD ou tailleur novo de Carla Bruni-Sarkozy.

O palácio presidencial foi completamente redecorado para a ocasião. 500 técnicos trabalhando todos os dias, 300 todas as noites. US$ 1,5 milhão foram gastos com o banquete que deu início aos trabalhos. O que dá uma média de mais de US$ 38 mil por cabeça de cada um dos 43 notáveis presentes. US$ 500 mil foi o preço pago pelo pódio discursivo. Perto de US$ 150 mil em tapetes. US$ 320 mil em jardins. Ao todo, os três dias custaram US$ 16 milhões. Uma das mais caras conferências da história da União Europeia.

E o chuveiro que consumiu US$ 410 mil, além de só utilizar a última palavra em seu material, e o trabalho dedicado de patrióticos arquitetos, técnicos e operários especializados? Foi posto abaixo poucos dias depois de completadas as obras sem derramar uma única e mísera gota, já que Nicolas Sarkozy mudou de ideia, coisa muito comum entre pequenos gigantes, e acabou usando – se usou, sussurram os maldosos céticos – o chuveiro do Palais de l'Elyséemesmo.

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