Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, outubro 13, 2009

Miriam Leitão Ruralismo ambiental

O GLOBO
PANORAMA ECONÔMICO

Imagine um mesmo ministério que juntasse ambientalistas e ruralistas. O ministro inglês Hilary Benn, do Meio Ambiente e Agricultura, acha que unir os dois faz todo o sentido por um motivo simples: “Poderíamos produzir alimento sem água, sol, terra, chuvas, biodiversidade?” Ele vem ao Brasil em novembro com uma agenda que tem contatos nas duas áreas e para conversar sobre Copenhague.

Por outro lado, o ministério dele não cuida de mudança climática, que fica com o ministro da Energia, Ed Miliband. Perguntei se é possível tratar hoje em dia de meio ambiente separado de mudança climática: — Melhor ter dois ministros verdes num governo que apenas um. Nós dois trabalhamos muito juntos.

Energia e mudança climática têm que estar juntos.

Sobre agricultura e meio ambiente, não tem que haver competição entre as duas áreas. Elas são interdependentes.

Por exemplo: as abelhas estão morrendo, por uma série de razões.

Elas são fundamentais para polinizar as plantas. Se elas desaparecerem estaremos em sérios problemas aqui na Inglaterra. Há tensão, claro. De vez em quando fazendeiros me dizem: “Isso não tem nada a ver com meio ambiente, é produção.” Mas estamos muito perto do tempo em que o aquecimento global vai afetar nossa capacidade de produção. Acho que fica mais fácil conversar quando as duas áreas estão no mesmo ministério.

No verão de 2007 caíram chuvas torrenciais na Inglaterra que afetaram cerca de 500 mil pessoas, e Hilary Benn passou sua primeira noite no cargo no reduto eleitoral de Ed Miliband, em Doncaster North: — Ed e eu passamos a noite conversando com os eleitores dele. Vários nos perguntaram se aquilo era a mudança climática. Para dar uma resposta honesta, não há certeza. Mas os eventos que ocorrerão serão assim.

Tem gente que acha que dois graus de temperatura não é nada. Em 2003, tivemos um verão mais quente na Europa. Pessoas morreram por causa disso.

Na minha passagem por Londres, semana passada, fiz uma longa entrevista com o ministro Hilary Benn. Falante, expressivo, ele é um dos negociadores da Inglaterra na reunião de Copenhague.

Perguntei sobre o risco de a reunião não chegar a um resultado positivo.

— Eu não quero perder tempo agora pensando no fracasso. O que nós decidirmos lá, pode afetar o mundo pelos próximos 20 anos. Eu estava em Bali, quando parecia que ia ser fácil e não foi. É muito difícil negociar por conhecidas razões, mas o mundo estará lá e nós precisamos saber o que cada país tem para pôr na mesa. Temos que decidir o fluxo de financiamento para os países mais pobres. A mudança climática virá de qualquer maneira. Temos que nos preparar — disse.

Perguntei a ele o que pode acontecer na Inglaterra com a mudança climática: — Nós somos uma naçãoilha.

Estamos aqui no sexto andar, mas o primeiro-ministro mora no nível térreo.

Hoje, Londres vive protegida por barreiras construídas em 1953, que têm sido frequentemente elevadas.

Essas barreiras guardam oito milhões de pessoas e 200 bilhões de libras de ativos.

Se houver apenas 10% de probabilidade de as barreiras serem superadas, o que nos interessa são esses 10%, porque se as barreiras romperem nós estaremos em grande risco.

O Ministério acabou de lançar um novo guia para as empresas fazerem a contabilização do carbono, um aperfeiçoamento do processo.

Naquele mesmo dia ele havia tido uma reunião com empresários. Sugeriu que eles se preparassem e perguntou como o aquecimento global afetará os negócios de cada um: se haverá aumento ou queda de demanda para seus produtos, se eles sabiam como suas operações internacionais serão atingidas e qual a situação da cadeia produtiva.

— Eu, se tivesse um negócio de fornecimento de água, estaria protegendo meus reservatórios. Nós tivemos, aqui no Reino Unido, dois verões muito secos e depois três verões com muita chuva, inclusive em 2007, na pior enchente que já tivemos. Em Gloucestershire, 300 mil pessoas ficaram sem água porque o reservatório foi atingido e ficou muito perto de afetar o fornecimento de energia.

Nós temos que nos organizar para estar preparados para qualquer cenário.

O ministro deu exemplos de que mudança climática é questão econômica: — Fui ao Panamá. Lá, vi que o canal hoje tem menos água, o que torna mais difícil a passagem dos navios.

Os custos do frete aumentaram e as empresas de seguro elevaram os prêmios.

E por que as águas diminuíram? Por causa do desmatamento.

Exemplo concreto do custo econômico da perda de bens ambientais.

Fui a Nairóbi e, no centro agroflorestal, vi a artemísia, uma planta que aumenta a potência das drogas atuais contra a malária.

Vi outra planta, a prunus africana, cujo chá da casca combate o câncer de próstata.

É desse valor econômico da floresta que eu estou falando.

Há dúvidas sobre biocombustíveis.

A Inglaterra está introduzindo combustível renovável no transporte, mas ele me falou de três dúvidas: acha que se for massificado o uso, isso tomará terra demais; o etanol de milho tem um balanço carbono quase tão ruim quanto os combustíveis fósseis; dependendo da maneira como o etanol é produzido, o impacto no meio ambiente pode ser muito alto. Um dos assuntos da visita dele ao Brasil será ver a nossa forma de produção de biocombustíveis. Um bom momento para convencêlo da qualidade dos nossos produtos. O Reino Unido é um grande mercado e como tenho dito aqui, está na frente de outros países na busca de uma economia e um consumo que ajudem a mitigar os efeitos da mudança climática.

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