O Globo
PANORAMA ECONÔMICO
A nova lei da Argentina para controle da imprensa e dos meios de comunicação tem inúmeros defeitos, mas talvez o pior seja o de ter sido aprovada por um Congresso moribundo. O governo Cristina Kirchner já perdeu a maioria, parte desse Congresso não renovou seu mandato. Isso tira a legitimidade da lei aprovada às pressas e no meio de um festival de troca de favores.
O projeto está dominado pela ideia autoritária que inspirou outros projetos na América do Sul e lembra um pouco os finados projetos da Ancinav e do Conselho Federal de Jornalismo que o governo Lula, na sua primeira fase, tentou impor ao país.
Aqui, a sociedade teve força e evitou a guinada autoritária, mas na Venezuela não foi possível.
O que acontece na Argentina não é diferente do que está fazendo o governo Micheletti, em Honduras, mostrando que não interessa se o governante se declara de esquerda ou se é de direita, o que realmente divide os países é a força das instituições democráticas.
Uma ideia do projeto abortado no Brasil era de uma direção do conselho audiovisual que teria poderes extraordinários e seria indicada pelo governo. Lá, também é assim. São sete integrantes, quatro indicados pelo governo, três, pela maioria que o governo tem hoje no Congresso. O governo deu prazo curto para que os nomes dos indicados do Poder Legislativo sejam nomeados o mais rapidamente possível, enquanto funciona ainda o velho Congresso.
No dia 10 de dezembro assumem os parlamentares eleitos na última eleição. No novo Congresso, o governo Kirchner perdeu a maioria. E é nele que repousam as esperanças de quem quer corrigir os excessos e absurdos da atual lei de audiovisuais.
A lei parece ser uma boa ideia, afinal, se trata de substituir a legislação anterior que era do governo militar, e o objetivo seria reduzir o poder dos grandes grupos de comunicação.
A verdade é que a família Kirchner fez a lei para se vingar pessoalmente do grupo Clarín, que teria dado espaço demais, na visão deles, à revolta do campo contra o governo. Os produtores rurais se revoltaram por bons motivos e não por que o Clarín quis. O governo impôs sobre os produtores um volume tão absurdo de impostos que muitos desistiram de produzir, e a Argentina hoje importa produtos dos quais sempre foi exportadora. Não foi o jornalismo que produziu esse problema, mas sim as decisões insensatas do governo Kirchner.
Não é assim que se legisla.
Não se pode pensar em regular os meios de comunicação apenas para se vingar de um grupo empresarial que na visão do governante não está informando corretamente.
Essa é uma típica atitude de Hugo Chávez, que persegue grupos empresariais específicos. Se o casal de governantes do nosso país vizinho tivesse uma atitude de estadistas saberia que é preciso construir parâmetros duradouros numa área onde a tecnologia força a mudança constante e aumenta a competição pelo surgimento de novas mídias.
Entre as barbaridades da lei está o artigo 37 que estabelece que só podem ter redes nacionais o governo, as universidades, “os povos originários” e a Igreja Católica.
Só ela e nenhum outro culto.
O clero católico sempre forte na Argentina passou, a partir da proposta, a apoiar o governo Kirchner.
No mundo da convergência em que jornais são também televisões, ou caminham para isso, em que as novas mídias empurram os grupos para procurar o caminho multimídia, a lei argentina estabelece que quem tem TV aberta não pode ter TV fechada; quem tem TV fechada não pode ter mais de 35% dos assinantes. As exceções são, como disse acima, o governo e a Igreja Católica. Isso fará qualquer grupo se concentrar em Buenos Aires e vender os negócios no interior. É exatamente o que querem os Kirchner. Como o prazo para a venda é de um ano, quando estiver no início da campanha eleitoral para a sucessão haverá uma verdadeira liquidação de concessão. Não é difícil imaginar que os beneficiados serão os grupos dóceis ao poder do casal governante.
Pobre Argentina. É cada dia mais difícil não chorar por ela. O país continua sua marcha batida para o regresso em todas as áreas. Quando se olha a agenda econômica da Argentina, parece o Brasil antigo: eles lá estão tentando abrir uma negociação com o FMI, reabrir diálogo com o Clube de Paris e renegociando com os detentores de títulos públicos que foram confiscados na última moratória da dívida interna. Esses problemas que foram sendo resolvidos após a estabilização brasileira e depois de novos avanços, ainda estão presentes no país. Recentemente, um artigo de um colunista econômico registrava que os argentinos mandaram US$ 40 bilhões para fora e que se esse dinheiro voltasse, eles não precisariam estar captando no exterior.
Há muitas dúvidas se a lei com tantos pontos nebulosos se sustentará na Justiça e diante de um novo Congresso que virá com maiores poderes e mais independência.
Na eleição de junho, sete em cada dez eleitores votaram contra os candidatos kirchneristas. A falha institucional argentina é a demora de seis meses entre eleição e posse do novo Congresso. Foi desta falha que os Kirchners se aproveitaram para impor uma lei pela qual esperam se manter no poder.
Entrevista:O Estado inteligente
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