Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, outubro 08, 2009

Merval Pereira A longo prazo

O GLOBO

As negociações para a disputa pela sucessão do presidente Lula estão sendo aceleradas nos últimos dias dentro da base governista, na tentativa do Palácio do Planalto de garantir uma candidatura única. Mas a ansiedade para antecipar tanto um compromisso não parece ser a melhor estratégia quando se trata de PMDB e PT. A longo prazo, tudo poderá estar mudado.

Veja-se o caso do deputado federal Ciro Gomes (PSB), que deu a contragosto o primeiro passo para servir ao governo como candidato da base a governador de São Paulo, mas foi ajudado providencialmente pela incontinência verbal da ex-prefeita Marta Suplicy (PT), que o rejeitou como alternativa a um candidato petista.

Era o que Ciro precisava para reafirmar junto ao PSB sua candidatura a presidente. A agressividade com que foi rejeitado pelo PT paulista pode deixá-lo à vontade para exercer um papel que está esboçando: o de ser um candidato lulista, mas contra o PT.

Os ataques ao PMDB já começaram e certamente farão parte de seu repertório de campanha. Com isso, Ciro Gomes poderá apagar a fama de ser apenas uma "língua de aluguel" do governo, que entrou na disputa não para ganhar, mas para atacar o governador e pré-candidato tucano José Serra, seu inimigo pessoal.

Nesse papel, Ciro estaria reduzido a um candidato nanico que serve de trampolim para uma das partes realmente na disputa. Como tem pretensões maiores, terá que se livrar desse estigma que o próprio Lula está lhe impingindo.

Como se não bastasse o trabalho que Ciro terá para controlar seu temperamento explosivo e sua própria incontinência verbal.

Outra candidatura que não estava nos planos do Planalto, e que se consolida à distância do antigo partido, é a da senadora Marina Silva (PV), que pode vir a ser apoiada pelo PSOL ainda no primeiro turno, firmando uma proposta oposicionista ligada a questões da modernidade, como o meio ambiente.

Dificilmente sua candidatura terá mais espaço político para começar a campanha, mas, se o apoio popular se confirmar mesmo com um esquema partidário acanhado e pouco espaço para a televisão, será sinal de que ela se tornará um ponto de negociação forte tanto para PT quanto para PSDB.

Não é à toa que ela fez críticas à política autodestrutiva dos dois adversários, sinalizando que poderia vir a negociar com qualquer dos dois, desde que se coloquem em posição de construir entendimentos, e não em uma campanha eleitoral destrutiva.

A presença em sua campanha da vereadora e ex-senadora Heloísa Helena, que ainda aparece nas pesquisas eleitorais com os mesmos votos que teve na eleição de 2006 (cerca de 7% do eleitorado nacional), será um sinal de que Marina é vista como uma alternativa eleitoral mais viável, capaz de agregar apoios em outros setores da sociedade.

O PT também está conseguindo levar à loucura o PMDB, que, não conseguindo se acertar com o partido oficial, parte para tentar resolver as questões políticas por cima, isto é, obrigando a que o presidente Lula e a candidata oficial, Dilma Rousseff, se comprometam a acertar as alianças regionais, depois de garantido o lugar de vice para o partido.

Tomar uma decisão desse porte a cerca de oito meses da realização das convenções partidárias que selarão os acordos é confiar muito na lealdade do PMDB, virtude que nunca foi o forte do partido.

Muita coisa acontecerá até lá, principalmente várias pesquisas de opinião, que poderão confirmar que os ventos estão soprando para o lado de Dilma, e que a aposta de longo prazo dos governistas do PMDB estava certa.

Ou, então, mostrar que a candidatura oficial não decolou, o que dará força aos que, no PMDB, tendem a apoiar a candidatura de um tucano, seja ele quem for.

Nesse caso, se as pesquisas de opinião chegarem ao meio do ano apontando para uma vitória do candidato do PSDB, provavelmente a convenção do PMDB não ratificará a decisão de participar da chapa oficial, liberando seus filiados para apoiar quem quiserem.

Esses cenários poderão representar a definitiva afirmação da candidatura de Dilma, ou o começo de sua "cristianização" pelos aliados hoje abrigados na coligação governista.

O PSDB continua disposto a empurrar a definição para o mais tarde possível, aguardando o desenrolar dos acordos políticos e, sobretudo, o resultado das pesquisas de opinião pelo final do ano.

Elas servirão para consolidar a candidatura do governador paulista José Serra, caso seja confirmada sua liderança, como também para definir a estratégia a ser seguida.

Ainda não há uma certeza entre os tucanos sobre o papel do presidente Lula na alavancagem da candidatura da ministra Dilma, e o assunto é tratado com um cuidadoso respeito.

Por sua vez, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), está conseguindo sair de seu estado e tornar-se visível ao grande eleitorado como uma figura central da política brasileira, papel que já exerce nos bastidores com grande efeito.

Se se convencer de que, com sua presença na chapa tucana, na condição de vice-presidente, poderá garantir a vitória do partido, certamente se curvará às pressões, que são muitas, inclusive em seu estado.

Mas se persistir na dúvida sobre o resultado eleitoral, pode se resguardar com um mandato no Senado para uma futura oportunidade. A questão é que, se Dilma se eleger em 2010, será quase certamente candidata à reeleição se estiver bem cotada junto ao eleitorado.

Caso seu governo esteja mal avaliado, o governismo terá ainda uma carta na manga para 2014, na figura de Lula.

Nos dois casos, a disputa será mais difícil do que a atual.

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