Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, outubro 20, 2009

Janio de Freitas Sem um toque especial

FOLHA DE S. PAULO

DEBELAR HOJE um confronto com bandidos ou entre grupos deles é, para a polícia, nada mais do que amanhã mudar de lugar para fazer a mesma tarefa. Essa é uma das muitas sínteses possíveis da dramaticidade vivida pelo Rio, e em processo de instalação na maioria das cidades mais populosas, pelo país afora. O que fazer, ao menos no caso mais agudo do Rio?

A única resposta de sinceridade inquestionável é simples: ninguém sabe. Porque a pergunta conduz a outra síntese possível da dramaticidade. Para vencer de fato a situação atual, haveria muitas mortes, dado que a bandidagem já constitui verdadeira força armada, destemida e entrincheirada em áreas que a favorecem; se a situação atual não for vencida, haverá cada vez mais mortes, muitas mortes, porque a força da bandidagem aumenta em armas, em extensão dos núcleos onde se aquartela e se autoalimenta para reposição das perdas humanas. Um dilema que ninguém, entre governantes, "especialistas" e políticos, quer admitir.

A admissão seria onerosa. Mais fácil é sair-se com subterfúgios. Lula, repetido por muitos outros:

"As obras do PAC acabaram com a criminalidade no Dona Marta", e já estão acrescentadas outras favelas. Os traficantes e os assaltantes foram trabalhar em atividades lícitas? Ou, com moradia eventualmente em outro lugar, continuam assaltando, matando, traficando?

Desastres aéreos têm propriedade excepcional de comover a opinião pública. Os naufrágios com dezenas ou mais de centena de mortos ocorrem no Amazonas com frequência, as mortes no trânsito são dezenas ou centenas a cada dia, mas nenhum exemplo assim causa abalo equivalente ao de um desastre aéreo, digamos, com cem mortes. Por isso, o helicóptero abatido por bandidos no Rio foi um toque diferenciado em fato que, no mais, não passou de corriqueiro, é diário -com 12 mortos, 6 ou 16, 2 ou 9, bandidos reais ou bandidos depois de defuntos, passantes adultos e passantes crianças, e policiais. O anormal, o escândalo, foi o helicóptero.

Não é verdadeira a explicação oficial de que o acontecido no morro dos Macacos "é um problema específico de uma região, de um ponto da cidade muito localizado". Não é. A cada dia acontece algo do gênero em uma parte da cidade. Logo, o problema não está em tal ou qual ponto, está na cidade, agora mesmo começando ou se preparando em uma favela de Copacabana ou do Méier, ou na Linha Amarela, ou no caminho do aeroporto, em um elevado central, em qualquer lugar, de qualquer forma. O que não se sabe é só isso: onde e como. O quando é todo dia.

O sonho também merece o seu lugar: a solução poderia vir de um nível extraordinário de crescimento econômico, com seus frutos voltados não mais para a concentração na minoria ultramínima e, afinal, dirigidos a distribuir-se em proporções sedutoras para a mobilização das camadas sem perspectivas e sem estímulos positivos. Mas sonhos sonhos são.

A realidade que se apresenta ao Rio é a tendência a maior favelização nos próximos anos.

Com a atração de maneiras de ganhar algum dinheirinho nos preparativos da Copa de 2014 e na Olimpíada de 2016. E não há o menor indício de que isso fosse pensado em qualquer instância de governo.

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