Brasil
Mais seletivo e mais eficiente
Mecanismo que filtra a entrada de processos no STF
torna o tribunal mais ágil – ou melhor, menos lento
Laura Diniz
Luiz Silveira/SCO/STF |
AÇÕES CHEGAM NO ATACADO Em 2008, o STF apreciou 130 000 processos – mais de 1 000 vezes o que analisou a Suprema Corte americana |
Até 2007, o Supremo Tribunal Federal (STF) era um desaguadouro desprovido de filtro. O mais alto tribunal do país julgava até briga de vizinhos. A situação produzia, além do desvirtuamento de suas funções, uma catástrofe operacional – cada um dos onze ministros do STF recebia mais de 800 novos processos por mês, e o número de ações acumuladas à espera de julgamento chegava a 151 000. O mecanismo da repercussão geral, introduzido pela Reforma do Judiciário de 2004, melhorou muito a situação. A partir da sua aplicação, há dois anos, o STF passou a julgar apenas recursos de relevância social, política, econômica ou jurídica – ou seja, aqueles que interessam à totalidade do país, como cabe a um tribunal que tem a função de ser o intérprete da Constituição. A principal consequência disso é que a decisão de cada recurso admitido passa a valer para todo processo semelhante, o que dispensa o STF de analisar várias vezes a mesma causa. Assim, o número de novos processos recebidos mensalmente por ministro caiu para menos de 400 e o de ações à espera de julgamento teve uma redução de 29%.
Para a sociedade, a mudança representa duas boas notícias: a primeira é que, com a entrada de menos ações, a fila dos processos andará mais rápido. A segunda é que os ministros julgarão melhor, uma vez que terão mais tempo para se dedicar à análise dos recursos, em vez de sentenciar em ritmo de produção industrial. Em 2008, o STF apreciou 130 000 ações – mais de 1 000 vezes o que é analisado pela Suprema Corte americana anualmente (uma centena de casos) e o dobro do que julgou a Suprema Corte da Argentina em 2007. Por que o STF chegou a esse ponto? A razão principal é o fato de a Constituição brasileira ter sido escrita ao modo de um regulamento de condomínio, imiscuindo-se até em assuntos como o monopólio da União no transporte marítimo de petróleo bruto. Os constituintes de 1988 pensavam que assim estariam garantindo a mais ampla proteção ao cidadão. Acabaram criando um texto que, além dos direitos fundamentais, incluiu centenas de itens excessivamente específicos. Essas especificidades, com frequência, são controversas, e casos aparentemente simples vão galgando as instâncias jurídicas até chegar ao STF. Advogados hábeis conseguem transformar qualquer caso em "questão constitucional" – mais uma que vai entulhar os escaninhos do Supremo.
Gilmar Mendes, presidente do tribunal, está otimista em relação aos efeitos que os mecanismos de filtro implantados em 2007 estão tendo. Ele estima que, a partir de 2016, o tempo para um processo terminar em definitivo deve cair dos atuais catorze anos para quatro. É um avanço, mas é pouco. O ideal seria reformar a Constituição para livrá-la desses artigos labirínticos. Nesse caso, convenhamos, o ideal é inimigo do possível.