Brasil
O PARADOXO NORDESTINO
Os homicídios e roubos disparam na região em que a economia
mais cresce, os indicadores sociais evoluem com mais velocidade
e o governo federal mais investe
Leonardo Coutinho
Fernando Vivas |
Seis horas Foi o tempo que a polícia levou para recolher o cadáver deste homem na Grande Salvador |
O Nordeste se converteu em um celeiro de boas notícias. Nos últimos dez anos, sua economia cresceu duas vezes mais rápido que a brasileira e triplicou de tamanho. A renda local disparou. Vivem na região 48% dos brasileiros que emergiram da pobreza desde 2002. Uma parte desse desenvolvimento deve ser creditada ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que vê a região como seu enclave eleitoral e investiu lá 24% dos recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Esse panorama positivo vem sendo manchado, porém, por uma escalada nos índices de criminalidade. A capital nordestina mais insegura, Maceió, tem 104 homicídios por grupo de 100 000 habitantes, índice superior ao do Iraque. Os assassinatos também dispararam em Salvador, a maior e mais rica cidade do Nordeste. Hoje, são seis por dia, 79% mais que há três anos. A incidência de homicídios na capital baiana é o dobro da do Rio de Janeiro e seis vezes a de São Paulo. Em alguns bairros da capital baiana, vigora o toque de recolher imposto pelos bandidos. Em um deles, a Boca do Rio, rojões anunciam às 21 horas o início da reclusão forçada. Os métodos da polícia, que matou 130 pessoas desde janeiro, ainda pioram as estatísticas de mortes violentas.
A assimetria entre desenvolvimento econômico e social e aumento da criminalidade constitui um paradoxo, visto que mais progresso costuma resultar em maior segurança. O coordenador do Observatório de Segurança Pública da Bahia, Carlos Alberto Gomes, explica, porém, que o aumento dos crimes no Nordeste não está associado diretamente à baixa renda, mas à falta de polícia, iluminação e outros serviços públicos. Ou seja, aquela quantidade de bandidos e desajustados que sempre existe em qualquer sociedade está livre para delinquir – e, agora, eles têm sob sua mira uma população mais rica, o que os torna ainda mais ativos.
Das capitais nordestinas, Recife é a que combate a criminalidade com mais eficiência. Em dois anos, os registros de todos os tipos de delito encolheram 8%. Com isso, a cidade passou a Maceió o título de a capital mais insegura não só do Nordeste, mas do país. Hoje, a cidade do Recife também é mais pacífica do que Salvador. Para obter esses resultados, as autoridades pernambucanas importaram de São Paulo um modelo de monitoramento das áreas mais perigosas. Os policiais são remanejados semanalmente para os bairros onde há mais mortes, assaltos e desovas de cadáveres. Já em Salvador, a polícia parece ter aceitado os limites impostos pelos bandidos: ela simplesmente não entra nos bairros e morros dominados pelos meliantes. Diante da fraqueza do aparato estatal, os baianos correm o risco de ver a criminalidade escapar ao controle. Essa novela, não custa lembrar, já foi vista no Rio de Janeiro.