O Globo - 10/08/2010
O panorama da eleição presidencial chama a atenção.
Não há nenhum candidato identificado com a direita, da mais conservadora até a liberal. E não é de hoje. Desde a eleição de 1994, a direita abandonou o campo de jogo. Uma das explicações pode ter sido o trauma representado pelo governo Collor. Em vez de apostar em um aventureiro, optou, desde então, por apoiar o candidato que tivesse mais chances de vencer. Puro utilitarismo eleitoral. Mas que acaba prejudicando o processo democrático, pois obriga os partidos mais fortes nas eleições presidenciais (PSDB e PT) a darem uma guinada à direita.
E por uma razão óbvia: há um eleitorado conservador, que pode decidir uma eleição.
Uma candidatura no campo da direita teria de buscar apoio político.
Mas onde? O capital financeiro está muito satisfeito com o governo Lula.
A nefasta combinação de altas taxas de juros com um câmbio supervalorizado transformou o capital financeiro em uma espécie de quarto poder da República. Compõe com qualquer governo, desde que mantenha seus privilégios, assim como a burguesia lulista, aquela do capital alheio, que cresce graças aos generosos créditos do BNDES. Apoiando Lula obtiveram a tão almejada paz social.
Nunca na história deste país, desde o restabelecimento da democracia, houve um período presidencial com tão poucas greves. O custo foi baixo. E pago pelo Tesouro Nacional.
Então, para que fazer política ideológica, discutir princípios? Este utilitarismo macunaímico, também é extensivo à política. Paulo Maluf é um bom exemplo. Filhote da ditadura, de acordo com Leonel Brizola, foi candidato na eleição de 1989 ainda com base no prestígio adquirido no início da década e que o levou a disputar a Presidência contra Tancredo Neves no colégio eleitoral, em janeiro de 1985. Desde então ficou restrito à política paulista. Após o fracasso de Celso Pitta, seu afilhado político, abdicou de voos mais altos, inclusive na política regional, e transformou-se em caudatário do PT, apoiando, inicialmente, Marta Suplicy, para a prefeitura, os candidatos petistas quando do segundo turno das eleições para o governo estadual, e Lula para a Presidência. Em cerimônias oficiais chegou a ser citado elogiosamente pelo presidente da República.
O mesmo quadro se repete em diversas regiões. No Nordeste, a velha oligarquia que usufruiu das benesses do regime militar, que aderiu à Nova República e depois de 1990 foi se adaptando aos novos tempos, virou lulista de carteirinha. Eventualmente, manteve suas divergências com o petismo nos seus estados, mas no plano federal que é o que importa para os oligarcas, pois é a fonte dos recursos que permitem manter seus privilégios locais formou uma verdadeira tropa de choque no Congresso Nacional em defesa do governo.
José Sarney foi o precursor. Já em 2002 apoiou Lula. Pressentiu para que direção estava soprando o vento.
Se aboletou no governo, manteve o controle de áreas sensíveis aos seus interesses familiares, como o Ministério das Minas e Energia, e o governo local e, quando perdeu, em 2006, a eleição no Maranhão, recebeu apoio discreto, mas eficaz, de Lula para retomá-lo em um golpe judicial.
O mais novo adepto e não é acidental que também venha de um estado pobre desta corrente é Fernando Collor. Defendeu enfaticamente o governo. Virou lulista.
A direita prefere ser sócia, mesmo que minoritária, do governo, do que disputar a Presidência. Seus interesses se resumem a extrair benefícios nada republicanos. Em uma linguagem mais direta: querem participar do saque organizado do Estado, controlando ministérios e secretarias como uma espécie de extensão da antiga casa-grande. Não há nenhuma ideologia. Quando muito, como fez Renan Calheiros, cita Ruy Barbosa para justificar notas frias emitidas por um açougue o Stop Carnes no interior miserável de Alagoas.
Contudo, no Congresso, a direita está muito bem representada, numericamente falando, claro. Raros são os parlamentares ideológicos, que professam sinceramente sua ideologia, defendem seus princípios. São vistos como ingênuos. A direita propriamente dita sabe que, sem apoio parlamentar, nenhum presidente governa.
A opção por escolher o campo parlamentar em vez de lutar pelo Executivo tem se mostrado muito eficiente.
Evita o desgaste da derrota, valoriza o apoio eleitoral e aumenta o cacife no momento da divisão do bolo do poder. E mais: não se identifica como direita. Direita virou palavrão.
Eles são de centro.
Entrevista:O Estado inteligente
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