O Estado de S. Paulo - 05/08/2010
E o Mercosul assinou um tratado de livre comércio com o Egito. Viva o grande mercado com a pujante economia de US$ 187 bilhões. É o segundo acordo bilateral, depois de Israel. De acordo com nota do Itamaraty, isso reafirma o interesse dos países do bloco em negociar acordos comerciais "ambiciosos". Sim, ambiciosos. Está lá na nota oficial do Itamaraty. E Estados Unidos, União Europeia, China? Ora, não têm grande importância. O nosso negócio é a África dos ditadores eternos, com a qual nossa diplomacia se enamorou.
Apesar da nota oficial, o Ministério das Relações Exteriores continua acreditando ingenuamente nos acordos multilaterais. Está negociando há mais de dez anos com a União Europeia e enterrou o das Américas. Ah! ia esquecendo a Rodada Doha, aquele acordo de liberalização agrícola que morreu antes de nascer e não contaram para Brasília.
Multilateralismo definha. Definha sim. Os países que pesam verdadeiramente no comércio mundial foram deixados de lado, negociam e fecham acordos regionais ou bilaterais. Só o Brasil, não. A OMC, coitada, tentou resistir, mas fracassou. "São perigosos, distorcem as relações comerciais", não parava de conclamar Pascal Lamy. Ninguém ouviu.
267 acordos no mundo! Aí, diante da sua impotência e vendo o barco afundar, a OMC teve a ideia de fiscalizar os acordos bilaterais e regionais. Pretendia, pelo menos, ver se obedeciam as regras de comércio internacional, aceitas por todos os países que a integram. O projeto hoje é uma lenda em Genebra. E sabem por quê? Porque existem hoje, acreditem, 267 acordos notificados na OMC e mais de 100 estão em negociação... Sim, tudo isso. Os países, quando muito informam, viram as costas e continuam a negociar. Entre os emergentes, o Chile lidera. Nada menos que 57! Estados Unidos, México, países do Pacifico, com todo o mundo. Por isso, não quis entrar na camisa de força do Mercosul, onde até o pequeno Uruguai atrapalha. E imaginem agora com essa ideia de trazer para o bloco a Venezuela bolivariana protecionista e em profunda recessão... Aí é que não vai dar mesmo. Cuba dos dois Castros...E que tal a Coreia do Norte?
Quem atrapalha. Dizem que no Brasil, é a agricultura e a indústria que atrapalham. Querem se proteger, impõem condições inaceitáveis pelos nossos pretensos parceiros. Não é verdade. Isso também acontece nos Estados Unidos, onde o governo enfrenta um Congresso hostil e mais difícil que o ameno Brasil. Ninguém pode afirmar que a agricultura americana, crescendo na estufa acolhedora dos subsídios e do protecionismo, tem menos importância política que a brasileira nas negociações internacionais. O mesmo para a União Europeia que fechou nada menos que 16 acordos bilaterais e regionais. O Brasil se arrasta penosamente na negociação de meia dúzia.
O que muda? Muda que na União Europeia e nos Estados Unidos há uma diplomacia comercial agressiva. É a diplomacia de resultado, não de palavras, de reuniões. Eles se cansaram de nós. E têm razão. A União Europeia ainda finge fazer reuniões solenes com o Brasil, com promessas que se adiam. Os Estados Unidos, não. São mais práticos. Nós queremos reuniões, eles querem negócios. Como não têm aqui, vão buscar em outros lugares.
E então? É a pergunta que se repete em fins de coluna. E então, que as exportações brasileiras crescem pouco, as importações aumentam, e ficam aí dizendo em Brasília que é por causa do aquecimento da economia nacional, do câmbio, que é consequência da crise internacional.... Só que os EUA, a União Europeia e a China continuam exportando mais. E nós? Ora temos algumas reuniões e missões diplomáticas para realizar... Afinal, temos agora o Egito, não temos?
Entrevista:O Estado inteligente
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