Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, agosto 18, 2010

ELIO GASPARI O modelo "Serra Palin" emborcou

FOLHA DE SÃO PAULO - 18/08/10

O tucano precisa lembrar de Guimarães Rosa: "Mestre não é quem ensina, mestre é quem, de repente, aprende"


SEGUNDO O IBOPE, Dilma Rousseff botou 11 pontos de frente sobre José Serra. Pelo Datafolha são oito e pelo Vox Populi, 16. Em todos ela está em alta, e ele, em queda. Quem melhor explica essa circunstância é um simples apelido: "Serra Palin". A sacada veio do cientista social Celso Rocha de Barros, do blog "Na prática a teoria é outra".
Enquanto John McCain, candidato republicano à Presidência dos Estados Unidos, tirou da cartola Sarah Palin, uma governadora do Alasca, desconhecida, feroz e simpática, o candidato tucano, que o país conhece há décadas, apresentou-se como algo que nunca foi. Pior: pelo que se suspeita, apresenta-se como algo de que o eleitorado não precisa. Há milhões de pessoas dispostas a votar num candidato que denuncia o fisiologismo do aparelho petista. Essas pessoas também não gostam do iraniano Ahmadinejad, do boliviano Evo Morales e das Farc colombianas.
A manobra da invenção de Sarah Palin deu errado porque ela encantou o eleitorado conservador americano, que já estava disposto a votar em McCain. (Voto feminino? O companheiro Obama prevaleceu entre as mulheres.) A manobra "Serra Palin", além de primitiva, revelou-se idêntico equívoco aritmético. Uma pessoa pode detestar Lula e Dilma Rousseff por 17 motivos, mas isso não faz com que ela possa votar 17 vezes.
Serra lançou-se candidato com um discurso de unidade nacional, por um Brasil que "pode mais", apimentado com um toque moralista ("meu governo nunca cultivou roubalheira"). Em poucos dias arquivou a proposta de unidade e serviu a pimenta. Tentando ser o que nunca foi, deixou de informar quem pretende ser como presidente da República. O coroamento desse galope em direção ao nada poderá se cristalizar numa tentativa de metamorfose num hipotético "Zé", eco aziago da transformação de Alckmin no "Geraldo" da campanha de 2006.
Enquanto o tucanato não soube para onde ir, a plataforma petista foi simples como uma lâmina: Dilma Rousseff é a candidata de Lula. É verdade que os 78% de popularidade de Nosso Guia lhe permitem esse luxo, mas esse dado está na equação política nacional desde o final do ano passado, quando ele atravessou a crise financeira com leves escoriações.
O modelo "Serra Palin" emborcou. Restam a José Serra os dois meses decisivos da campanha e a possibilidade de levar a disputa para o segundo turno. A seu favor, terá os ímpetos do "já ganhou" petista. Prova disso pode ser encontrada no desembaraço com que os companheiros já começaram a compor ministério, na ressurreição de comissários saídos do sarcófago de réus do processo do mensalão e até mesmo no reaparecimento das rivalidades das facções internas do PT. Afinal de contas, não se pode supor que, numa campanha eleitoral, só um dos lados cometa todos os erros durante todo o tempo. Nesse altura, vale lembrar, os desastres raramente derivam de estratégias ou astúcias da marquetagem. O fator decisivo, por incrível que possa parecer, sempre sai da essência da candidatura.
Quatro meses de campanha crispada renderam nada aos tucanos. Em março, ao deixar o governo de São Paulo, Serra lembrou-se de Guimarães Rosa: "Mestre não é quem ensina, mestre é quem, de repente, aprende".

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