FOLHA DE SÃO PAULO - 07/03/10
Com alguém ao lado falando num celular, lendo os e-mails, não se pode nem ao menos pensar. É a solidão total
HÁ MUITOS, muitos anos, havia uma musica de Zé Rodrix que nos emocionava. Os primeiros versos diziam "eu quero uma casa no campo, onde eu possa compor muitos rocks rurais"; e continuava dizendo coisas lindas, como "eu quero a esperança de óculos e um filho de cuca legal, eu quero plantar e colher com as mãos a pimenta e o sal". Era com isso que sonhávamos, mesmo sem saber, ou era o que gostaríamos de querer; belos tempos.
Os anos passaram, e os sonhos, no lugar de se ampliarem, encolheram.
O que é que se quer hoje em dia? Menos, acredite, pois querer um celular novo que faz coisas que até Deus duvida é querer pouco da vida. Meu maior sonho é bem modesto.
Nada me daria mais felicidade do que um celular que não fizesse nada, além de receber e fazer ligações. Os gênios dessa indústria ainda não perceberam que existe um imenso nicho a ser explorado: o das pessoas que, apesar de conseguirem sobreviver no mundo da tecnologia, têm uma alma simples.
As duas mais dramáticas novidades trazidas pelos celular foram as odiosas maquininhas fotográficas e a impossibilidade de uma conversa a dois. Quando duas pessoas saem para jantar, é inevitável: um deles põe o celular -às vezes dois- em cima da mesa. O outro só tem uma solução: engolir, mesmo sem água, um tranquilizante tarja preta.
No meio de uma conversa palpitante, o telefone toca, e a pessoa faz um gesto de "é só um minuto". Não é, claro. Vira um grande bate-papo, e não existe solidão maior do que estar ao lado de alguém que te larga -abandona, a bem dizer- para conversar com outra pessoa. No meio de um deserto, inteiramente sós, estamos acompanhados por nossos pensamentos. Com alguém ao lado falando num celular, lendo os e-mails ou checando as mensagens, não se pode nem ao menos pensar. É a solidão total, pois nem se está só nem se está acompanhado. Tão trágico quanto, é estar falando com alguém que tem um telefone com duas linhas; no meio do maior papo, ele diz "aguenta aí que vou atender a outra linha" e frequentemente volta e diz "te ligo já" -e aí você não pode usar seu próprio telefone, já que ele vai ligar já (e às vezes não liga). Não dá.
Raros são os que atendem e dizem "estou com uma amiga, depois te ligo" -nem precisavam atender, já que o número de quem chama aparece no visor, e as pessoas têm todos eles de cor na cabeça, como eu não sei.
Eu juro que tentei, já troquei de celular três vezes, mas desisti. Recebia contas que não entendia, entrei, de idiota, num "plano", e quase enlouqueci quando quis sair. Hoje tenho um que praticamente não uso, mas é pré-pago, e só umas quatro pessoas conhecem; ponho 20 reais de crédito, se não usar não vou à falência, mas pelo menos não recebo aquelas contas falando de torpedos e SMS, coisas que prefiro nem saber que existem. Ah, e meus telefones fixos são com fio.
Do carro já me livrei: há cinco anos não procuro vaga, não faço vistoria, não pago IPVA, nem seguro, e sou louca por um táxi. Até ontem me considerava uma mulher feliz, mas sempre soube que a felicidade dura pouco: hoje ganhei um iPod. Uma quase tragédia, eu diria.
PS - Lula não resistiu e foi fazer campanha no Chile. Michelle Bachelet teve que largar o que estava fazendo para recebê-lo no aeroporto, e como se fosse pouco, ainda ouvir um discurso. Nele, Lula disse essa pérola: "graças a Deus, não houve vítimas entre os brasileiros". A presidente, com a expressão devastada pelos 800 mortos perdidos no terremoto, só fez olhar para o chão.
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
Arquivo do blog
-
▼
2010
(1998)
-
▼
março
(253)
- Celso Ming -Virada do trimestre
- ALEXANDRE SCHWARTSMAN Síndrome da China
- DORA KRAMER Falha da gerência
- MERVAL PEREIRA Palanques abalados
- MÍRIAM LEITÃO BC estatal
- JOSÉ NÊUMANNE Os maus conselhos que as pesquisas dão
- RUY CASTRO Olhos de Armando
- Celso Ming - Dilma, Eike e os irmãos PAC
- MERVAL PEREIRA A boca do jacaré
- DORA KRAMER Ainda falta o principal
- FERNANDO DE BARROS E SILVA Fora, Suplicy!
- O apagão de Lula
- Miram Leitão Peça de marketing
- Fora de controle-Ricardo Noblat
- Carlos Alberto Sardenberg -Alguém vai se decepcionar
- Denis Lerrer Rosenfield -O espírito do capitalismo
- SANDRA CAVALCANTI Gracinhas típicas de marionetes
- Fernando RodriguesO PT no Sudeste
- AUGUSTO NUNES A LIÇÃO DE UM PAÍS CIVILIZADO AO GRO...
- DANUZA LEÃO Adultério consentido
- VINICIUS TORRES FREIRE A China está soprando bol...
- MERVAL PEREIRA - O exemplo de Lula
- JOÃO UBALDO RIBEIRO Um certo cansaço
- Míriam Leitão Hora do futuro
- Dora Kramer -Um País de todos
- Celso Ming - A fragilidade do euro
- Gaudêncio Torquato Malabaristas no picadeiro
- Suely Caldas A pobreza em foco 2
- Ferreira GullarA cara do cara
- Merval Pereira Cartão de advertência
- FH: 'É inédito na História republicana'
- NELSON MOTTA Sonho de uns, pesadelo de outros
- Reinaldo Azevedo O AI-13 dos militontos
- MÍRIAM LEITÃO Felizes, separados
- Gilmar Mendes EDITORIAL da FOLHA
- Celso Ming - Curto-circuito
- Ruy Castro -Deixadas no passado
- Dora Kramer - Mudança de rumo
- Fernando Rodrigues -O "X" não aconteceu
- Serra mostra fôlego Fernando de Barros e Silva
- Mauro Chaves Duro é escapar de vizinhos
- A fraqueza do Estado Celso Ming
- Não vai dar para todo mundo:: Vinicius Torres Freire
- Horror à política:: Fernando de Barros e Silva
- JOÃO MELLÃO NETO Quem vai ser presidente?
- MERVAL PEREIRA Fio tênue
- DORA KRAMER Propaganda enganosa
- RUY CASTRO Rio estilo Projac
- MÍRIAM LEITÃO Ata dos derrotados
- CARLOS ALBERTO SARDENBERG Os dilemas do clima
- Devaneio autocrático
- MIRIAM LEITÃO - Gregos e portugueses
- As greves contra Serra
- Celso Ming Portugal segue a Grécia
- MERVAL PEREIRA Mineiridades
- DORA KRAMER Elogio ao delito
- Adriano Pires-O que Começa Errado Acaba mais Errado
- PAULO RABELLO DE CASTRO O Rio vai à guerra pelo ...
- VINICIUS TORRES FREIRE O índice luliano de alegria
- Demóstenes Torres - O Brasil precisa dizer não
- Partido de programa Fernando de Barros e Silva
- MERVAL PEREIRA O petróleo na política
- DORA KRAMER Politiquinha
- MÔNICA BERGAMO Alberto Goldman, senhor governador
- Celso MingCompre já, pague depois
- Miram Leitão No silêncio da lei
- A internacionalização da economia brasileira
- Rubens Barbosa - Parceria Trans-Pacífico
- DORA KRAMER Conflito de interesses
- MERVAL PEREIRA A mudança chegou
- Vinicius Torres Freire A "herança maldita" de Lula
- Celso Ming Aumenta o rombo
- Míriam Leitão Novo fôlego
- :Lições das Damas de Branco-Mary Zaidan
- Patuscada Internacional Roberto Freire
- Os nanicos Fernando Rodrigues
- Um quixote no PT Fernando de Barros e Silva
- Enquanto é tempo Alon Feuerwerker
- CARLOS ALBERTO SARDENBERG AS TAREFAS DE LULA
- KÁTIA ABREU Verdade ambientalista versus fundamen...
- CARLOS ALBERTO DI FRANCO Máquina de corrupção
- CELSO MING - A alcachofra
- EDITORIAL - O GLOBO Corrida na internet
- JOÃO UBALDO RIBEIRO Aperfeiçoando a Receita
- FERREIRA GULLAR A pouca realidade 2
- MARIANO GRONDONA ¿Cómo evitar la anarquía sin reca...
- JOAQUÍN MORALES SOLÁ ¿Un gobierno en manos de la ...
- GAUDÊNCIO TORQUATO Fechando as cortinas do palco
- DANUZA LEÃO Passeata chocha
- MERVAL PEREIRA Crise no FMI
- DORA KRAMER Bicos calados
- SUELY CALDAS A pobreza em foco
- Celso Ming -Tempo para conserto
- DORA KRAMER Para o que der e vier
- MERVAL PEREIRA O preço político
- Miriam Leitão Juros do dilema
- A ''verdade coletiva'' de Lula: Roberto Romano
- FHC exalta democracia de Nabuco
- O blefe de Lula:: Villas-Bôas Corrêa
- Viagem à Petra-Maria Helena Rubinato
-
▼
março
(253)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA