Entrevista:O Estado inteligente
O sigilo garantido WALTER CENEVIVA
FOLHA DE SP - 15/10/11
Reportagem de investigação é fundamental; torna-se instrumento defeituoso se a fonte não se sentir segura
HÁ PROFISSÕES submetidas ao sigilo da fonte, inerente a seu trabalho em face dos clientes ou das autoridades. A advocacia é uma delas. Outra é a medicina. O jornalismo, idem, pois a Constituição garante aquele que preserva o sigilo legal sobre de quem ou de onde veio a notícia (inciso XIV do art. 5º).
A Carta Magna também preserva o segredo do deputado e do senador. Não são "obrigados a testemunhar sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações" (art. 63, parágrafo 6º).
O leitor, eventualmente desiludido com figuras do Legislativo, poderá ser contra a garantia do segredo, mas é imprescindível para assegurar ao legislador o cumprimento correto de seu dever, no pleno exercício do mandato. Uma das razões está em que a revelação restringiria a busca da fonte informativa, de atos ou fatos contrários à moral pública ou ao direito da responsabilidade, de qualquer pessoa.
A liberdade de manifestação tem sido tolhida em países governados por ditadores. Há pouco mais de 40 anos, sob a desculpa de que uma tal liberdade jornalística prejudicaria iniciativas revolucionárias no Brasil, os governos militares proibiram a divulgação de tudo o que fosse contrário aos interesses do poder dominante, exercendo uma forte censura.
Há os que vivem a dizer que no período dos governos militares não havia fatos como os atualmente noticiados pela mídia, na esfera da política e fora dela. Não sabem ou fingem não saber que a censura silenciava os meios eletrônicos e reprimia os meios impressos.
Prova das vantagens da liberdade jornalística é vivida hoje na Grã- Bretanha. Lá, um tablóide de escândalos, de propriedade do milionário Rupert Murdoch, terminou fechando as portas, depois que o "Guardian" revelou os processos antiéticos e, em muitos casos, ilícitos, que o tablóide desenvolveu para melhorar sua circulação (e sua renda), tirando vantagem do sensacionalismo provocado.
Mesmo na Inglaterra teve curso uma campanha para impedir que o "Guardian" continuasse divulgando os "podres" desse escândalo. Até levou a uma bem humorada anotação, à moda da casa: "Essa é boa: o "Guardian" denunciou os podres do grupo Murdoch e a polícia agora quer impedi-lo de informar".
Em Londres, a chefia da polícia foi ao Judiciário alegando o direito de obter do "Guardian" a fonte da informação divulgada. A desculpa foi ridícula: precisava da identificação, para punir seus servidores, que violaram a Lei dos Segredos Oficiais, que lá vigora. Com o sigilo, disse a polícia, o interesse público seria prejudicado ao não serem identificados os culpados pela divulgação.
A maioria da mídia criticou a chefia policial. Defendeu o jornal, pois a reportagem de investigação é fundamental na vida moderna. Torna-se instrumento defeituoso se a fonte não se sentir segura com seu anonimato e se o jornalista não se sentir seguro com a revelação de fato verdadeiro, sem prometer ocultar a sua fonte.
Nada obstante a gravidade do comportamento de certas autoridades, o sigilo profissional é garantia básica da informação jornalística. É o que me levará a insistir no tema, cuidando do assunto novamente, em mais uma coluna, pelo menos.
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