O Estado de S.Paulo - 09/08/10
Foi uma luta muito longa, difícil, cheia de obstáculos. Na Assembleia Nacional Constituinte de 1987, um grupo de cidadãos nos procurou com uma sugestão oportuna e corajosa: que a iniciativa de propor projetos de lei também pudesse emanar diretamente dos eleitores, isto é, que pudesse ser de iniciativa popular.
Surgiram argumentos contrários, muitos medos sem sentido e muitas cautelas hipócritas. Mas a ideia acabou sendo aprovada. A Carta Magna de 1988 deu à iniciativa popular o direito de propor projetos de lei, como consta do parágrafo 2.º do artigo 61, no qual estão definidas as cautelas, as exigências que garantem a representatividade da vontade do eleitor.
Para apresentar o projeto de lei a proposta depende da assinatura de, "no mínimo, um por cento do eleitorado nacional". Desse 1%, os signatários devem ser eleitores "em pelo menos cinco Estados" da Federação. E cada um deles "com não menos de três décimos por cento" do eleitorado. Como se pode ver, uma fórmula bastante prudente, com o objetivo de impedir a ação demagógica de lideranças ditatoriais, como as que vemos à nossa volta, aqui, na América Latina.
Promulgada a Carta de 88, as correntes que haviam liderado a ideia da proposta partiram para a hercúlea tarefa de fazer a coleta das assinaturas exigidas. As várias correntes, das mais diferentes origens, reuniam todos os que lutavam por um sistema eleitoral mais limpo e mais garantido.
Checar a identificação de cada signatário foi uma trabalheira incansável, minuciosa e rigorosamente honesta, que contou com a participação da Igreja Católica, de suas paróquias, de entidades sociais e culturais, de escolas, de cooperativas, de associações de moradores e de empresas. E, enfim, do eleitor que sonha com melhores costumes políticos.
Ao final, uma bela vitória: o número de assinaturas superou as exigências! Foi mais do que expressivo. Foi um grito de "basta!", saído da alma de milhões de brasileiros.
A preciosa carga foi entregue solenemente ao Congresso Nacional. Daí em diante, ficou tudo por conta do Poder Legislativo. Cabia a ele, após verificar o atendimento das exigências, discutir o projeto nas comissões e no plenário e, por fim, aprová-lo.
Foi uma longa espera, durante a qual o País sofreu o vexame de suportar a mais deslavada feira de corrupção política de todos os tempos. Nunca antes o Brasil viveu dias tão sujos, tão pornográficos, tão cínicos!
Mais do que nunca ficaram evidentes o dever e a obrigação dos partidos de não inscreverem, em suas chapas, candidatos envolvidos em irregularidades de qualquer natureza, principalmente no trato da coisa pública.
Que o nosso sistema eleitoral é frágil e permissivo, isso todos sabemos. Também sabemos que esse voto proporcional - para todas as Casas Legislativas do País, à exceção do Senado Federal - é um tipo de voto que frauda o desejo e a intenção do eleitor. O eleitor escolhe um e acaba elegendo outro! Por isso é necessário que esse outro também seja confiável. Mesmo com instituições frágeis, pessoas que cultivam valores morais revelam firmeza de comportamento. Ninguém é obrigado a ser desonesto.
O escândalo dos Correios, o escândalo do mensalão do PT, o escândalo do desgoverno de Brasília e todos os outros provam essa tese. A compra de consciências para garantir maiorias obedientes, para aprovar leis suspeitíssimas, para administrar só por medidas provisórias, tudo isso não significa que as instituições é que sejam fracas. Até pelo contrário, fica bem claro que as falcatruas decorrem da falta de caráter dos corruptores e dos corrompidos.
Daí a importância de os brasileiros exigirem políticos com ficha limpa. Quem tem de impor essa exigência nacional são os partidos. É deles a responsabilidade de, na hora de organizar as chapas para as eleições, impedir que os fichas-sujas possam concorrer.
Muitos tentarão burlar esse desejo da maioria de nosso povo. Vão-se basear na expressão "ninguém será julgado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória", que consta do artigo 5.º da Constituição. Tudo bem. Ninguém é contra essa ressalva garantidora. Mas ninguém desconhece, também, o fato de que são longos, difíceis e às vezes quase impossíveis de vencer os prazos, os recursos, os embargos e tudo o mais que atravanca o andamento de processos no nosso Judiciário!
O problema é que os prazos entre as eleições são sempre curtos, enquanto os prazos para sentenças penais, tramitadas em julgado, são sempre muito longos!
Onde estão os políticos flagrados em plena delinquência? Quem já foi atingido por sentença penal transitada em julgado? Quantos estão impedidos de disputar nessas condições? Quem está preso, cumprindo pena? Qual o resultado positivo?
Vamos continuar aguardando o Judiciário? Não dá.
Agora é a hora dos partidos. Dia 3 de outubro vai ser a hora do eleitor. Quem vai ter o poder de não aceitar as inscrições? Os partidos. Só depende deles o Brasil continuar sendo uma democracia de respeito. Só eles, sem ofender o inciso do artigo 5.º da Lei Maior, podem rejeitar quem pretenda usar suas legendas como abrigo.
O candidato está indiciado? Desviou dinheiro público? Usou caixa 2? Bancou corrupção? Ficou rico de repente? Tomou parte em licitações de cartas marcadas? Organizou milícias? Invadiu propriedades? É protegido do crime organizado?
Dá para ser prudente, não dá? Mas se, para tristeza nossa, os partidos abrirem vaga na legenda para os fichas-sujas, cabe a você, eleitor, barrar esses mesmos fichas-sujas na urna.
Eleitor de alma limpa só vota em ficha-limpa!
PROFESSORA, JORNALISTA, FOI DEPUTADA FEDERAL CONSTITUINTE, FUNDOU E PRESIDIU O BNH
NO GOVERNO CASTELO BRANCO
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