Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, julho 07, 2009

Miriam Leitão Alerta vermelho

O GLOBO 

O governo tem enganado muita gente sobre a questão fiscal, mas não Rogério Werneck, um sólido conhecedor do assunto, em todos os detalhes. O processo de conquista de uma moeda estável passou pelo penoso tema das contas públicas. Por isso, qualquer reversão é um perigo. O economista mostra que governo e oposição estão solapando o arcabouço institucional conquistado.

Em entrevista concedida a Regina Alvarez, do GLOBO, Rogério disse, no domingo, que há uma operação desmanche em curso.

As bases dos avanços fiscais e institucionais estão sendo desfeitas. Vale a pena repassar aqui alguns dos seus argumentos, porque os custos dos erros de agora ficarão para os próximos anos. Os economistas do mercado financeiro têm, em sua maioria, um olhar superficial para a questão.

Olham os indicadores que pesam para as agências de risco darem seu veredicto.

Ora, as agências de risco! Prefiro ficar com os alertas mais consistentes de Rogério Werneck. Aqui vai uma lista com os pontos do professor da PUC-Rio:

Política fiscal anticíclica só pode ser feita com gastos reversíveis. E o governo está chamando de anticíclico o que é aumento dos gastos correntes como elevação do custo do funcionalismo.

Quando a crise acabar, eles não poderão ser anulados.

Na relação com os estados, o governo abriu "um guichê de favores". Isso tem um claro objetivo político, sobre o qual o economista não falou, mas cada um pode concluir. Do ponto de vista fiscal, pode detonar um processo de "eu também quero" interminável.

O governo está aceitando renegociar as dívidas dos estados.

O aparelhamento do Banco do Brasil para forçar uma queda das taxas de juros bancárias. O BB, como todos sabem, quebrou durante a crise bancária e teve que ser capitalizado pelo dinheiro de todos nós. Rogério não falou na Caixa, mas ela também está indo pelo mesmo caminho.

O aparelhamento do Banco do Brasil para forçar uma queda das taxas de juros bancárias. O BB, como todos sabem, quebrou durante a crise bancária e teve que ser capitalizado pelo dinheiro de todos nós. Rogério não falou na Caixa, mas ela também está indo pelo mesmo caminho.

Há ainda grandes riscos na Previdência. Um deles, da revisão dos poucos avanços recentes. A retirada do fator previdenciário está sendo negociada. Além do custo direto disso, ainda se formará um novo esqueleto pelas ações dos que se sentirem prejudicados pelo período de vigência do fator.

Há ainda o risco de uma nova dívida de R$ 36 bi com a derrubada do veto presidencial a um reajuste equiparado ao mínimo de 2006. Poucos economistas têm falado sobre riscos fiscais.

Os que estão no mercado financeiro já encurtaram seu olhar. Limitam-se a olhar a relação dívida pública líquida como percentual do PIB e pensar: ela caiu para 35%, teve uma pequena subida agora para 40%, mas voltará a cair no futuro. Não é problema, dizem.

Estão enganados.

A dívida mais cara é a interna, e ela subiu de 40% do PIB para 60% do PIB no período do governo Lula em que a arrecadação mais subiu.

Neste momento em que os juros estão caindo, há um bônus, que é a queda do custo dessa dívida. Isso é uma oportunidade, lembrou Rogério, que está sendo desperdiçada.

O professor apontou também outro ponto crônico: o fato de que o governo não consegue investir. "Há muito tempo a economia brasileira vem lidando com séria atrofia do investimento público".

Quem apenas aprecia a cena brasileira, pode achar que é exagero, já que aí está o PAC aumentando o investimento.

É engano. Quem desfaz o engano é quem tem a paciência de ficar a fazer as contas, como o economista Gil Castelo Branco, do site Contas Abertas. Ele compara o que é dito pelo governo nos seus balanços do PAC com a realidade.

Foi assim que ele descobriu que só 3% dos projetos previstos para terminar em 2010 estão prontos. O governo diz que são 16%, mas é porque, por alguma razão não explicada, retirou as obras de saneamento do balanço.

O economista Alexandre Marinis, da Mosaico Economia Política, também vem mostrando consistentemente, há anos, os riscos e a exorbitância do aumento dos gastos com funcionalismos.

Pelas suas contas, se os aumentos dos gastos com funcionários tivessem se limitado a acompanhar o crescimento do PIB, o país teria R$ 75 bilhões por ano para novos investimentos.

A "Folha de S. Paulo" de ontem publicou que o governo está aumentando a retirada de dividendos das estatais.

Isso ocorre exatamente num momento em que a crise reduz lucros e possibilidade de investimento das empresas. Com esse aumento dos dividendos, o governo está se financiando.

O governo fala agora em reduzir a contribuição do empregador sobre a folha de salários da empresa como forma de incentivo econômico.

Seria ótimo se fizesse mesmo, mas fez tantas concessões setoriais que não pode agora adotar essa. A diferença é que esta medida de estímulo seria para todas as empresas formais e incentivaria a formalização.

Melhor do que distribuir vantagens para setores escolhidos. Agora que a arrecadação está caindo, dificilmente a idéia sairá da promessa.

A erosão das contas públicas se faz por medidas que isoladamente não apresentam riscos. Todas juntas estão provocando um retrocesso fiscal perigoso, do qual não se tem dimensão exata neste momento. Alguns poucos falam sobre o tema. Eles precisam ser ouvidos.

Em nome do futuro.

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