Entrevista:O Estado inteligente

domingo, julho 12, 2009

Alberto Tamer -Obama quer mais ações e menos reuniões

 
O Estado de S. Paulo - 12/07/2009
 

 

Terminaram as reuniões de cúpula na Itália. Muitas recomendações, poucas decisões. Promessa de não recorrer ao protecionismo, de doar US$ 20 bilhões para conter o avanço da fome, mesmo tendo sido liberados apenas 25% do que se prometera antes. Barack Obama pediu menos reuniões - "em seis meses de governo participei de uma porção delas" - e mais ação. 

Disse também que "uma coisa a ser feita é lutar contra a tentação do cinismo". Traduzindo, prometer tudo, adiar tudo ou não fazer nada. E, depois, marcar outra reunião para prometer tudo de novo e cumprir quase nada. A próxima até já foi marcada: setembro, em Nova York. E outras mais virão. 

NÃO CONTEM COM OS EUA

Pensando bem, talvez o fato mais importante desse encontro foi o aviso de Obama, quando encontrou Lula. Foi surpreendentemente franco: não contem mais com os EUA para crescer. A economia americana não voltará tão cedo aos níveis anteriores da crise, disse ele. Obama não disse, mas ficou subentendido que o governo americano não só vai estimular o seu mercado, como não fará qualquer concessão comercial que prejudique produtores e exportadores. A prioridade do seu governo é crescer a qualquer custo.

DÉFICIT DESPENCA NOS EUA

No mesmo dia em que Obama fazia essa afirmação, o Departamento do Tesouro anunciou que, em maio, o déficit comercial americano caiu ao nível mais baixo dos últimos 10 anos.

Um recuo de 7,5%.

Causa: as exportações aumentaram 1,6% e as importações recuaram 0,6%. E a tendência é essa. A desvalorização do dólar e o desaquecimento do mercado interno, entre outros fatores, levam as empresas a se voltarem mais para o mercado externo. É inevitável. 

E não são apenas EUA, não. China, Europa, Japão fazem a mesma política. E o Brasil também. Todos estão lutando por um espaço maior num mercado mundial cada vez menor. 

ENTÃO FOI TUDO INÚTIL

O encontro que mobilizou presidentes dos principais países do mundo, reunidos em grupos como G-7, G-8, G-5, G-20, não valeram nada? Seria leviano afirmar isso. Ele serviu para apresentar sugestões, expor ideias, analisar cenários, debater estratégias, descobrir o que está errado e o que precisa ser feito. O cenário que sai desse encontro, muito claro: a crise amainou, mas a recessão ainda não passou. É preciso agir. Aí que, todos, principalmente os países desenvolvidos, não tomaram decisões mais firmes. Diante de divergências que abrigam também os países emergentes, divididos, preferiram limitar-se a afirmar que "seria prematuro começar a desfazer planos de estímulo". Só que a Alemanha, que nem o iniciou de verdade, discorda. E a Rússia também. Conclusão realista, cada um faça o que bem entender. 

Foi uma vitória sobre aqueles que lutaram contra a política de estímulos.

É grave? Não, nem um pouco. Nada muda. Quem está agindo sai mais rápido da recessão e quem não está, abundará ainda mais. O Brasil não está nem aí.

AH! HOUVE DOHA!

E eu ia esquecendo do nosso cadáver insepulto. Sim, sim, o G-20 depois de muita hesitação e resistência dos Estados Unidos e da União Europeia, concordaram em retomar as negociações de Doha e concluí-las em 2010. Mas, acreditem, é mais ou menos isso que eles fazem praticamente todos os anos. Desde 2004! 

O G-8 e os emergentes que, a partir da agora, além de Brasil,Índia, China, Austrália e África do Sul (os dois novatos), deram instruções para que seus ministros "explorem imediatamente todas as avenidas possíveis" dentro da OMC e se reúnam antes da próxima cúpula. Será que não vimos isso antes?

RICOS MAIS FRACOS?

Em meio a tudo isso, ficou a impressão de que os países ricos saíram mais fracos desse encontro. Obama até reconheceu que o grupo não está preparado para enfrentar a nova crise, mas parou aí. Eles se enfraqueceram, sim, porque não chegam a uma conclusão, porque não cumprem nunca o que prometem. É o "cinismo" de que fala Obama.

Mas até aí, não há novidade. Os outros também não se entendem e não cumpriram nada do que prometeram em todas as reuniões de emergência realizadas depois que o sistema financeiro e a economia mundial começaram a afundar. Exemplo? Há muitos. Limito-me a apenas, a mais falsa. O firme compromisso dos 20 países de não usarem o câmbio nem adotarem medidas protecionistas de qualquer espécie. E desde então o protecionismo deslavado só vem aumentando.

VIVENDO SEM OS GÊS...

O pífio resultado dessas reuniões é grave? Não. Isso vai atrasar a recuperação mundial por alguns trimestres, haverá mais desemprego e sofrimento que poderia ter sido evitado, mas a economia acabará superando a crise e voltará a crescer. Mas será que esses países não se decidiram mesmo por uma ousada política de estímulo financeiro e fiscal? Não vão mudar? Pode ser. Mas, acreditem, não tem a mínima importância para o que vier a acontecer. Para uma saída mais rápida da recessão mundial seria importante, isto sim, que os países desenvolvidos fizessem, neste exato momento, um esforço extremo para sair da recessão e retomar o crescimento. Juntos ou não. Eles representam quase 50% do PIB e do mercado mundial. Com "gês" ou "sem gês", é deles que depende a recuperação da economia mundial.

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