Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 18, 2009

A exposição Caminhos da Fé, em Ouro Preto

A FÉ QUE MOVEU O MUNDO

Exposição em Ouro Preto revela a riqueza
da arte barroca produzida nas colônias
europeias entre os séculos XVI e XVIII.
Das Filipinas ao Brasil

Fotos Divulgação
FÉ GLOBALIZADA O Arcanjo São Miguel mineiro (à esq.) e a Pietà vinda da Guatemala (à dir.): "O barroco brasileiro era superior"


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Entre as décadas de 50 e 90, o francês Jacques Boulieu rodou o mundo como executivo de uma multinacional do ramo da perfumaria. Em suas andanças da Ásia à América Latina, ele se aprofundou numa paixão que nutria desde a infância, vivida entre os quadros colecionados por seus pais na França: a arte sacra. Boulieu comprou suas primeiras peças numa viagem à Bahia, em 1959. Então recém-casado com uma mineira também aficionada do gênero, Maria Helena, não parou mais de investir nisso. O casal, que reside no Brasil desde aqueles tempos, acumulou 1 000 dessas relíquias. Boulieu adotou a cidade mineira de Ouro Preto, paraíso inescapável para os amantes desse tipo de arte, como um lar espiritual. E, agora, faz dela o palco de uma iniciativa extraordinária. Setenta peças de sua coleção poderão ser vistas publicamente pela primeira vez na mostra Caminhos da Fé, que ocorre a partir desta segunda-feira no Centro Cultural e Turístico da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg). Boulieu e a mulher não só promoverão a exposição: suas obras serão doadas para a criação de um futuro museu. Garimpadas em lugares como Índia, Sri Lanka, Filipinas, Peru e Bolívia, elas compõem um panorama da arte religiosa nas colônias europeias nos séculos XVI a XVIII. A diversidade de origens proporciona uma visão comparativa do barroco brasileiro com seus equivalentes de outras paragens.

TESOUROS DIVINOS A Cabeça de São Francisco, das Filipinas, e a placa de metal boliviana usada para refletir a luz das velas nas igrejas: modelos europeus

Como nota Boulieu, a arte religiosa do período é um testemunho do êxito dos colonizadores portugueses e espanhóis num de seus maiores objetivos: a conversão dos povos dessas regiões à fé católica. Ao traduzirem seu fervor nessas peças, os artesãos miravam-se nos exemplos europeus, mas não deixavam de imprimir nelas elementos de sua cultura nativa. Numa das seções, observam-se as nuances na representação de arcanjos. Na versão brasileira, esculpida em madeira dourada por um artista anônimo mineiro do século XVIII, o arcanjo São Miguel é retratado como um militar em pose de combate. Numa escultura da Bolívia, o personagem empunha aquela que era a última palavra em armas na época – a espingarda. O arcanjo mexicano, por outro lado, é bem menos militarizado e tem expressão de menino ingênuo.

Entre as peças estrangeiras notáveis há uma Cabeça de São Francisco vinda das Filipinas. Ela atesta como o santo católico, retratado com um rosto arredondado e cabelos crespos, já era popular naquela parte então remota do mundo. Da Bolívia vem outro item curioso: uma placa de metal adornada com riqueza de detalhes, que era usada como uma espécie de refletor para realçar a luz das velas nas igrejas. Na comparação entre peças como essas e a parte brasileira, percebe-se o peso das tradições dos colonizadores. Os santos do barroco mineiro, que bebeu da arte religiosa portuguesa, têm traços mais suaves e delicados que os de uma escultura de clara influência hispânica como uma Pietà da Guatemala em que a cena da Virgem Maria com o corpo de Cristo em seu colo ganha cores escuras e expressões austeras. Para Boulieu, a lição que se tira da mostra é que a arte sacra que floresceu em Minas Gerais foi superior. "O barroco se desenvolveu aqui com mais liberdade e invenção", diz.

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