Virou moda dizer que a crise financeira representa
a queda do Muro de Berlim do capitalismo. Livro mostra
que essa ideia não passa de uma tremenda bobagem
Giuliano Guandalini
Nguyen Huy Kham/Reuters |
FÁBRICA DE RIQUEZA |
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O aprofundamento da crise financeira internacional açulou, em todo o mundo – e no Brasil, particularmente –, a arenga manjada contra o capitalismo. Diante do estrago causado pela turma de Wall Street, os liberais ficaram contra as cordas. Poucos têm coragem de defender com a mesma ênfase de antes as virtudes intrínsecas do liberalismo. Em meio ao desemprego crescente, a tombos recordes dos PIBs e ao desastre das bolsas, multiplicam-se as críticas baseadas em premissas tortas do tipo: "Se o mercado está sempre certo, por que se meteu nessa encrenca e clama pelo socorro do governo?". Um dos poucos a enfrentar o simplismo e a miopia do momento é o jornalista Carlos Alberto Sardenberg, comentarista econômico da Rede Globo e apresentador da rádio CBN. Sardenberg acaba de destruir o tresvario do novo apelo socialista em Neoliberal, Não. Liberal (Editora Globo; 168 páginas; 28 reais). O ponto central do livro: "Alguns chegaram a dizer que a falência do banco Lehman Brothers estava para o capitalismo assim como a queda do Muro de Berlim esteve para o socialismo. Bobagem... Quanto mais capitalismo, melhor; quanto mais mercado livre, melhor".
O livro é baseado, em parte, em artigos já publicados nos últimos anos nos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo, nos quais o jornalista também colabora. A tese de Sardenberg é a de que as crises do capitalismo vêm e passam. É assim que tem ocorrido há mais de um século, pelo menos. O regime de mercado sempre se renova, e, cedo ou tarde, recupera sua capacidade de produzir e distribuir riqueza. "As mais espetaculares fases de crescimento mundial se deram sob a égide das práticas mais liberais", escreve o autor. "O momento mais brilhante da economia mundial moderna ocorreu no início deste século XXI, no auge da globalização."
Segundo o jornalista, o aumento recente da presença do estado na economia deve ser entendido como algo emergencial, e não como a prova de que o estado é moralmente superior a empresas e pessoas, como sustenta o esquerdismo ouriçado. Busca-se hoje a ajuda do estado simplesmente porque ele detém o monopólio de cobrar impostos e imprimir moeda. Só isso. Esse tipo de intervenção governamental, aliás, já ocorreu no passado e cabe perfeitamente dentro do figurino de um estado democrático capitalista. De tempos em tempos, como diz Sardenberg, o pêndulo oscila entre a proeminência de um capitalismo temperado pelo socialismo, com forte interferência estatal, e a hegemonia de um liberalismo mais radical. É essa maleabilidade que já deu ao capitalismo mais de sete vidas.
Marina Malheiros/AE |
FALTA CAPITALISMO
"Ficamos assim: o que gera riqueza é o capitalismo e ponto final. Mas ainda persiste, por toda parte, o entendimento de que é preciso intervenção do estado para corrigir as injustiças do capitalismo — e isso é a esquerda de hoje. O problema é que essa boa intenção coincide com a velha fisiologia, a prática de setores privados de ocupar o estado para obter privilégios. O resultado é que as intervenções e regulamentações do estado tendem a gerar ineficiência e injustiça. Pensaram no Brasil? Acertaram. Não sobra neoliberalismo. Falta capitalismo."
Trecho de Neoliberal, Não. Liberal, de Carlos Alberto Sardenberg