ESTADO DE S. PAULO
Dois governadores no exercício do mandato foram cassados pela Justiça Eleitoral e outros seis correm o risco de perder os mandatos por abuso do poder econômico nas respectivas eleições.
Convenhamos, uma situação inteiramente nova numa terra de costumes eleitorais discutíveis, embora social, política e juridicamente tolerados. Mais: consolidados.
Tão sólidos que se o espírito (de porco) não estiver vigilante chega a soar aceitável a grita dos partidos em defesa da tese de que a Justiça desrespeita e pretende se substituir à vontade do eleitor.
É que nos dois casos já julgados se determinou a posse dos segundos colocados na eleição, rejeitados nas urnas.
O eleitorado não os quis governadores, é verdade. A Justiça Eleitoral deveria por isso ignorar sua convicção firmada a partir do relato dos autos e mandar às favas os fatos em nome do fato consumado?
Sempre foi essa a escolha. Fechar os olhos, manter os ouvidos tampados e se entregar ao mandamento do voto como o santo remédio para todos os pecados.
Mas e se os pecados cometidos no processo tiverem alterado a vontade real do eleitor que não seria aquela expressa na proclamação dos resultados e defendida com tanto afinco?
Como em toda polêmica, há razão de parte a parte. A Justiça não pode deixar de julgar ações nem decidir contra o que diz a lei. Ao mesmo tempo, o eleitor também não é obrigado a aceitar a vitória do perdedor.
O dilema se estabelece porque não há como saber se o abuso condenado alterou ou não o resultado da eleição. Se tiver modificado, a substituição pelo segundo colocado é justa; se não tiver mudado a ordem dos fatores, o eleitor é punido junto com o infrator.
A reclamação amesquinhada dos partidos não resolve a questão. Ao contrário. Denota vontade de manter as coisas como estão. É um sofisma, para não dizer um elogio ao cinismo, o argumento de que há perigo de as cassações na Justiça virarem rotina.
Primeiro, porque parte da premissa de que o Judiciário possa tomar decisões levianas, sem sustentação factual. Em segundo lugar, denota total despreocupação com a rotina de infrações em vigor por anos a fio.
Se o abuso é rotineiro, a Justiça tem obrigação de fazer da punição um hábito incorporado ao cenário e pedagogicamente inibidor de novas transgressões.
Interessante perceber como o protesto dos partidos é seletivo, distante do campo dos princípios.
Não há uma reação conjunta ou sustentada num critério geral. Cada legenda reclama na medida da contrariedade de seu interesse específico.
O PSDB levantou a bandeira quando Cássio Cunha Lima foi tirado do governo da Paraíba e o PDT acordou para o tema quando Jackson Lago foi condenado a deixar o cargo por decisão do Tribunal Superior Eleitoral ainda passível de recurso.
O PT em breve se associa ao movimento. O próximo da lista é Marcelo Déda, de Sergipe, seguido por Luiz Henrique (SC) e Marcelo Miranda (TO), o que fará o PMDB engrossar o rol dos indignados.
É justo que defendam os seus. Mas o protesto contra uma Justiça ativa e corretiva não é compatível com a pregação em prol da reforma nos meios e modos políticos.
A interrupção de mandatos por crimes eleitorais comprovados é ponto pacífico. Pelo menos enquanto os partidos não se reunirem para assumir de peito aberto a insatisfação e instituírem a legalidade do uso da máquina em favor do gestor público.
Em aberto fica a forma de substituição do condenado: se por ascensão do derrotado ou por nova eleição.
Questão a ser examinada proximamente pelo Supremo Tribunal Federal, que deverá julgá-la, abrindo espaço a um debate excelente. Mais não seja para sacudir da política brasileira um pouco da poeira do finório faz-de-conta.
Afinidade transitória
O senador Aloizio Mercadante acha que faltou uma "leitura mais profunda" sobre a eleição de Fernando Collor para a presidência da Comissão de Infraestrutura do Senado, segundo ele resultado de uma "aliança espúria" entre as forças do atraso.
A maioria delas aliada ao governo Lula, Mercadante não nega. No episódio, o PT aliou-se ao PSDB, o que, na visão do senador petista, aflora afinidades antes já reveladas entre os dois partidos.
A votação, aponta, reproduziu a conformação partidária que ajudou a derrubar o governo Collor.
"O DEM deu o último voto que garantiu a presidência da comissão, repetindo o apoio dado pelo PFL 20 anos atrás. Do outro lado, PT, PSDB e PDT, aliados no segundo turno da eleição de 1989 e, depois, na CPI do PC."
Logo, "temos valores semelhantes e isso nos diferencia dos partidos sem projeto de poder". Na opinião de Mercadante, é justamente a disputa do poder o que os distancia e os faz reféns da fisiologia.
Até onde a vista dele alcança, de maneira irremediável. "Daí a impossibilidade de uma chapa Dilma-Aécio, ou coisa parecida."
Dois governadores no exercício do mandato foram cassados pela Justiça Eleitoral e outros seis correm o risco de perder os mandatos por abuso do poder econômico nas respectivas eleições.
Convenhamos, uma situação inteiramente nova numa terra de costumes eleitorais discutíveis, embora social, política e juridicamente tolerados. Mais: consolidados.
Tão sólidos que se o espírito (de porco) não estiver vigilante chega a soar aceitável a grita dos partidos em defesa da tese de que a Justiça desrespeita e pretende se substituir à vontade do eleitor.
É que nos dois casos já julgados se determinou a posse dos segundos colocados na eleição, rejeitados nas urnas.
O eleitorado não os quis governadores, é verdade. A Justiça Eleitoral deveria por isso ignorar sua convicção firmada a partir do relato dos autos e mandar às favas os fatos em nome do fato consumado?
Sempre foi essa a escolha. Fechar os olhos, manter os ouvidos tampados e se entregar ao mandamento do voto como o santo remédio para todos os pecados.
Mas e se os pecados cometidos no processo tiverem alterado a vontade real do eleitor que não seria aquela expressa na proclamação dos resultados e defendida com tanto afinco?
Como em toda polêmica, há razão de parte a parte. A Justiça não pode deixar de julgar ações nem decidir contra o que diz a lei. Ao mesmo tempo, o eleitor também não é obrigado a aceitar a vitória do perdedor.
O dilema se estabelece porque não há como saber se o abuso condenado alterou ou não o resultado da eleição. Se tiver modificado, a substituição pelo segundo colocado é justa; se não tiver mudado a ordem dos fatores, o eleitor é punido junto com o infrator.
A reclamação amesquinhada dos partidos não resolve a questão. Ao contrário. Denota vontade de manter as coisas como estão. É um sofisma, para não dizer um elogio ao cinismo, o argumento de que há perigo de as cassações na Justiça virarem rotina.
Primeiro, porque parte da premissa de que o Judiciário possa tomar decisões levianas, sem sustentação factual. Em segundo lugar, denota total despreocupação com a rotina de infrações em vigor por anos a fio.
Se o abuso é rotineiro, a Justiça tem obrigação de fazer da punição um hábito incorporado ao cenário e pedagogicamente inibidor de novas transgressões.
Interessante perceber como o protesto dos partidos é seletivo, distante do campo dos princípios.
Não há uma reação conjunta ou sustentada num critério geral. Cada legenda reclama na medida da contrariedade de seu interesse específico.
O PSDB levantou a bandeira quando Cássio Cunha Lima foi tirado do governo da Paraíba e o PDT acordou para o tema quando Jackson Lago foi condenado a deixar o cargo por decisão do Tribunal Superior Eleitoral ainda passível de recurso.
O PT em breve se associa ao movimento. O próximo da lista é Marcelo Déda, de Sergipe, seguido por Luiz Henrique (SC) e Marcelo Miranda (TO), o que fará o PMDB engrossar o rol dos indignados.
É justo que defendam os seus. Mas o protesto contra uma Justiça ativa e corretiva não é compatível com a pregação em prol da reforma nos meios e modos políticos.
A interrupção de mandatos por crimes eleitorais comprovados é ponto pacífico. Pelo menos enquanto os partidos não se reunirem para assumir de peito aberto a insatisfação e instituírem a legalidade do uso da máquina em favor do gestor público.
Em aberto fica a forma de substituição do condenado: se por ascensão do derrotado ou por nova eleição.
Questão a ser examinada proximamente pelo Supremo Tribunal Federal, que deverá julgá-la, abrindo espaço a um debate excelente. Mais não seja para sacudir da política brasileira um pouco da poeira do finório faz-de-conta.
Afinidade transitória
O senador Aloizio Mercadante acha que faltou uma "leitura mais profunda" sobre a eleição de Fernando Collor para a presidência da Comissão de Infraestrutura do Senado, segundo ele resultado de uma "aliança espúria" entre as forças do atraso.
A maioria delas aliada ao governo Lula, Mercadante não nega. No episódio, o PT aliou-se ao PSDB, o que, na visão do senador petista, aflora afinidades antes já reveladas entre os dois partidos.
A votação, aponta, reproduziu a conformação partidária que ajudou a derrubar o governo Collor.
"O DEM deu o último voto que garantiu a presidência da comissão, repetindo o apoio dado pelo PFL 20 anos atrás. Do outro lado, PT, PSDB e PDT, aliados no segundo turno da eleição de 1989 e, depois, na CPI do PC."
Logo, "temos valores semelhantes e isso nos diferencia dos partidos sem projeto de poder". Na opinião de Mercadante, é justamente a disputa do poder o que os distancia e os faz reféns da fisiologia.
Até onde a vista dele alcança, de maneira irremediável. "Daí a impossibilidade de uma chapa Dilma-Aécio, ou coisa parecida."