Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, março 09, 2009

De certo, só a incerteza.. Suely Caldas


Autor(es): Suely Caldas
O Estado de S. Paulo - 08/03/2009
Nos últimos dias algumas boas notícias animaram o ambiente econômico no Brasil, dando a açodada e falsa impressão de que o País começa a sair da crise. Mas há também as más notícias a desiludir os crédulos. Já do exterior, todas as informações que chegam são péssimas, a gravidade do quadro se aprofunda, o desemprego se potencializa e as quebradeiras no mercado financeiro causam espanto - depois de quase seis meses de crise aguda -, não dão trégua e parecem não ter fim. A mais recente foi da seguradora American International Group (AIG) que, depois de receber do Tesouro dos EUA US$ 150 bilhões em quatro socorros, pediu e obteve o quinto - mais US$ 30 bilhões. Na quarta-feira os mercados respiraram com a expectativa de ampliação de recursos públicos para estimular a economia chinesa, mas no dia seguinte a notícia não foi confirmada e o mundo voltou a cair na real.

Se o ministro Guido Mantega alimenta ilusões, deveria se convencer de que é nulo o efeito psicológico de suas análises otimistas e das tentativas de marcar data para o término da crise no Brasil. Seguidas vezes o fez e foi desmentido pelos fatos. Ninguém mais acredita. Infelizmente, enquanto não houver estabilidade econômica nos países ricos, os brasileiros continuarão convivendo com oscilações desencontradas.

É o que tem ocorrido com a indústria automobilística: temendo repetir aqui o tombo das matrizes no exterior, as montadoras paralisaram a produção em dezembro, deram férias coletivas aos empregados e começaram a se desfazer dos estoques. Em janeiro faltou automóvel para vender, em fevereiro a venda cresceu pouco (0,98%), mas cresceu. Só que continua a léguas de distância do desempenho até setembro de 2008. O estímulo do carro mais barato com o IPI reduzido e o freio da paralisação em dezembro causaram tal desequilíbrio entre estoque e venda que a Volkswagen foi levada a convocar 7 mil empregados para fazer hora extra em plena crise. Essa expansão vai perdurar? Demissões estão descartadas?

É claro que não. A única coisa certa nessa crise é a incerteza. Cada dia é igual ou diferente do anterior, ninguém sabe o que será o amanhã ou daqui a um mês. Decisões são pensadas na emoção do momento e podem ser rapidamente desfeitas. Como náufragos que se agarram a um casco, dirigentes de montadoras estrangeiras, reunidos em Genebra, prometeram concentrar a produção no Brasil se o governo prorrogar a desoneração do IPI nos carros. Mudarão de decisão se as vendas aqui recuarem. Não há compromisso com o futuro.

Esta incerteza é refletida no desencontro dos indicadores econômicos. Quer ver?

Em fevereiro a balança comercial foi superavitária em US$ 1,76 bilhão e saiu do déficit de US$ 524 milhões de janeiro. Graças a quê? À queda das importações, consequência da retração da atividade econômica.

Posição privilegiada no ranking das empresas exportadoras, a Embraer teve 30% de suas encomendas externas canceladas e demitiu 4.200 trabalhadores. O desemprego no País se alastrou em fevereiro.

Em janeiro, a venda de alimentos nos supermercados foi 6,54% maior do que janeiro de 2008, levando a Associação Brasileira de Supermercados a concluir que "a crise ainda não chegou à mesa dos brasileiros".

Em compensação, ao anunciar o crescimento de 6,2% na produção da indústria paulista em janeiro, o diretor da Fiesp, Paulo Francini, jogou água gelada nos otimistas: "Quem identificar o resultado de janeiro como início de um processo de recuperação contínuo vai errar", avisou. Na verdade, em janeiro a indústria paulista retomou a produção que paralisou em dezembro. Portanto, o efeito comparação resultou em aparente crescimento.

Depois de cinco meses de déficit, o fluxo cambial (entradas e saídas de divisas pelo mercado de câmbio) foi positivo em US$ 841 milhões em fevereiro.

Mas a inadimplência dispara: em janeiro, parcelas entre 15 e 90 dias atrasadas cresceram 25,9% em relação a dezembro e 149% se comparadas a janeiro de 2008.

O pior e mais grave indicador vem da expectativa de investimentos. Depois de despencar 16% em novembro e 10% em dezembro de 2008, a Associação Brasileira de Máquinas (Abimaq) projeta outra queda de 21% em janeiro na demanda por máquinas. As previsões de queda na taxa de investimento em 2009 oscilam entre 3% e 8%.

Ou seja, as notícias negativas superam as positivas. E, infelizmente, as oscilações desencontradas de indicadores prometem continuar nos próximos meses.

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