Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, abril 09, 2009

Suely Caldas Os Três Guardiões

Há três cargos no governo que, por sua própria natureza e em delicadas situações de crise econômica, exigem conduta técnica,séria e equilibrada de seus titulares: a presidência do Banco Central (BC),a Secretaria da Receita Federal e a Secretaria do Tesouro. Os três lidam com fatores macroeconômicos que influenciam o bom ou o mau desempenho da economia–inflação,juros,oferta e demanda,receita e despesa dos governos, dívida pública, equilíbrio e desequilíbrio financeiro da União, Estados e municípios. Se a inflação descontrola, os juros

perdem a função de equilibrar a oferta, os governos gastam mais do que arrecadam e o endividamento acelera. A população inteira sofre as consequências.

 

            O ministro do Trabalho pode delirar em sua fantasiosa previsãodecriar1milhãodenovosempregos em 2009. O risco de cair no ridículo é dele.Mas o secretário do Tesouro não pode ser visto com desconfiança e descrédito, suas análises e previsões para o futuro devem se ater à realidade econômica e à objetividade dos números, sem otimismo, sem pessimismo, simplesmente com realismo.Não foi bem o que aconteceu na última terça-feira,quando o secretário do Tesouro, Arno Augustin,divulgou o péssimo desempenho das contas do governo central em fevereiro.

 

            Com a arrecadação tributária desabando, as despesas do governo crescendo e o desemprego derrubando a receitada Previdência, Arno Augustin ignorou a realidade e garantiu: não há nenhum risco de desequilíbrio fiscal e o governo central vai conseguir cumprir a meta de superávit primário de R$ 17 bilhões do primeiro quadrimestre. Ora, se nos dois primeiros meses o superávit ficou em apenas R$ 3 bilhões, como conseguir excedente de R$ 14 bilhões em março e abril comum quadro econômico tão desfavorável? Alguém acredita? Fevereiro foi pior do que janeiro: comparadocom2008, subiram gastos com salários (25,4%), previdência (12,8%) e custeio (22,7%) e o resultado foi um déficit de R$ 926 milhões no mês.E a isso o secretário chama de política anticíclica. Anticíclica é gastar em investimentos, que são gastos transitório se produzem receita futura, não em despesas fixas como salários, custeio e previdência, obrigatórias e sem chance de serem removidas. Mas o governo Lula inventou um modelo inédito de política anticíclica.

 

            Sério, respeitado e de conduta até austera em certos momentos nesses seis anos e três meses à frente do Banco Central,Henrique Meirelles começa a dar sinais de adesão ao o ba-oba do ministro Guido Mantega. Claro, de forma lenta, discreta, coerente como que dele se conheceu nesse período. Não é homem de arroubos e mudanças bruscas. Mas ao falar da possibilidade de superação da crise, o otimismo de Meirelles anda soando um tanto esquisito: seria o seu desembarque do governo a caminho da candidatura a um cargo eletivo?

 

            Já a secretária da Receita Federal, Lina Maria Vieira, apesar da origem sindical,recentemente escolheu o caminho técnico e não o político ao contrariar promessa feita

pelo presidente Lula a um grupo de prefeitos e afirmar que a queda da arrecadação tributária não permite aumentar os repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) para as prefeituras.

 

            Nos três cargos, a conduta técnica também funciona como espécie de anteparo, defesa contra movimentos especulativos do mercado financeiro. Se há a percepção de intenção política em declaração de um deles, se suas análises e previsões fogem da realidade e são forjadas para atender a certos objetivos, os operadores do mercado aproveitam o deslize para realizar lucros especulando, derrubando preços de ativos de risco. E o País sai perdendo.

 

            Por isso os três precisam se resguardar, preservar o caráter técnico e de seriedade do cargo, enxergar essa crise com realismo, reconhecer que e latem chegado em ritmo e forma desiguais, atingindo primeiro o crédito, depois as empresas exportadoras – ampliando para outros setores –e as perdas do emprego têm sido crescentes. E o reflexo disso na arrecadação de impostos, nos três níveis de governo, tem se agravado mês a mês. No setor público, o cobertor encurta, a receita encolhe, as prefeituras de cofres vazios e a União vai precisar fazer mais cortes no Orçamento. É o preço pago pela decisão errada do governo de comprometer despesas permanentes e de longo prazo (contratações de mais de 100 mil novos funcionários, aumentos salariais), imaginando que a fase da bonança duraria para todo o sempre. ●

 

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