Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, abril 07, 2009

Código venal Dora Kramer


O ESTADO DE S. PAULO
Democracia Política e novo Reformismo


Só os privilégios de parlamentares e funcionários do Congresso divulgados desde o início deste ano legislativo já seriam suficientes para produzir um alentado compêndio sobre imposturas das mais variadas naturezas.

Se a essas informações mais recentes acrescentarem-se tantas outras anteriormente conhecidas, as ainda desconhecidas e as que ainda virão ao conhecimento do público, teremos à disposição uma verdadeira enciclopédia com verbetes de A a Z sobre condutas claramente inaceitáveis em qualquer parte, mas aceitas como normais no Poder Legislativo.

A cada nova denúncia, o Parlamento reage alegando que este ou aquele fato, ato ou situação atendem às regras vigentes na corporação. São de uso corrente, incorporadas ao cotidiano da corporação, "perfeitamente legais", regulares, pois.

Caso típico deste código cujas regras não resistem a um exame superficial feito com lupa embaçada é o aluguel de aviões particulares mediante a "troca" das cotas de passagens aéreas pelo pagamento das horas fretadas.

Os senadores acham naturalíssimo tal procedimento. Alegam que o escambo não é ilegal e invocam o testemunho de diretores da Casa para argumentar que tudo é feito dentro da mais completa correção.

Há ofícios comprovando, assinaturas avalizando, tudo na mais perfeita ordem burocrática, dentro, evidentemente, da ordem estabelecida e emoldurada dentro do sistema de regalias vigente naquele ambiente já definido como o melhor dos paraísos.

Ali é normal pagar hora extra nas férias porque assim reza a cartilha dos procedimentos internos. É normal achar que passagem em avião de carreira ou aluguel de jatinho obedecem à mesma concepção de instrumento de trabalho. É normal a existência de conselhos, comissões, diretorias e secretarias de fachada para justificar o pagamento de gratificações à corporação ávida por mais vantagens além daquela já oferecida pelo emprego estável e vitalício.

É normal o acúmulo da função pública e prestação de serviços privados. É normal transferir a passagem do parlamentar para o uso de amigos. É normal um pai "preocupado" entregar à filha um celular público para uso privado no exterior. É normal pagar a conta só depois da descoberta, esconder o valor gasto e dar por encerrado o assunto. É normal maquiar informações de gastos com serviços médicos para esconder o recorde de despesas.

Aqui fora, na vida - esta sim - normal, nem uma só dessas condutas é aceita como natural. Qualquer pessoa que se aproprie do bem de outrem é passível de sanção pelas leis - estas sim - normais que regem a sociedade como um todo.

Mas no Congresso é diferente. Há um código de leis todo próprio, pelo qual o que não é expressamente proibido no manual específico é permitido a partir da convicção de que quem consegue acesso, por concurso, eleição ou indicação, a uma instituição pública, passa a habitar um mundo onde todas as regalias são permitidas, desde que bem sustentadas por um ato normativo.
E um aguçado espírito de selvageria cívica.

Geografia

Em 2010, tudo indica, o critério para a composição de chapas eleitorais vai privilegiar a questão, já demonstra o desejo da cúpula tucana de juntar os governadores de São Paulo e Minas Gerais numa chapa puro-sangue.

A escolha de candidatos a presidente e a vice de um mesmo partido eram até pouco tempo atrás evidência de falta de estratégia, visão sectária ou pura e simples incapacidade de conquistar adesões. O parâmetro pesava menos ou era deixado de lado em nome de outros valores.

Em 1994 Marco Maciel foi vice de Fernando Henrique Cardoso muito mais pela filiação ao PFL do que pela naturalidade nordestina.

Em 2002, José Alencar entrou na chapa de Lula por ser um grande empresário, capaz de ampliar o eleitorado do PT no País todo e não por ter certidão de nascimento e domicílio eleitoral em Minas.

Agora, a cartilha aconselha que se escolham candidatos a vice capazes de mobilizar o eleitorado de determinadas regiões a fim de suprir carências dos titulares de chapa ou reforçar muito suas preferências ao ponto de desequilibrar o jogo do adversário.

Os tucanos acham que, com José Serra de presidente e Aécio Neves na vice, "fecham" o Sudeste e compensam a vantagem de Lula no Nordeste.

Pela mesma razão, Lula procura para Dilma Rousseff um vice de São Paulo. Se for do PMDB tanto melhor, porque "amarra" o partido à chapa oficial e acrescenta muitos minutos ao horário eleitoral de rádio e televisão.

Sondado por Dilma a respeito dias atrás, o presidente da Câmara, Michel Temer, ponderou se não seria mais prudente escolher alguém do Nordeste. Ouviu da ministra que por lá a cobertura está garantida: "Temos o nosso Lula."

É o que pensa também a oposição ao avaliar que não adianta apostar em vice do Nordeste para tirar a diferença.

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