Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, janeiro 02, 2009

A redescoberta de Campos de Carvalho

Livros
UMA CARREIRA INCOMUM

Dez anos depois da morte de Campos de Carvalho,
sua obra deixa de ser conhecida apenas por iniciados
para ganhar espaço em teatros e salas de aula


Lucila Soares

Fotos Luciana de Francesco e Valeria Mendonça
SUCESSO PÓSTUMO Campos de Carvalho e a montagem de Vaca de Nariz Sutil,
com os Parlapatões: o teatro impulsionou as vendas da obra completa, que já está
na sexta edição

O escritor mineiro Walter Campos de Carvalho (1916-1998) passou quase trinta anos sendo lembrado apenas por um pequeno público de admiradores fiéis. Depois de uma curta e brilhante carreira, retirou-se de cena em 1964, quando lançou O Púcaro Búlgaro, a louca história de uma expedição destinada a descobrir se a Bulgária realmente existe. Até 1978, colaborou com O Pasquim e O Estado de S. Paulo e, nos vinte anos seguintes, isolou-se de tal maneira que, em meados dos anos 1990, quando decidiu relançar seus romances, a editora Maria Amélia Mello, da José Olympio, teve dificuldade em confirmar se o autor estava vivo. O que se segue é tão inesperado quanto as peripécias dos romances de Carvalho. Dez anos depois de morto, ele se torna agora um pequeno fenômeno de popularidade.

Sua obra completa, em volume único que reuniu O Púcaro Búlgaro, Vaca de Nariz Sutil, A Lua Vem da Ásia e A Chuva Imóvel, está na sexta edição, algo raro em se tratando de antologia de um autor "marginal". Mas não é só isso. A ficção de Campos de Carvalho tem elementos surrealistas, toques de teatro do absurdo e um humor por vezes rasgado, tudo misturado a uma visão crítica e amarga do mundo. Não são textos fáceis e digestivos. Apesar disso, as versões para teatro do Púcaro (de Aderbal Freire-Filho) e de Vaca de Nariz Sutil (com os Parlapatões) tornaram-se sucesso de público. Com quase duas horas de duração, O Púcaro ficou seis meses em cartaz no Rio de Janeiro e quatro em São Paulo, com casa lotada e público às gargalhadas diante de absurdos como: "Se a Bulgária existe, então a cidade de Sófia terá que fatalmente existir. Este o único ponto no qual parecem assentir os que negam e os que defendem intransigentemente a existência daquele amorável país, desde os tempos antediluvianos até os dias pré-diluvianos de hoje".

Essa inesperada carreira teatral – que surpreendeu o próprio Aderbal – acabou impulsionando as vendas dos livros, algo que também não é comum no mercado editorial brasileiro. E levou a editora a lançar os quatro romances em volumes separados, um formato que atende a outro filão no qual a obra do autor vem sendo valorizada: as salas de aula. A carreira internacional de Campos de Carvalho também só começou a acontecer depois de sua morte. A Chuva Imóvel e A Lua Vem da Ásia foram traduzidos para o francês, Vaca do Nariz Sutil, para o francês e o italiano. E, na semana passada, chegou à sua editora uma carta comunicando o projeto da Embaixada do Brasil em Sófia de traduzir para o búlgaro e lançar na Bulgária em 2009... O Púcaro Búlgaro. Essa nem Campos de Carvalho poderia imaginar.

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