Você e seu plano de saúde
Estadão
Quem tem plano de saúde privado já pode ter passado pela situação de ter o atendimento negado porque o médico, laboratório ou hospital procurado deixaram de fazer parte da rede do convênio. Não são apenas os planos que descredenciam médicos, laboratórios ou hospitais para reduzir custos. Mais frequentemente, acontece o contrário. São estes também que [...]
Quem tem plano de saúde privado já pode ter passado pela situação de ter o atendimento negado porque o médico, laboratório ou hospital procurado deixaram de fazer parte da rede do convênio.
Não são apenas os planos que descredenciam médicos, laboratórios ou hospitais para reduzir custos. Mais frequentemente, acontece o contrário. São estes também que descredenciam os planos de saúde pelas lambanças que praticam. O problema acaba desabando sobre o beneficiário que escolheu o plano de saúde pelos serviços prometidos e, lá pelas tantas, fica sabendo que não mais pode contar com eles, embora siga pagando o preço combinado.
A Lei 13.003/14, sancionada há 11 dias pelo governo federal, pode ser parte da solução para problemas desse tipo. A nova legislação obriga as operadoras do setor a substituir médicos, clínicas e laboratórios que deixarem de atender pelo convênio. Também dispõe que têm de comunicar os clientes sobre mudanças desse tipo com pelo menos 30 dias de antecedência. A regra, que já valia para hospitais, passa a incluir os demais prestadores de serviços.
Também fica determinado que, até o final deste ano, as operadoras devem firmar contratos por escrito com todos os credenciados, sejam hospitais, clínicas, laboratórios ou médicos. O documento deverá conter quais os serviços prestados, sua respectiva remuneração, prazos de pagamento, critério e periodicidade dos reajustes.
Para Aloísio Tibiriçá, vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), a lei trará mais segurança jurídica para os médicos e mais transparência para os beneficiários: "Há aí um limbo jurídico e as resoluções da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) foram ineficazes para dirimir conflitos".
De um lado, os consumidores sofrem com os gargalos no atendimento, com enormes filas em prontos-socorros e meses de espera no agendamento de consultas e exames. Já os médicos se queixam da má remuneração e, no caso de clínicas e laboratórios, da demora excessiva na autorização de procedimentos.
As operadoras de planos de saúde, por sua vez, reclamam da escalada dos custos. A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que reúne 17 empresas do setor, aponta aumento de 133,7% na despesa assistencial per capita entre 2004 e 2013. No mesmo período, a inflação acumulada foi de 61% e o aumento do salário mínimo, de 160%. Em nota, a FenaSaúde afirmou que "lamenta a interferência da ANS nos reajustes dos contratos" e que "no cenário de escalada de custos, a livre-iniciativa e a liberdade de contratação são essenciais para estimular a concorrência e a melhoria da qualidade dos serviços".
Na avaliação de Enrico de Vettori, especialista em Saúde da consultoria Deloitte, a nova lei não resolve os problemas: "Dá mais garantias ao consumidor e aos médicos, mas tira flexibilidade das operadoras com a rede de credenciamento, o que tende a puxar os custos para cima e a prejudicar a qualidade do atendimento".
As operadoras se desdobram em queixas sobre o aumento dos custos, mas escondem os dados que as beneficiam e lhes proporcionam enormes ganhos de escala. Nos últimos 10 anos, o número de beneficiários de planos de saúde privados no Brasil saltou 56%. E as receitas em contraprestações cresceram 283%, como apontam as estatísticas da ANS.
Independentemente disso, as portas dos planos de saúde vão se fechando para as pessoas físicas. A participação dos planos individuais no número total de beneficiários no Brasil recuou de 20,5% em 2001 para 19,9% em 2013. No mesmo período, a fatia dos planos coletivos passou de 43,4% em 2011 para 79,0% em 2013, incluídos os planos empresariais e por adesão (contratados por conselhos, sindicatos e associações profissionais).
As administradoras preferem os planos coletivos e empresariais, cujas bases são negociadas diretamente com as empresas contratantes. "Nesses casos, o reajuste de uma apólice anual tem oscilado entre 20% e 50%", afirma Vettori.
Enquanto isso, os convênios contratados por pessoas físicas têm reajuste determinado pela ANS. Na sexta-feira, por exemplo, a correção anual máxima a ser aplicada nas mensalidades dos planos individuais até abril de 2015 foi limitada a 9,65%.
É mais uma distorção num modelo que dá sinais de esgotamento. / COLABOROU DANIELLE VILLELA
Enviada do meu iPad