A marca do autoritarismo bolivariano
O presidente da Bolívia, Evo Morales, inscreveu-se para disputar um terceiro mandato nas eleições do dia 12 de outubro. Nenhuma surpresa. Ele está apenas seguindo o que determina o kit bolivariano, desenvolvido por Hugo Chávez e adotado por seus discípulos. Este instrumento requer um líder carismático e popular que vença uma eleição no regime democrático, obtendo ampla maioria legislativa. A partir daí, ele convoca uma assembleia constituinte para "refundar o país". Itens obrigatórios da nova constituição são a dissolução dos partidos, amplas reformas que subordinem Legislativo e Judiciário ao Executivo, e a possibilidade de reeleições sucessivas. A democracia se transforma em fachada oca.
Chávez levou o esquema ao limite. Via referendo, outra ferramenta muito usada pelos bolivarianos, obteve "autorização popular" para se reeleger indefinidamente. Só a morte o impediu. Morales, Rafael Correa (Equador) e Daniel Ortega (Nicarágua) seguem a mesma cartilha. Cristina Kirchner flertou com o expediente para um terceiro mandato, mas desistiu por não ter perspectivas de vitória. Ex-líder cocaleiro, Morales é o primeiro presidente indígena da Bolívia, eleito pela primeira vez em 2006. Ainda que a legislação boliviana proíba uma segunda reeleição consecutiva, Morales teve a candidatura endossada pelo tribunal constitucional. A corte concluiu que o primeiro mandato dele não poderia ser levado em conta, pois teve início antes da entrada em vigor da nova Constituição, em 2009. Muito criativo.
Para ser reeleito, precisa de mais de 50% dos votos válidos ou de um mínimo de 40% mais uma diferença de 10 pontos sobre o segundo colocado. Caso contrário, haverá segundo turno dia 7 de dezembro. Seu governo nacionalizou setores-chave da economia, como o da exploração de gás, chegando estatizar uma instalação da Petrobras. Mas também garantiu segurança jurídica para companhias estrangeiras que quisessem investir em áreas como a mineração. Nos últimos anos, a Bolívia voltou ao mercado internacional de capitais. A condução prudente da economia tornou destaque a nação mais pobre da América do Sul: de 2007 a 2012, a expansão média do PIB foi de 4,8%. Em 2013, 6,5%. Para 2014, o FMI projeta avanço acima de 5%. Morales consolidou alianças com sindicatos e mantém forte apoio entre os indígenas, sobretudo os da região andina, e em setores populares urbanos. Seu desafio é reconquistar a classe média urbana, insatisfeita com denúncias de corrupção.
O principal problema de Morales é o mesmo de todos os bolivarianos. Esses líderes não preparam sucessores. É como se fossem imortais. Dirigem, portanto, regimes autoritários com prazo de validade — o do tempo de vida do caudilho.. Mantêm o ritual das eleições. Mas são a maior prova de que isto é insuficiente para a democracia, que tem na alternância no poder uma característica essencial. E a isto os bolivarianos são alérgicos.
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