O ESTADO DE SÃO PAULO - 13/02/11
BRASÍLIA - O ministro da Fazenda é o mesmo, mas o Guido Mantega do governo Dilma Rousseff perdeu as certezas que tinha no governo Lula. É uma "desenvolvimentista" que agora tem de ser "fiscalista", mas ainda não consegue convencer o mercado das intenções apregoadas. Está no meio de um debate cruzado e com medo de virar o ministro que pode derrubar o crescimento da economia. No governo Lula, a posição era confortável: brigava com o Banco Central de Henrique Meirelles e navegava na fama de fazer "o que Lula mandava", um ministro colado em um chefe com 80% de popularidade.
Agora, Mantega tem uma chefe que entende e debate economia, tem Antonio Palocci, chefe da Casa Civil, tem Alexandre Tombini no BC - que não faz grande diferença em relação a Meirelles -, mas tem a oposição de técnicos no próprio Ministério da Fazenda.
Ajuste de verdade. Com a obrigação de enfrentar a pressão da inflação herdada do governo Lula, Mantega está sendo cobrado para fazer um ajuste fiscal de verdade, e não os R$ 50 bilhões anunciados na quarta-feira passada - quase 40% são cortes de emendas dos parlamentares.
Preservando todo o custeio em saúde, educação e assistência social, como prometido, o ajuste de Mantega só seria possível se não comprasse uma resma de papel para manter a máquina burocrática.
Parte da equipe da Fazenda avalia que os cortes prometidos e os que virão - se o ajuste fiscal for para valer - reduzirão os investimentos e afetarão a atividade econômica. Esses técnicos defendem um norte mais claro para a política econômica do governo Dilma.
Para esse grupo, o ministro estaria errando no tom ao apoiar a tese de que o aumento dos gastos públicos tem papel decisivo no aumento da demanda. A visão contraposta diz que a inflação em alta estaria mais associada à mudanças estruturais na economia brasileira, que ainda não foram atacadas.
Um exemplo seria a política de reajustes reais do salário mínimo - 53% no governo Lula -, que teve papel decisivo nos últimos anos para o aumento da distribuição de renda. Esses aumentos é que estariam agora puxando a inflação.
Ambiguidades. No cenário de debate contido, Mantega começa a amplificar publicamente as ambiguidades do discurso cotidiano. Em uma semana negocia com empresários a desoneração da folha de pagamentos e novas medidas de estímulo setorial. Dias depois, anuncia cortes no Orçamento e coloca em banho-maria a discussão sobre as desonerações.
Nos bastidores, alguns integrantes da equipe econômica dizem que para cada desoneração haverá uma nova tributação. É a política do cobertor curto: para abrir mão dos impostos sobre a folha de pagamentos terá de haver uma reposição da arrecadação. Traduzindo: liberar com uma mão e cobrar um novo tributo com a outra.
O ministro sabe que os empresários resistirão ao truque, mas, mesmo cultivando a contradição, também não quer abandonar a discussão, que é uma promessa de campanha de Dilma. Mantega mantém o debate na esperança que haja uma recuperação da arrecadação de tributos e ele possa emplacar uma solução negociada para a desoneração da folha.
"Gastador". Além do constrangimento no combate à inflação, Mantega carrega outro fardo: a desconfiança que o "ministro gastador", responsável por sancionar uma política de aumento recorde de despesas durante o governo Lula, levanta diante de tantas incertezas quanto à manutenção do superávit primário em níveis adequados para um País com dívida pública interna na casa do R$ 1,7 trilhão.
Mantega sempre combateu a fama de "gastador" com o discurso da garantia de cumprimento das metas fiscais. Usou e abusou dessa ambiguidade, mas no fim do ano se rendeu à realidade: só conseguiu fechar as contas públicas com o superávit prometido - 3,1% do PIB - recorrendo a artifícios contábeis. Fez 2,78% e precisou completar abatendo da meta despesas do PAC.
Essa contradição marcou a gestão de Mantega nos dois mandatos de Lula e o preço está sendo cobrado agora, no momento em que o aperto nos gastos públicos voltou para a lista de exigências dos agentes econômicos. O governo não está refém do mercado, mas o pessimismo em torno da inflação ganhou espaço. Mais que isso: preocupa o Planalto.
Diante de uma inflação em alta, a batalha do ministro, que precisa passar credibilidade, é para fazer de 2011 o ano de ajuste fiscal. E agora Mantega chama o controle de gastos de "consolidação fiscal".
Durante a campanha eleitoral, a então candidata Dilma Rousseff prometeu não fazer o ajuste fiscal em "hipótese nenhuma". Ao assumir, em janeiro, Dilma, sem querer dar um choque na taxa de juros para conter a alta da inflação, optou pelo ajuste.
Mudança de roteiro. A mudança nos roteiros e discursos da presidente da República e de Mantega é atribuída ao novo momento econômico. Depois da fase de aceleração do crescimento e, mais tarde, de combate à crise financeira, o ministro tem agora de colocar o País numa trajetória de expansão sustentável. O governo já sabe que vai demorar mais tempo para trazer a inflação para o centro da meta e que o ritmo de crescimento terá de desacelerar na direção do chamado PIB potencial (o quanto a economia tem condições de crescer sem comprometer o controle da inflação), estimado entre 4,5% e 5%.
Enquanto isso, um desconfortável Mantega exercita a prática do equilibrismo.
Entrevista:O Estado inteligente
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