Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 31, 2010

O preço da verborragia EDITORIAL O Estado de S.Paulo

31/07/10

Os iranianos que se manifestavam contra a fraude que permitiu a reeleição do presidente Mahmoud Ahmadinejad, em junho do ano passado, nada podiam fazer quando o presidente Lula comparou os seus protestos ao "choro de perdedor" dos torcedores de um time de futebol e reduziu os choques de rua em Teerã entre os opositores e as forças de repressão do regime a "apenas uma coisa entre flamenguistas e vascaínos".

Também os presos políticos cubanos não tinham como responder ao dirigente brasileiro quando, em março último, ele condenou a greve de fome que levou à morte o dissidente Orlando Zapata Tamoyo, por sinal na véspera de uma visita de Lula a Havana, onde considerou o seu sacrifício "um pretexto para liberar as pessoas" - e foi além. "Imagine", comparou, "se todos os bandidos presos em São Paulo entrarem em greve de fome e pedirem liberdade."
Muito menos poderia retrucar ao presidente a iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani, condenada à morte por apedrejamento por alegado adultério. Perguntado dias atrás sobre a campanha "Liga Lula" para que interceda pela sentenciada junto ao seu bom amigo Ahmadinejad, ele reagiu: "As pessoas têm leis. Se começarem a desobedecer as leis deles para atender o pedido de presidentes, daqui a pouco vira uma avacalhação."
Mas há quem possa dar-lhe o troco. Foi o que fez o presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, depois que um leviano e boquirroto Lula desdenhou do agravamento das tensões entre Bogotá e Caracas. O protoditador Hugo Chávez rompeu as relações da Venezuela com o país vizinho em represália à decisão colombiana de apresentar na OEA as provas da presença de 1.500 membros da organização narcoterrorista Farc em território venezuelano, obviamente sob a proteção do caudilho.
Lula, cuja primeira manifestação a respeito já tinha deixado claro o seu alinhamento automático com Chávez - "as Farc são um problema da Colômbia, e os problemas da Venezuela são da Venezuela", sofismou -, reincidiu na quarta-feira, véspera da reunião dos chanceleres da ineficaz União das Nações Sul-Americanas (Unasul), em Quito. O tema do encontro, que deu em nada, era o conflito político entre os dois países. "Falam em conflito, mas ainda não vi conflito", minimizou Lula. "Eu vi conflito verbal, que é o que mais ouvimos aqui nessa América Latina."
Equiparar a um bate-boca um problema dramático para a Colômbia, que passou 40 anos sob o terror das Farc antes de serem reduzidas à mínima expressão possível pela firmeza com que as enfrentou o presidente Uribe, foi nada menos do que um inconcebível insulto a uma nação e ao seu governante. Uribe, que difere de Lula por falar pouco e fazer muito, não poderia fingir que não ouviu a afronta.
Ele replicou com a mais dura mensagem já dirigida a um chefe de Estado brasileiro, até onde chega a memória. "O presidente da Colômbia", dispara a nota, "deplora que o presidente brasileiro, com quem temos cultivado as melhores relações, refira-se a nossa situação com a Venezuela como se fosse um caso pessoal." Uribe ainda o acusou de ignorar a ameaça que a presença das Farc na Venezuela representa "para a Colômbia e o continente".
Trata-se da primeira demonstração da perda de respeito por Lula no exterior - e ele só tem a culpar por isso a sua irreprimível logorreia. Não terminasse o seu mandato daqui a 5 meses, a erosão de sua imagem internacional só se intensificaria. Não seria de espantar se um dia alguém o admoestasse, como o rei da Espanha, Juan Carlos, fez com o bravateiro Chávez, perguntando-lhe: "Por qué no te callas?" Não bastasse a grosseria, Lula nada fez para assegurar aos colombianos de que poderia ser um intermediário isento entre Bogotá e Caracas.
Ele parece ecoar a batatada do chanceler venezuelano Nicolas Maduro, que falou de "um plano de paz sul-americano" para resolver "a questão de fundo" da Colômbia com as Farc. Ao que o seu colega colombiano Jaime Bermudez contrapôs ironicamente a ideia de um hipotético "plano de democracia para a Venezuela". Pensando bem, talvez fosse mesmo melhor Lula se ocupar do Irã em vez de fazer papelão perante os vizinhos do Brasil.

Guerrilhas e finanças :: Cesar Maia

FOLHA DE S. PAULO

A questão central das guerrilhas sempre foi a de financiamento e logística. Afinal, armas e munição não caem do céu. A apropriação em combate no máximo conta-se em unidades. Por ideologia, a atração de recursos humanos e a motivação dos guerrilheiros podem ser resolvidas. Medicamentos, comida e uniformes, até se conseguem em ação.

Nos anos 80 as guerrilhas de esquerda latino-americanas atingiam seu auge, inspiradas em Cuba, no Vietnã e na tomada de poder pelos sandinistas na Nicarágua em 1979. Tive uma longa conversa, em Manágua, em 2006, com Éden Pastora -o mítico Comandante Zero-, que tomou o Palácio Nacional em 1978.

Todo o encanto ideológico se desfez para ele no momento da ocupação do poder, quando as lideranças deram lugar aos parentes e amigos de Ortega, que governou até 1990 e voltou ao poder agora, num escabroso acordo.

O processo de paz com as guerrilhas de Guatemala, El Salvador e Honduras se deu na primeira metade dos anos 90, com celebração pela ONU.

A entrega de armas e a paz seriam inevitáveis depois da queda do Muro de Berlim em 1989, da implosão do Pacto de Varsóvia e da desintegração da União Soviética em 1991. Com o término do subsídio soviético ao açúcar cubano e sem as fontes de financiamento da Europa Oriental, as guerrilhas centro-americanas foram perdendo fôlego.

O processo de paz, liderado pela ONU, foi nesse sentido quase humanitário. A democratização veio com a superação das ditaduras de direita patrocinadas pela United Fruit e congêneres, cujo caso mais extravagante foi o da ditadura "hereditária" somozista na Nicarágua. As guerrilhas transformadas em partidos políticos.

Mas há exceções, ambas na América do Sul. As Farc e o ERP na Colômbia e o Sendero Luminoso no Peru. Nos três casos as fontes público-ideológicas de financiamento das guerrilhas foram substituídas por fontes "privadas".

Primeiro as extorsões mediante sequestro, que passaram a somar milhares por ano, alcançando centenas de milhões de dólares. E em seguida o tráfico de cocaína. Inicialmente com as guerrilhas cobrando pedágio para a passagem da cocaína. E em seguida com elas mesmas dando proteção à produção de coca e cobertura aos traficantes.

A liquidação dos grandes cartéis de cocaína deu curso a sua pulverização, facilitando o "trabalho" das guerrilhas. Substituídas as fontes de financiamento públicas por "privadas", o "ouro de Moscou" pela cocaína, as guerrilhas se consolidaram nos anos 90, especialmente as da Colômbia. Que ainda estão aí oxigenadas pela cocaína.


Cesar Maia escreve aos sábados nesta coluna.

Por que fogem? :: Míriam Leitão

O GLOBO

A democracia se encolhe quando em época de campanha os candidatos acham que têm mais a ganhar não falando. De que forma conhecê-los melhor senão através de debates, entrevistas? Dilma Rousseff tem usado a estratégia de fugir de qualquer ambiente que não controle, com pequenas experiências fora desse padrão. Agora, José Serra começou também a se negar a ir a debate. Que eleições teremos?

O debate na internet seria muito bom, se tivesse sido. Um deles, de alguns dos portais, estava marcado para a última segunda-feira e não aconteceu. Novas mídias, formato a ser ainda experimentado pelos jornalistas com mais liberdade e interatividade. Dilma fugiu. Serra fugiu em seguida alegando que Dilma fugiu. Erraram os dois. Antes, só Dilma estava dizendo não a tudo o que ela e sua assessoria entendiam que pudesse trazer algum risco. É um espanto que quem pensa em governar o Brasil tenha medo de uma entrevista ou um debate. Terão medo dos seus próprios pensamentos? De serem traídos por suas palavras? De revelarem o que realmente pensam e, assim, fugirem ao personagem inventado pelo marketing? A negativa é suspeita em si.
Quando um candidato está muito na frente, ele costuma evitar riscos. Mas no caso, os dois estão se alternando no primeiro lugar. O jogo ainda está sendo jogado. Serra estava indo a entrevistas e se expondo, mas no último debate decidiu errar junto com sua adversária. Toda entrevista é uma oportunidade de expor o pensamento. Isso só pode ajudar o eleitor e o próprio candidato. Todo debate é uma salutar forma de confrontar ideias e estilos. Serra vinha criticando Dilma por fugir de entrevistas e debates, mas agora o que tem a dizer? Dilma revela com sua fuga que tem medo de sua falta de experiência em situações de stress normais em campanhas eleitorais. E Serra? Ele costuma dizer que já fez nove campanhas eleitorais.

Desde 1998 tenho entrevistado, na Globonews, os candidatos a presidente. Em algumas dessas eleições houve até duas rodadas de entrevistas. Só uma vez, na primeira rodada de 2002, por volta de abril, ocorreu uma recusa: a de Anthony Garotinho. Na segunda vez ele foi. Todas as entrevistas, com todos os candidatos, foram esclarecedoras. Jornalista em época de eleição deve fazer perguntas sobre os pontos fracos, não esclarecidos, contradições dos candidatos. Por que seria diferente? Para questões que levantem a bola existe o horário eleitoral. O contraponto são as entrevistas e debates. Que credibilidade pode ter uma entrevista de Dilma Rousseff a uma TV do governo? Mas a essa, com tudo sob seu controle, a candidata compareceu. Na campanha deste ano, a Globonews convidou os três candidatos mais competitivos para serem entrevistados por mim. Os representantes de Dilma Rousseff foram para as reuniões preparatórias, mas ela não quis comparecer. Marina Silva e José Serra deram respostas esclarecedoras sobre vários pontos que levantei. Escrevi sobre as entrevistas nesse espaço de coluna. O trabalho ficou incompleto porque não pude perguntar nem escrever sobre o pensamento de Dilma Rousseff. Fiquei com a sensação de que ela acha que tinha mais a ganhar não sendo entrevistada do que sendo. O que é esquisito, para dizer o mínimo.

Se a recusa tivesse sido só para um programa poderia ter sido apenas uma escolha num conflito com outras atividades de campanha, ou outra qualquer questão subjetiva que se deve respeitar. Mas Dilma recusou também a ida à sabatina da "Folha de S.Paulo". Pior: tinha já previsto e marcado a ida, quando decidiu cancelar. Espantoso. Aos jornalistas, cabe apenas fazer perguntas, por mais difíceis que sejam são apenas perguntas. O candidato tem todo o tempo, e a chance, das respostas. O que Dilma Rousseff revelou, fugindo da sabatina tradicional da "Folha", sempre tão bem feita, tão esclarecedora, é que tem medo não das perguntas, mas de suas respostas.

Essas fugas iniciais não foram boas, mas ainda há vários outros eventos jornalísticos programados e sempre haverá tempo para o confronto das ideias, programas, projetos e estilos. Tomara que novas fugas não aconteçam. Ainda há chance de corrigir esse perigoso desvio das eleições de 2010. No Rio, o candidato que está na liderança nas intenções de votos para o governo, o atual governador Sérgio Cabral disse que mudou de ideia e vai comparecer aos debates. Ótimo. Os candidatos precisam falar e se expor aos diversos tipos de pressão, porque é assim a democracia. Essa campanha já tem uma enorme distorção provocada pela presença abusiva do presidente da República, em campanha aberta, usando toda a força da máquina, todos os eventos de governo, alterando cronogramas de eventos até de estatais como a Petrobras só para construir vitrines para sua candidata. Lula fala por ela. Isso desequilibra a disputa, não por ele ser algum super-homem, mas porque ele está no supercargo. Isso distorce o ritual da escolha que o eleitor precisa fazer serenamente e com o conhecimento sobre os candidatos em si.

Se a campanha for assim, com candidatos fugindo ao debate, a candidata governista tutelada pelo presidente da República, a máquina e os recursos públicos sendo usados de forma explícita, teremos um retrocesso político grave, seja qual for o resultado das eleições. Essas atitudes enfraquecem a busca de soluções, oportunidade aberta pelo processo eleitoral. No fim, encolhem a democracia.

MAURO CHAVES E o Sergipe, ministro?

O Estado de S.Paulo - 31/07/10

Com boa didática o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Ricardo Lewandowski, em entrevistas e palestras, tem explicado à sociedade brasileira a função e o sentido de nossa Justiça Eleitoral. Como não é comum em outros países do mundo uma Justiça exclusivamente eleitoral - a ponto de alguns a julgarem uma custosa inutilidade -, é com percuciência que Lewandowski argumenta em torno da necessidade histórica e da evolução política que tem significado - a partir da extinção das "eleições a bico de pena da República Velha" - a estrutura da Justiça Eleitoral em nosso país, bem como seus aperfeiçoamentos tecnológicos, que já são referência para as democracias do mundo contemporâneo.

O ministro também se tem pronunciado, positivamente, a respeito da importância da Lei da Ficha Limpa, sobre a qual prognosticou: "Pode ter a certeza de que a lei vai pegar." Tal posição, assumida por quem também é ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), diminui a preocupação quanto à possibilidade de essa lei poder ser derrubada em razão da prevalência de filigranas interpretativas, supostamente constitucionalistas. Afinal de contas, a esta altura do desprestígio de imagem dos "representantes do povo" (o que significa injustiça para com os muitos políticos honestos do Brasil), uma iniciativa popular, mobilizando cerca de 3 milhões de cidadãos, para exigir do Congresso Nacional mudança legislativa, capaz de dar mais correção e decência à seleção de pessoas que disputam mandatos legislativos ou governos, é uma raridade. É sinal de que as reservas de esperança quanto à vida pública nacional ainda não se esgotaram, mesmo que os jovens que adquiriram o direito de voto se mostrem cada vez menos interessados nisso.
Independentemente do mérito de qualquer processo de impugnação de candidaturas que aqui se mencione, há que registrar a grande quantidade de pessoas que não conseguiram obter registro - cerca de 3 mil - e, certamente, muito mais do que isso a daquelas que desistiram, antecipadamente, de se candidatar para evitar a vexatória rejeição. Aqueles com currículo mais assemelhado a um prontuário policial puseram, prudentemente, suas barbas de molho. E como disse uma procuradora eleitoral, com certeza já se passou uma peneira que livrou a sociedade brasileira de um batalhão de bandidos - embora as peneiras ainda deixem passar muita coisa indesejável.
Há certas expressões meio tolas que de vez em quando aparecem na mídia e são repetidas ad nauseam, sem contestação. Uma recente é a que fala dos riscos de "judicialização do processo eleitoral". Ora, se o que se refere à exigência do cumprimento da lei e ao exercício da tutela jurisdicional do Estado é "judicialização" - palavra, aliás, que não existe nos dicionários -, pode-se falar em judicialização de tudo: do xingamento no trânsito ao concurso acadêmico ou à confecção de apostilas sobre iluminuras chinesas. Então, condena-se o ato de "judicializar" as eleições, ou de deixar que a Justiça Eleitoral impeça que entrem ou continuem na política - com base na lei - aqueles que seriam barrados, por lacuna de idoneidade, para cargos de alta responsabilidade em quaisquer instituições públicas ou privadas do País.
Já era de esperar que as oligarquias regionais tentassem derrubar regras eleitorais que pusessem em risco a continuidade dos seus currais familiares e/ou de apaniguados, assim como se previa sua forte resistência, por meio da proliferação de recursos e chicanas, a algum rigor seletivo (ético, legal ou mesmo policial) no registro de candidaturas pela Justiça Eleitoral. Mas é aí que devem prevalecer a força, o sentido e o valor maior da Justiça Eleitoral brasileira, tal como consta nas mencionadas explanações de seu atual comandante. Pois, acima de tudo, são a isenção e a independência política da Justiça Eleitoral que geram a segurança da sociedade na democracia.
Nesse sentido, está parecendo muito esquisito o caso de Sergipe. Seu governador, apesar de sofrer na Justiça Eleitoral o processo ajuizado há mais tempo, ainda não foi julgado, estando a poucos meses de terminar o mandato e sendo candidato à reeleição. Acusado de, na condição de prefeito, ter desviado dinheiro público para animar sua candidatura a governador - conforme ampla matéria publicada pela revista Veja em 10 de maio de 2006 -, Marcelo Déda (PT) teve processo (provocado por um partido, mas assumido pelo Ministério Público) ajuizado no TSE em 20 de dezembro de 2006. Compare-se com a situação de outros governadores: Jackson Lago (PDT), do Maranhão, teve processo ajuizado no TSE em 23 de janeiro de 2007, já foi julgado e cassado; Marcelo Miranda (PMDB), do Tocantins, teve processo ajuizado no TSE em 2 de fevereiro de 2007, já foi julgado e cassado; Luiz Henrique da Silveira (PMDB), de Santa Catarina, teve processo ajuizado no TSE em 5 de fevereiro de 2007, já foi julgado e absolvido; Ivo Cassol (PPS), de Rondônia, teve processo ajuizado no TSE em 5 de março de março de 2007, já foi julgado e absolvido; Cássio Cunha Lima (PMDB), da Paraíba, teve processo ajuizado no TSE em 22 de novembro de 2007, já foi julgado e cassado.
Não vem ao caso aqui entrar no mérito das acusações contra Déda. A grande estranheza é o fato de os processos mais recentes dos outros governadores já terem sido julgados pelo TSE e o dele - o mais antigo - ainda não. Mas não será uma injustiça contra os eleitores sergipanos (inclusive os próprios petistas) o Tribunal Superior Eleitoral deixar de dizer, antes do fim de seu mandato e das eleições de outubro, se o governador Marcelo Déda é culpado ou inocente? E será que a ele mesmo isso não interessa?
JORNALISTA, ADVOGADO, ESCRITOR, ADMINISTRADOR DE EMPRESAS E PINTOR.

Alvaro Uribe tem razão EDITORIAL O GLOBO

31/07/10
Impregnado de soberba pelos altíssimos índices de popularidade ao longo de quase oito anos de governo, o presidente Lula tem dado inúmeras demonstrações de que pensa estar acima de tudo e de todos. A Justiça eleitoral que o diga. São conhecidas suas tiradas e improvisos em declarações oficiais e de campanha, bem-humoradas umas, exageradas algumas, despropositadas outras.

Ao longo do tempo, a reação passou a ser “mais uma do Lula”, e deixa para lá. Mas, na política externa, as declarações do presidente têm causado estragos. É o que aconteceu com afirmação sobre o incidente entre Venezuela e Colômbia. Lula disse não ver ali um confronto, apenas “um conflito verbal” e pediu paciência até a posse do presidente eleito da Colômbia, Juan Manuel Santos, dia 7.

Ele ignorou solenemente que o cerne do problema não é o presidente colombiano Alvaro Uribe, em despedida do cargo, nem oImpregnado de soberba pelos altíssimos índices de popularidade ao longo de quase oito anos de governo, o presidente Lula tem dado inúmeras demonstrações de que pensa estar acima de tudo e de todos. A Justiça eleitoral que o diga. São conhecidas suas tiradas e improvisos em declarações oficiais e de campanha, bem-humoradas umas, exageradas algumas, despropositadas outras.

Ao longo do tempo, a reação passou a ser “mais uma do Lula”, e deixa para lá. Mas, na política externa, as declarações do presidente têm causado estragos. É o que aconteceu com afirmação sobre o incidente entre Venezuela e Colômbia. Lula disse não ver ali um confronto, apenas “um conflito verbal” e pediu paciência até a posse do presidente eleito da Colômbia, Juan Manuel Santos, dia 7.

Ele ignorou solenemente que o cerne do problema não é o presidente colombiano Alvaro Uribe, em despedida do cargo, nem o presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Mas, sim, a presença de 1.500 homens das narcoguerrilhas colombianas Farc e ELN em território venezuelano, conforme alerta de Bogotá. Uribe denunciou o fato de o governo da Venezuela nada fazer para impedir que essas forças terroristas, que lutam para desestabilizar a Colômbia, permaneçam em solo venezuelano, fora do alcance do Exército colombiano. Em resposta, Chávez rompeu as relações com Bogotá.

O pior para o governo brasileiro é que Uribe criticou publicamente as afirmações, deplorando “que o presidente Lula se refira à nossa situação com a Venezuela como se fosse um caso de assuntos pessoais (...)”.

Neste final de mandato, o governo brasileiro acentuou o caráter ideológico de sua política externa, com péssimo resultado para a credibilidade do país, principalmente como interlocutor confiável na resolução das divergências entre os países sul-americanos. Nesse caminho, a diplomacia brasileira abre mão de parâmetros éticos quando finge não ver grave desrespeito aos direitos humanos em Cuba; quando finge ver “excesso de democracia” (nas palavras de Lula) na Venezuela; quando finge que as Farc não são uma organização narcoterrorista; quando finge acreditar nos propósitos nucleares da ditadura do Irã, quando deseja apenas espicaçar os Estados Unidos, e ainda faz vista grossa ao atropelamento dos direitos humanos por Ahmadinejad. Uma das características da diplomacia lulista foi ressuscitar o viés esquerdista e antiamericano de alguns líderes populistas do chamado Terceiro Mundo de 50 anos atrás. Um dos exemplos disso é a Unasul, organização criada para se contrapor à OEA, e que por isto exclui os Estados Unidos. Tão artificial é a ideia de que os problemas no continente possam passar ao largo de Washington que a própria reunião da Unasul sobre o conflito entre Venezuela e Colômbia foi esvaziada.

Ao criticar o comportamento brasileiro no episódio, o presidente Uribe chama indiretamente a atenção para o fato de, desde o primeiro mandato, Lula ter mantido uma relação próxima com a Venezuela e fria com a Colômbia. Pena, porque a primeira está cada vez mais próxima de uma ditadura efetiva — a chavista. E a segunda, apesar dos inúmeros problemas internos, tem conseguido aperfeiçoar sua democracia. O lulismo prefere más companhias, por simples viés ideológico.

MARIO CESAR FLORES SOMOS TODOS SIMPLESMENTE BRASILEIROS

O Estado de S.Paulo - 31/07/10

É justo proteger comunidades indígenas primitivas e isoladas, assegurando-lhes condições de vida pautadas por suas culturas ancestrais - comunidades que, sem atropelo, serão gradual e naturalmente assimiladas, como sempre aconteceu quando culturas de níveis distintos se põem em contato. Entretanto, em se tratando de índios aculturados - cocar e pintura para a TV... -, que se valem do apoio social público, embora mal atendidos, como grande parte do povo brasileiro, inseridos na moldura da civilização, usufruindo suas vantagens, sofrendo suas atribulações e até cometendo seus delitos (a exemplo da venda clandestina de madeira), é, no mínimo, discutível a prática de nossa penitência pela História, cuja lógica, se estendida ao mundo, subverteria radicalmente a ordem global construída ao longo de séculos.

A solução para esses índios não é a demarcação de áreas imensas, de que já não precisam. É a correta integração cidadã do índio ser humano brasileiro, em áreas adequadas à socioeconomia de cada comunidade, asseguradas as condições (inclusive espaço, se for o caso) para a prática da cultura ancestral espontaneamente mantida - portanto, não orquestrada para a TV. Os critérios demarcatórios hoje usados fariam sentido se o número de índios, o nomadismo e a vida de radical dependência da natureza ainda fossem os anteriores à inserção na civilização. Nas circunstâncias atuais eles precisam mais de políticas social e econômica eficazes e menos de política fundiária antropoideológica. Os índios beneficiários da polêmica demarcação Raposa-Serra do Sol (Roraima) usam seu imenso território ao estilo primitivo de seus ancestrais? Ou vivem atrelados à socioeconomia regional, ao apoio social e até ao financiamento público? Nesta última hipótese, há sentido na extensão definida por parâmetros não mais existentes?
As reivindicações desproporcionais às necessidades não exigidas pela vida selvagem e nômade, de populações indígenas maiores do que as atuais, são autenticamente indígenas? Os defensores das reservas-vastidões arriscariam perguntar a preferência dos índios, entre a vida do passado, dispersos e isolados em grandes extensões, e a integração na civilização, é claro que econômica e socialmente apoiada? Sobre essa dicotomia, uma observação animadora: os soldados do Exército na Amazônia são em grande número de etnias indígenas, familiarizados com as peculiaridades da região, dedicados e eficientes. Resposta de comandante de batalhão do interior da Amazônia, perguntado sobre os problemas indígenas locais: "Isso é coisa de São Paulo e Brasília, aqui índio quer é ver TV no quartel e ser cuidado pelo meu serviço médico..."
A natureza básica dessas observações se aplica, em menor dimensão, à questão quilombola, também ela com sabor de penitência (pela escravidão), que reemerge no século 21 o conceito de raça, enaltecido para justificar o colonialismo europeu na África. Com os índios e quilombolas - e paralelamente, sem conotação territorial, com o sistema de cotas nas universidades, recurso do Estado que abdicou do ensino fundamental e médio de qualidade - estamos criando distinções incoerentes com a miscigenação brasileira. Estamos inserindo um complicador na unidade nacional, já atribulada pela diversidade regional: a admissão de duas cidadanias, a cidadania brasileira e a cidadania-raça, negra ou índia, aplicada a índios e negros nascidos no Brasil, que deixam de ser simplesmente cidadãos brasileiros negros ou de etnias indígenas. A precedência entre a cidadania brasileira e a cidadania-raça, dependente do interesse conjuntural: ser índio ou o vago afrodescendente quando conveniente, ou ser brasileiro negro ou índio quando interessam os direitos da cidadania brasileira. É razoável a demarcação para índios vistos sob a perspectiva da cidadania-raça e, simultaneamente, Bolsa-Família e Pronaf para as mesmas pessoas, agora brasileiros índios?
À semelhança dos impérios do passado, não convém a um país grande e complexo a existência de critérios geradores de sentimentos raciais (ou religiosos...) indutores do solapamento da identidade nacional. Estamos "racializando" o País, criando condições potencialmente estimuladoras desse solapamento, gerando uma divisão em que, dependendo da conveniência, poderá prevalecer a pátria Brasil ou o indigenismo e a negritude. O Estado brasileiro vai acabar tendo de conciliar um "império republicano" de três cidadanias: a eurodescendente, a afrodescendente e a indígena. Em contenciosos que ponham em confronto a ideia nacional e a subnacional, qual prevalecerá? É um paradoxo procurar a união supranacional de base política e econômica (Mercosul, Unasul...) e simultaneamente facilitar a cisão subnacional de base racial!
Tolerâncias dessa natureza têm (no mundo e em todos os tempos) estimulado tensões e até secessões ou, ao menos, pretensões à autonomia singular. A adesão sem ressalvas à Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas (ONU) implicará risco de ser a unidade nacional tumultuada pela concepção desagregadora do nacionalismo étnico - que tumultuou a Europa na primeira metade do século 20 e ainda a perturba, talvez com o apoio da ONU e/ou de alguma versão século 21 da concepção do presidente Wilson de um século atrás, favorável à autodeterminação fundamentada no conceito da "nação" étnica e cultural.
Não será surpreendente se, algum dia, uma ONG vier a sugerir plebiscito sobre o status político-administrativo desejado por comunidade indígena travestida de "nação indígena" - já aventada, ainda que até agora sem repercussão significativa, na área Raposa-Serra do Sol -, obviamente restrito à comunidade: o "resto" do Brasil não opinaria. Plebiscito que, se pretendido para o País Basco, Tibete, Xinjiang e Curdistão, seria repelido decisivamente por Espanha, China, Turquia, Irã e Iraque.
ALMIRANTE DE ESQUADRA (REFORMADO)

ANTONIO CORRÊA DE LACERDA Por que interromper já a elevação dos juros

O ESTADO DE SÃO PAULO - 31/07/10



"Quando a realidade econômica muda, minha convicção acadêmica também muda." (John M. Keynes, 1883-1946)

A frase acima foi proferida por Keynes, considerado o mais brilhante economista do século 20, quando um interlocutor lhe questionou por que havia mudado de opinião a respeito de uma avaliação da economia e das medidas a serem adotadas. De fato, ao contrário das outras ciências nas quais fenômenos repetidos levam a uma mesma resposta, a Economia tem no seu bojo um grande grau de incerteza. Mesmo porque a realidade depende das reações das pessoas.

O episódio descrito ilustra o momento da economia brasileira. Na quinta-feira o Comitê de Política Monetária (Copom) divulgou a ata da reunião realizada na semana passada, em que decidiu por um aumento de 0,5 ponto porcentual (p.p.), elevando a Selic, a taxa básica de juros, para 10,75% ao ano.

Muitos questionaram a decisão e a divulgação da ata alimentou a discussão, visto que a maioria dos agentes do mercado financeiro esperava uma elevação de 0,75 p.p. Mais ainda, questionou-se a avaliação da situação da economia brasileira expressa na ata, que aponta menores riscos de um excesso de aquecimento da economia e menores riscos de aumento da inflação.

Menos mal que o Copom tenha mudado de opinião. Na verdade, para quem acompanha, como eu, por dever de ofício, o desenvolvimento da economia real não houve surpresa com o menor aumento, mesmo porque talvez nem fosse necessária elevação nenhuma na taxa de juros.

Como apontei em artigo anterior neste espaço (O mito do superaquecimento, 27/5), quando o Banco Central (BC) iniciou o processo de alta das taxas básicas de juros, o ritmo de crescimento da economia já era bastante inferior ao que apontavam os indicadores passados. O fim dos estímulos de redução de impostos em bens duráveis, assim como uma tendência ao esgotamento da ampliação do endividamento dos consumidores, por si sós já representavam importantes amortecedores do que aparentemente se mostrava como um crescimento muito elevado do consumo.

Vale ainda ressaltar que as comparações com o ano anterior tornavam os dados um tanto ilusórios, apontando um crescimento que, na verdade, decorria muito mais do efeito estatístico devido à base de comparação baixa, fortemente afetada pelos impactos da crise, principalmente no primeiro trimestre de 2009. Isso também apontava para um menor risco de pressão inflacionária de demanda. Houve uma elevação de inflação episódica no início do ano, mas decorrente de preços de alimentos e de serviços. Portanto, nada que exigisse uma elevação dos juros para desestimular a demanda e, com isso, reduzir o ímpeto inflacionário.

Apesar desses aspectos, o BC brasileiro já elevou em 2 p.p. a Selic, de 8,75% para 10,75% ao ano. Ao ampliar a diferença entre as taxas de juros domésticas e as internacionais, isso aumenta o espaço para arbitragem envolvendo a taxa de câmbio, o que traz enormes consequências negativas para a estrutura produtiva e de comércio exterior do País.

Juros mais altos também representam encarecimento expressivo do custo de financiamento da dívida pública. Dois pontos a mais na taxa básica representam um acréscimo de cerca de R$ 20 bilhões ao ano no custo da dívida.

Outro efeito importante que, ao encarecer o crédito e o financiamento, muitas vezes mais do que refrear o consumo, acaba desestimulando o investimento produtivo - mesmo porque se torna muito mais rentável, no curto prazo, aplicar no mercado financeiro do que investir na produção.

Não precisamos de juros ainda mais elevados, e o melhor a fazer seria interromper imediatamente a sua trajetória de elevação. Isso não vai remover os impactos já causados, mas vai evitar o agravamento das distorções decorrentes. Estarmos no topo do ranking dos países que praticam os maiores juros reais do planeta não faz parte de nossas ambições!

*ANTÔNIO CORRÊA DE LACERDA É ECONOMISTA, PROFESSOR DOUTOR DO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA PUC-SP.

sexta-feira, julho 30, 2010

Nelson Motta - O coronel e os babalaôs

O Globo

Dia e noite, minuto a minuto, são postadas na internet notícias do mundo inteiro, das mais dramáticas e trágicas às mais frívolas e bizarras. Os ficcionistas estão em pânico. É cada vez mais difícil criar histórias e personagens originais que possam surpreender e emocionar os leitores.

Que tal a americana que deu o seu bebê para adoção e, 14 anos depois, rastreou o filho em sites de relacionamento, e, sem dizer que era sua mãe, seduziu-o, comeu-o e foi presa? Quem acreditaria nesse dramalhão pornô? Mas é apenas um episódio de “a vida como ela é” na internet, que deixaria Nelson Rodrigues embasbacado.

Mesmo com as licenças do realismo fantástico latino-americano, é difícil criar uma ficção que supere o coronel boçal e paranóico que toma o poder na Venezuela, se acredita um novo Bolívar e quer libertar a América Latina do Império e torná-la uma imensa Cuba. Mas só consegue quebrar o seu país e fazer o mundo rir com suas bravatas.

No novo episódio, a pedido do companheiro Fidel, clarividentes babalaôs cubanos consultam os orixás e advertem o coronel que a única forma de reverter a sua queda de popularidade e a perda da maioria parlamentar nas próximas eleições é fazer um descarrego nos ossos de Simon Bolívar. O coronel manda exumar o Libertador, sob a suspeita de que ele não teria morrido de tuberculose, mas envenenado. Pelo Império, por supuesto.

Mas o Império tem mais o que fazer e ignora o coronel, que fica ainda mais furioso. Nem um ficcionista delirante, ou um babalaô doidão, ousaria imaginar os Estados Unidos invadindo a Venezuela e torrando bilhões de dólares e milhares de vidas para roubar o seu petróleo, só o corone “Mas não vamos estar sozinhos na luta, tenho certeza que Cuba e Nicarágua estarão conosco.” O Império vai tremer de medo, terão que reavaliar seus planos. O coronel ruge: “Pátria, socialismo ou morte!” Ao lado de Maradona, que, como ele, pensa com os pés, rompe relações com a Colômbia, mas são os venezuelanos que pagam a conta. E o coronel continua sua bizarra revolução, com o petróleo que vende ao seu maior inimigo. O Império paga em dia.

MÍRIAM LEITÃO Um tanto minério

O Globo - 30/07/2010

Em 2010, pela primeira vez um único produto vai superar a marca de US$ 20 bilhões nas nossas exportações: o minério de ferro. O preço subiu mais de 100% este ano. Com isso, o minério representará 12% de nossa balança comercial. Em mais de 30 anos, será também a primeira vez que as matérias-primas vão superar os manufaturados. Minério de ferro, petróleo e soja são 30% do que exportamos.

A alta do preço vai provocar um salto ornamental.

Do ano passado para este, as exportações de minério de ferro vão sair de US$ 13,2 bilhões para US$ 24 bilhões, segundo estimativas da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). Uma alta de 81%. No segundo trimestre, o minério dobrou de valor. O terceiro trimestre já começou com novo aumento de 35%. A AEB revisou o superávit da balança comercial de 2010: de US$ 12,2 bilhões para US$ 15,04 bilhões.

A alta tem vários efeitos.

Nem todos bons. O Brasil acaba voltando à primeira metade do século passado quando um produto se agigantou nas contas de comércio.

Naquela época, o café. O aumento no preço é resultado da demanda chinesa.

Em processo acelerado de urbanização, com fortes investimentos em infraestrutura, a China tornouse altamente dependente da importação de minério de ferro porque não tem mineral de boa qualidade. Diante da demanda, as três maiores mineradoras do mundo, Vale, BHP Bilinton e Rio Tinto, impuseram um novo sistema de reajustes às siderúrgicas, que agora acontecem de três em três meses. Até 2009, era uma vez por ano. No mercado, já se fala em reajustes mensais e até em negociações em bolsa, como acontece com outros minerais, como cobre e alumínio.

— A tendência é que o produto seja negociado em bolsa, com a criação de um preço de referência e um prêmio para o minério que tiver maior qualidade, como é o caso do produto de Carajás — explicou o economista da Link Investimentos Leonardo Alves.

O perfil de nossas exportações está mudando, com o aumento da participação dos produtos básicos (vejam no gráfico).

Em 1998, a exportação de matérias-primas representava 25% de tudo que o Brasil vendia; em 2010, a projeção é de que seja 43%.

Já a participação dos manufaturados caiu de 57% para 40%. Dos dez produtos que devem ser os mais vendidos este ano, nove são commodities. Dos 20, 13 são matérias-primas.

E olha que o Ministério do Desenvolvimento considera como produtos manufaturados itens como madeira compensada; suco de laranja não congelado; café solúvel; açúcar refinado: — Só no Brasil esses produtos são considerados manufaturados.

Em qualquer país desenvolvido, seriam produtos básicos ou semimanufaturados.

É um erro que nos acompanha desde o regime militar — explicou José Augusto de Castro, vicepresidente da AEB.

A entidade acha que isso é um problema. Não pelas boas vendas de commodities, mas porque teme a ausência de acordos bilaterais que abram mercado para produtos de maior valor agregado. A AEB alerta que o Brasil não reduziu seus custos de produção e lembra que o volume vendido não aumentou, apenas o preço. Qualquer mudança no instável mercado de commodities e a nossa balança será afetada.

“Registre-se que a elevação de preço não gera emprego, ao contrário de quantidade, principalmente quando se refere a produtos manufaturados”, escreveu a AEB em relatório.

A Abracex (Associação Brasileira de Comércio Exterior) lamenta o foco das exportações em matériasprimas.

Em análise intitulada “Onde está a política industrial?”, o presidente da entidade, Roberto Segatto, lista um longo dever de casa que ainda precisa ser feito: melhoria da infraestrutura aeroportuária e rodoviária; financiamento à micro e pequenas empresas; redução de carga tributária.

É da vocação do Brasil ser grande produtor de commodities, seja metálicas, seja agrícolas. Não é exportação de segunda categoria.

Mas o melhor seria se o país estivesse removendo os gargalos da infraestrutura, incentivando a inovação tecnológica e ampliando a diversidade das exportações.

Aumentam incertezas sobre Petrobras EDITORIAL O GLOBO

30/07/10
Prestes a quitar uma dívida de R$ 3,6 bilhões contraída junto à Caixa Econômica Federal em 2008, a Petrobras obteve, no mês passado, um novo financiamento, desta vez de R$ 2 bilhões, da mesma instituição financeira estatal.

É possível que as duas operações de crédito tenham relação entre si, mas é uma ilação, pois falta transparência nessas transações — não por acaso as ações da Petrobras passaram a refletir incertezas que o mercado acumula em relação à trajetória da principal empresa brasileira.

A Petrobras está capitaneando o maior programa de investimento da indústria de petróleo no mundo. Esse programa envolve enormes desafios na exploração e produção, no refino, no transporte, na geração de energia elétrica e na petroquímica. Para dar conta de todos, terá de superar obstáculos tecnológicos e precisará mobilizar recursos humanos e financeiros em dimensões sem preceveu dentes no setor.

Não fosse isso suficiente, o governo resolveu dar mais incumbências à Petrobras, que terá de se capitalizar, pois, nem que quisesse, a estatal não encontrará nos mercados financeiros respaldo para se endividar tão vultosamente. Maior acionista da Petrobras, o Tesouro não dispõe de caixa para integralizar em dinheiro sua parte no aumento de capital e, assim, o governo decidiu recorrer a uma transação inusitada: ou seja, participará com a entrega de reservas de petróleo e gás, equivalentes a cinco bilhões de barris, o que aumentaria de imediato em um terço as jazidas certificadas da estatal.

Esses reservatórios estão próximos a blocos onde já foram confirmadas grandes descobertas na camada do pré-sal na Bacia de Santos, como o campo de Tupi. Sob delegação da Agência Nacional do Petróleo (ANP), a atividade exploratória da Petrobras nessas áreas que serão cedidas pela União parece indicar ali a existência de reservatórios gigantes.

Porém, a mensuração dos cinco bilhões de barris depende de certificação de auditores independentes, o que exige tempo.

Enquanto isso, o programa de investimentos da Petrobras prossegue, demandando somas financeiras crescentes. Por mais que corra contra o tempo, a Petrobras tem dificuldade para montar uma operação de capitalização dessas dimensões na velocidade que precisa. Ainda mais que, por questão política, o governo embolou o calendário eleitoral com as polêmicas mudanças que resolpreceveu propor na lei do petróleo, atrelou tudo à capitalização da Petrobras.

No mínimo, criou-se uma grande confusão, que obriga a Petrobras a recorrer a financiamentos junto ao BNDES e também à Caixa Econômica Federal. Pode-se dizer que o BNDES tem afinidade com os investimentos em curso no setor de petróleo, mas esse não é o caso da Caixa Econômica Federal, que, embora atue como banco comercial, preferencialmente está voltada para financiamentos habitacionais e de infraestrutura urbana. Ou deveria estar.

Basta comparar o volume de crédito concedido à Petrobras com a carteira de empréstimos a projetos de saneamento básico (menos de R$ 2 bilhões este ano) para se concluir que há problema de foco e de transparência nessas operações, que acabam afetando a imagem da Petrobras e da CEF. Também aqui, o governo aplica a temerária regra de “os fins justificam os meios”.

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS Uma nova agenda de prioridades

FOLHA DE SÃO PAULO - 30/07/10


Lula intui que uma alta na inflação provocará uma revolta nas camadas mais populares da sociedade


EM NOSSO último encontro manifestei minhas preocupações com a agenda de prioridades de um novo governo do PT. O programa da candidata oficial vai certamente manter o rumo definido pelo presidente Lula nestes seus últimos anos de mandato. Embora o documento registrado na Justiça Eleitoral apresente sinais contraditórios, na questão econômica podemos visualizar as linhas principais de um eventual governo Dilma.
Devem ser mantidas as linhas básicas da política macroeconômica de Lula. Uma gestão monetária voltada para o controle da inflação dentro dos limites do sistema de metas, a geração de superavit fiscal primário que estabilize a relação dívida/PIB e uma flutuação suja da taxa de câmbio. Em relação a esse tripé, a candidata já manifestou várias vezes seu compromisso.
Nosso presidente, homem extremamente pragmático, sabe que o sucesso de seu governo está diretamente ligado à estabilidade de preços. Intui que uma alta na inflação provocará uma revolta nas camadas mais populares da sociedade. E certamente passou essa lição para Dilma Rousseff.
Mas, além desse tripé de prioridades macroeconômicas, o que temos hoje é uma política econômica baseada nos valores dos economistas que sempre representaram o núcleo duro do pensamento econômico do PT. Lula manteve essa divisão em seu governo e o sucesso dos últimos anos certamente reforçou a confiança de Dilma nesse modelo.
Mas esse raciocínio futebolístico tão a gosto de nosso presidente -não se mexe em time que está ganhando- traz sempre um grande perigo. Ele vale apenas se o contorno em que se realiza uma determinada estratégia não mudar de forma importante ao longo do tempo.
A simples manutenção da estabilidade econômica nos últimos anos foi suficiente para que nossa economia crescesse a taxas elevadas porque várias mudanças microeconômicas positivas, criadas pela estabilidade, empurraram-na para a frente. Vejamos alguns exemplos.
A confiança na moeda permitiu uma expansão vigorosa do crédito a empresas e a indivíduos. Antes do arranque da economia em 2005 o crédito total representava pouco mais de 20% do PIB; hoje representa 45%. No passado recente tínhamos uma economia fechada e uma política de aumento real dos salários levava sempre a um aumento da inflação e dos juros; hoje, com o aumento expressivo das importações, podemos esperar pelo aumento da capacidade produtiva e uma maior oferta de bens industriais sem que a inflação apareça.
A taxa de desemprego em 2005 superava 10%, o que permitiu um aumento expressivo do emprego sem a elevação do custo da mão de obra; agora, com uma taxa de desemprego de 7%, essa folga é muito menor e, em certos setores de mão de obra mais especializada, já ocorrem gargalos importantes.
Também nos primeiros anos da lua de mel de Lula nossa infraestrutura econômica não estava tão congestionada. Hoje os gargalos nos setores de transporte, portos e aeroportos provocam aumentos de custo e quedas de eficiência na logística de movimentação da nossa produção e que podem nos levar a uma situação crítica no próximo governo.
As indicações que temos hoje nas palavras e ações do governo Lula são todas no sentido de que a necessidade de uma mudança de agenda não foi ainda devidamente entendida. Um exemplo claro disso é essa questão do trem-bala que tratei em nosso último encontro. Mas outras manifestações de prioridades do governo e de sua candidata provam esse descompasso entre realidade da economia e ações do governo.
Em matéria recente a mídia trouxe a informação de que o BNDES já desembolsou mais de R$ 16 bilhões para apoiar dois frigoríficos nacionais em sua expansão no exterior. O objetivo desse programa é o de criar multinacionais brasileiras para competir em outros mercados. Mas, no setor de frigoríficos, em um mundo dominado pela tecnologia? Apenas uma leitura errada do mundo em que vivemos pode explicar tanto esforço por nada.

Controle de qualidade:: Dora Kramer

O ESTADO DE S. PAULO

Todo mundo fala de ficha limpa, ficha suja, a vida pregressa dos candidatos a deputado e senador caiu na boca do público e no momento está nas mãos dos Tribunais Regionais Eleitorais decidir sobre o destino de cerca de 3 mil pedidos de impugnação.

Em seguida será a vez de o Tribunal Superior Eleitoral examinar os recursos e logo o Supremo Tribunal Federal será chamado a se pronunciar sobre a constitucionalidade da lei de iniciativa popular aprovada pelo Congresso em maio, impondo como pré-requisito de elegibilidade a inexistência de sentenças condenatórias por tribunais.

Em toda parte se fala sobre a natureza das "fichas", menos na agenda dos candidatos à Presidência da República.

Quem em algum momento renunciou a mandato eletivo para escapar das punições legais e, assim, preservar os direitos políticos também fica inelegível.

Uma mudança e tanto nos meios e nos modos da política.

Se a lei for considerada constitucional - e tudo leva a crer que será, pois dos 11 quatro já se pronunciaram a favor -, o Brasil terá dado início a uma reforma "de base" na política. Ou seja, de dentro para fora (do Congresso) e de baixo para cima.

Ainda que a Justiça venha a demorar, o presidente do TSE, Ricardo Lewandowski, já alertou para a possibilidade de alguns perderem tempo e dinheiro insistindo em concorrer, pois mesmo eleitos os irregulares poderiam ficar sem os mandatos.

Não se trata de algo trivial, bem como não é corriqueira a mobilização de organizações não-governamentais e de entidades civis, como a Ordem dos Advogados e associações de magistrados na vigilância aos pretendentes a representantes populares no Poder Legislativo.

É o controle de qualidade possível.

A partir dele pode começar a acontecer uma transformação até de mentalidade. Firma-se o princípio de que gente suspeita não pode representar a população na Câmara e no Senado.

Há um consenso de que o eleitor deve fazer a sua parte na hora da escolha do candidato. É verdade, mas de qual eleitor falamos?

Por enquanto daquele bem informado, engajado e que acompanhou os lances da aprovação da lei.
O chamado "público em geral" é despertado para os temas que estão na pauta das candidaturas presidenciais, elas é que puxam o debate.

Só que os candidatos a presidente da República não parecem preocupados com isso.

Em tese deveriam ser eles os maiores interessados no assunto Congresso, já que um deles será eleito e terá como primeiro desafio firmar uma posição sobre a relação do Legislativo com o Executivo, há muito torta, promíscua, desarticulada, não republicana, pois há submissão e, portanto, subversão do princípio do equilíbrio entre os Poderes.

Mas passam ao largo dessa agenda. É de se perguntar se para eles as coisas estão bem assim ou se não pensam que um Parlamento melhor é possível.

Obreiro. Ciro Gomes anunciou que vai apoiar Dilma Rousseff porque essa é a decisão do seu partido, o PSB. Quando desistiu da candidatura à Presidência da República o fez em atendimento a uma decisão do partido. Contra a vontade.

Em cena. É a quinta vez que o venezuelano Hugo Chávez ameaça cortar a venda de petróleo para os Estados Unidos. Agora - careca de saber que isso não acontecerá - diz que cortará se a Colômbia atacar a Venezuela por influência dos EUA.

Exige gestos amistosos por parte do novo presidente colombiano, Juan Manuel Santos, cansado de saber que é exatamente isso que ocorrerá em seguida à posse, em 7 de agosto.

Apostas. Palpita o meio diplomático: se Dilma Rousseff ganhar a eleição, o ministro das Relações Exteriores será o embaixador Antonio Patriota; se o presidente eleito for José Serra, o embaixador Sérgio Amaral comandará o Itamaraty.

A farsa e a realidade :: Roberto Freire

BRASIL ECONÔMICO

Em seu primeiro mandato, logo após ser eleito, o atual governo, carente de um efetivo projeto de mudanças e de reformas estruturantes, adotou o "Fome Zero" como saída pela tangente de nossas dificuldades históricas, ao mesmo tempo que encontrava nessa jogada pirotécnica uma forma de mobilização da sociedade, sem alterar em nada seus fundamentos.

Hoje ninguém fala mais de "Fome Zero", muito menos do "Projeto do Primeiro Emprego", que durante muito tempo foi apresentado como capaz de enfrentar o desemprego crônico da juventude, até se descobrir que o segredo para superarmos esse desafio estava relacionado a uma educação de qualidade, que não é possível se resolver no quadro de políticas de governo, e sim de Estado.

O atual governo sofisticou seu repertório de criar um país de faz de conta, no qual atuava em benefício dos pobres, combatia a especulação financeira e enfrentava os gargalos do que se convencionou "custo Brasil", até a farsa ser desmontada pelos números aferidos por órgãos internacionais sobre nossa real condição econômica e social.

Assim, ficamos sabendo que depois de quase oito anos de governo, e de uma massiva campanha para nos convencer que este governo é o dos pobres, os dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) no que respeita o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) aponta nosso país em nono lugar dos mais desiguais da América Latina!

Quando comparamos a desigualdade da renda entre o trabalho e o capital é que podemos perceber que quase nada mudou em nosso país.

Na contramão do que aponta o governo e seus "novos horizontes". Como revelado por agencias da ONU, os juros, aluguéis e lucros foram os itens da renda brasileira que mais cresceram desde a última década, superando o rendimento dos trabalhadores, cristalizando a política de manutenção do status quão, ou do conservadorismo funcional que este governo representa.

O governo propala que transfere renda para os pobres, via Bolsa Família, que atende pouco mais de 12 milhões de famílias, algo em torno de R$ 13,1 bilhões.

Mas o que o governo não alardeia é que transferiu para os mais ricos, rentistas e bancos, na forma de juros pelos títulos públicos, no ano passado, algo em torno de R$ 380 bilhões!

Se nos detivermos nas reais condições de vida da esmagadora maioria de nosso povo, seja por meio das moradias atendidas com o saneamento básico, ou na qualidade do ensino público oferecido pelo Estado, ou no atendimento da saúde pública, perceberemos que o real significado da grandiloquente propaganda governamental que afirma ser o "Brasil um país de todos", na verdade é mais de uns que de outros.

A verdade é que os números recentes de nossa economia e de nossa trágica condição social estão muito longe da farsa edulcorada pela propaganda que move este governo.

O crescente endividamento das famílias, nosso perigoso déficit em conta corrente, o intermitente custo-Brasil estrangulando nossa capacidade competitiva é o verdadeiro legado que nos deixará o atual governo.


Roberto Freire é presidente do PPS

Remadores fora do ritmo Celso Ming


O Estado de S. Paulo - 30/07/2010


A ata do Copom divulgada quinta-feira não conseguiu desfazer o curto-circuito provocado pela sua guinada brusca na condução da política de juros.

Primeiro vamos falar do problema e, depois, das consequências. Dentro do regime de metas de inflação é essencial que as expectativas dos agentes econômicos (empresários, banqueiros, consultores) estejam alinhadas com as do Banco Central. É o que o presidente do Fed (o banco central americano), Ben Bernanke, chama de condução de um barco a remo com patrão. Os remadores coordenam os movimentos de acordo com as cantadas do patrão. É só assim que alcança eficiência no deslocamento do barco em direção à chegada.

Os dois principais documentos pelos quais o Banco Central martela as remadas do mercado são as atas do Copom (que saem oito dias depois de cada reunião) e o Relatório de Inflação (divulgado quatro vezes por ano). Ocorre que a ata da reunião anterior e o último Relatório de Inflação apontaram para a manutenção do aperto monetário. Quem leu esses documentos e ouviu as entrevistas dos diretores do Banco Central entendeu que o aperto dos juros seria mantido ou, até mesmo, intensificado. Mas a reunião do Copom do dia 23 mostrou que o Banco Central mudou sua política em direção à redução da dose dos juros básicos.

Quem foi surpreendido (e parece ter sido a maioria) ficou desarvorado. Houve quem criticasse o Banco Central pela condução esquizofrênica de sua política, que aponta para um lado e vai para o outro; por ter se tornado refém do jogo eleitoral; e por ter perdido, em final de governo, o que possuía de autonomia operacional

A explicação para o curto-circuito parece mais prosaica. É que, desta vez, em pouco mais de uma semana, as condições externas e internas mudaram drasticamente. A recuperação da economia dos países ricos foi revertida; Estados Unidos e Europa voltaram a mergulhar na crise; e Bernanke, em seu depoimento no Congresso americano, descreveu um quadro desolador a ponto de iniciar a preparação da opinião pública para novo despejo de recursos no mercado para evitar o abismo. No Brasil, muitos setores estão atolados em estoques; a atividade industrial está desacelerando; e os indicadores de preços projetam para este mês inflação negativa.

Tudo isso aconteceu quase de repente, sem dar tempo para reverter a formação das expectativas. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, bem que passou declarações um tanto cifradas na TV, pelas quais advertia que o Copom não toma decisões apenas com base no que já aconteceu, mas também em informações que ficam disponíveis somente no dia da reunião. No entanto, declarações à imprensa não têm o mesmo peso do que o que está escrito nos documentos oficiais.

A ata restringe-se a apontar o quadro que serviu de referência para a decisão. Em nenhum momento explica por que houve o curto-circuito no jogo das expectativas e, assim, os remadores trabalharam com velocidade diferente da que estava nas intenções das autoridades monetárias. Ficou a impressão que o Banco Central errou no diagnóstico anterior e que não foi capaz de reconhecer isso. Se tivesse dito que a realidade mudou em questão de dias sem ter dado tempo para preparar a opinião pública, não continuaria sendo alvo de tantas críticas. (Veja a Opinião.)

Opinião
Falha de comunicação. Se o Banco Central (BC) está convencido de que a boa comunicação com o público e a política de formação de expectativas são essenciais para a eficácia do regime de metas; e se sabe que a economia global opera em novo ritmo, sujeita a mudanças bruscas capazes de alterar a condução da política monetária em poucos dias, então, o atual sistema de comunicação do BC é inadequado.

Como mudar? Não pode a comunicação com o mercado e com os formadores de preços se limitar a dois documentos que nem sempre captam a volatilidade da economia: o Relatório de Inflação, que sai a cada três meses, e a ata do Copom, que sai apenas a cada 44 dias. Declarações informais feitas na TV podem ajudar, mas não têm a mesma força. Não são instrumentos eficientes para a condução das expectativas, especialmente quando o jogo muda de repente. Talvez a melhor maneira de responder a alterações assim sejam comunicados feitos por diretores em ocasiões especiais, no site do BC.

A política para a Petrobras -Adriano Pires


O Globo - 30/07/2010


A capitalização da Petrobras envolverá de US$ 50 a 60 bilhões, ou quase um terço do valor de mercado atual da empresa, e será, de longe, a maior já ocorrida no mercado brasileiro.

A capitalização é essencial para os investimentos de US$ 224 bilhões previstos para os próximos cinco anos no plano de negócios da empresa divulgado em 21 de junho sem incluir os investimentos nas áreas do pré-sal tratadas no projeto de lei que permite a capitalização através da cessão onerosa.

Com uma dívida total de R$ 100 bilhões, a estatal está próxima do seu limite máximo de endividamento. No final do ano passado, a taxa de alavancagem da empresa, dada pela relação entre a dívida líquida (R$ 71 bilhões) e o patrimônio líquido era de 31%, a maior desde 2004. Para manter a classificação de investment grade das agências classificadoras, a empresa deve manter a sua alavancagem abaixo do teto de 35%. Sem a capitalização, a captação de novos empréstimos comprometeria esta política e encareceria o próprio custo dos empréstimos.

A capitalização da Petrobras é uma operação financeira normal. A iniciativa do governo de angariar recursos para viabilizar sua participação na capitalização através da cessão onerosa de áreas petrolíferas ainda não concedidas, embora introduza mais um regime jurídico na exploração e produção de petróleo e gás natural no Brasil, é também justificável. Do ponto de vista políticoideológico, ao privilegiar a Petrobras na cessão onerosa de reservas, o governo demonstra a intenção de limitar a abertura do mercado de petróleo no país e de reduzir a participação dos minoritários no capital da estatal.

Não há impedimento para que a cessão onerosa fosse efetuada via leilão com a participação de outras empresas petrolíferas. As áreas em questão poderiam ser dividas em blocos viabilizando a entrada de um maior número de empresas.

Os recursos arrecadados no leilão seriam utilizados no aporte da União na capitalização da Petrobras. A Petrobras seria capitalizada com moeda corrente, reduzindo o custo financeiro de seus investimentos, que, de outra forma, serão efetuados através de novos empréstimos. O projeto preveria ainda que, em caso de participação e vitória da Petrobras na aquisição de direitos de blocos leiloados, a estatal os pagasse com títulos públicos e que estes títulos correspondessem a uma parcela do aporte do governo.

Na forma proposta, o projeto pode ainda facilitar o aumento da participação da União na Petrobras. Caso o governo estabeleça o preço do barril das reservas acima daquele visto como justo pelo mercado, os investidores minoritários terão pouco interesse na operação de capitalização, possibilitando ao governo exercer o direito à compra da sobra de novas ações não subscritas.

A fixação de um valor elevado para o barril das reservas cedidas pode também afetar os leilões das áreas do présal a serem exploradas sob o regime de partilha da produção, ao conduzirem o governo a estabelecer as condições de bônus de assinatura ou da sua parcela na partilha que não atraiam o interesse das petrolíferas privadas. Ocorreria assim mais uma oportunidade de a Petrobras aumentar sua hegemonia na exploração e produção no Brasil.

Apesar de o projeto se preocupar apenas com áreas do pré-sal sob o regime de cessão onerosa, a sua aprovação pode rebater no ritmo dos leilões de concessões de áreas do pós-sal e nos de acordos de partilha de produção.

Considerando a soma dos investimentos previstos no portfólio da Petrobras com os que terão que ser efetuados nas áreas cedidas, além da obrigatoriedade de participação mínima de 30% nas áreas do pré-sal exploradas sob o regime de partilha, a empresa pode não ter fôlego para disputar estes certames, levando ao adiamento.

Nunca foi segredo a rejeição do Partido dos Trabalhadores à abertura do mercado petrolífero brasileiro. Apesar de alguns membros do partido já reconhecerem as vantagens que a abertura trouxe para o fortalecimento do Petrobras, inclusive para permitir o seu uso como uma ferramenta política do governo, ainda há forte pressão contrária à participação das petrolíferas privadas, especialmente as estrangeiras.

Nesse sentido, o projeto pode representar um passo a mais nessa direção.

ADRIANO PIRES é diretor da organização não governamental do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

quinta-feira, julho 29, 2010

"Avacalhação"-Eliane Cantanhede





 

Folha de S Paulo

BRASÍLIA - De Lula, sobre a iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani, que já recebeu 99 chibatadas e foi condenada a ser apedrejada até a morte por adultério: "Eu, sinceramente, não acho que nenhuma mulher deveria ser apedrejada por conta de... ter, sabe, traição".
Só faltava achar que deveria...
E isso significa que ele vá atender à campanha na internet para interceder pela vida de Sakineh?
Resposta: "Um presidente da República não pode ficar na internet atendendo tudo que alguém pede de outro país. Veja, eu pedi pela francesa (...) e pelos americanos que estão lá, pedi para a Indonésia por um brasileiro, pedi para a Síria por quatro. Mas é preciso cuidado, porque as pessoas têm leis, as pessoas têm regras, as pessoas, sabe... Se começam a desobedecer as leis deles para atender o pedido de presidentes, vira uma avacalhação".
Então, entrar na contramão internacional e se meter com o regime Ahmadinejad num acordo que ninguém levou a sério, pode. Mas voltar para a mão certa e interceder a favor de uma pobre coitada ameaçada de uma morte medonha, "vira esculhambação"?
A declaração de Lula poderia ter sido só um escorregão, não fosse o precedente. Ele já desqualificou os manifestantes iranianos que denunciavam ao mundo fraudes na eleição de Ahmadinejad como "chororô de torcida de time perdedor", sem considerar que eles julgam sumariamente e matam os opositores sem dó nem piedade.
E no caso de Cuba? Não bastasse Lula às gargalhadas com os irmãos Castro no dia da morte do dissidente Orlando Zapata por greve de fome, depois ele comparou os que resistem à ditadura cubana a criminosos comuns no Brasil. Logo ele, que já foi perseguido por uma ditadura, teve amigos e companheiros presos, mortos e desaparecidos.
Nada disso combina com a emocionante biografia de Lula, muito menos com o Brasil que ele e todos nós queremos construir.

É uma ameaça: tente abrir uma empresa! CARLOS ALBERTO SARDENBERG

O Globo

Claro, você não pode abrir um estabelecimento sem a assistência e a fiscalização dos bombeiros. Também é claro que o Corpo de Bombeiros não vai fazer isso de graça. Quer dizer, já não é tão claro, porque pagamos impostos demais neste país, mas, enfim, vá lá.

Agora, qual o preço dessa atividade dos bombeiros? Dependeria, digamos, da qualidade dos serviços? Se for assim, então os melhores bombeiros do Brasil são os de Sergipe.

Lá, o empreendedor tem que pagar nada menos que R$ 2.442 para obter o competente alvará. No Acre é bem mais barato. Sai por apenas R$ 72. Como se explica? Duas possibilidades: ou os bombeiros do Acre são mais eficientes, de modo que conseguem fazer o mesmo serviço por menos dinheiro; ou fazem tudo de qualquer jeito, qualquer trocado está bem pago.

Visto de outro ângulo: será que o custo de operação dos bombeiros de Sergipe é tão elevado assim, de modo a justificar o alvará mais caro do Brasil? Ou seja, não tem critério algum. A definição do preço é totalmente arbitrária, dependendo de conveniências e necessidades locais.

E não é só nesse item. Claro que você não pode abrir um negócio de porte médio para grande sem um contrato. E como fazer isso sem um advogado? O cara é profissional, não vai trabalhar de graça. Quanto custa o serviço? A OAB fixa tabela mínima.

Em Santa Catarina, os advogados devem ser de primeira. Lá, o “visto”, como se diz, custa nada menos que R$ 2.681, o mais caro do país. Já na Paraíba, sai por apenas 200 reais, o mais barato. Terão os meios jurídicos nacionais percebido que as empresas registradas em Santa Catarina têm os melhores contratos do Brasil? Mas sabe se que a constituição de uma empresa média em Santa Catarina é a mais cara do Brasil. O custo é de R$ 4.432, isso se não for do ramo de alimentação, por exemplo. Aí, precisa do alvará sanitário. No Rio, isso custa um pouco mais de dois mil reais. Assim, abrir uma empresa sem alvará sanitário é mais caro em Santa Catarina. Com, fica mais caro no Rio, mais de cinco mil reais.

Segundo uma pesquisa nacional da Firjan, divulgada nesta semana, a abertura da empresa exige de 6 a 8 etapas burocráticas, o pagamento de 12 a 16 taxas, com 43 documentos.

Aí o empresário venceu todo esse caminho e começa a produzir. Agora é faturar e lucrar, certo? Nada disso.

Antes de vender, ele já está pagando impostos.

Digamos que tenha montado uma siderúrgica.

Sabem qual a tributação sobre a produção de aço? De 35% a 38% do custo total da operação, segundo um estudo do Ministério de Minas e Energia.

Pagar impostos não é simples. Dada a enorme complexidade de nosso sistema tributário, a empresa precisa de contadores, advogados, administradores — com seus computadores, sistemas e funcionários auxiliares, em instalações às vezes maiores que a fábrica.

Ou seja, tem o custo tributário e o

custo operacional do custo tributário.

E todas essas despesas feitas antes de faturar o primeiro centavo.

A Fiesp, em outro estudo divulgado nesta semana, calculou quanto as empresas brasileiras gastam com a burocracia a que são submetidas.

São nada menos que R$ 46,3 bilhões/ ano, equivalente a 1,5% do PIB.

Para comparar: os investimentos totais no Brasil chegam, na média recente, a 17% do PIB. Ou seja, a burocracia comeu nada menos que 10% disso. Ou ainda, as empresas gastam com burocracia três vezes mais do que gastam em pesquisa e desenvolvimento.

Isso em um país que precisa de mais investimentos e mais empresas privadas, que são a principal base do crescimento.

Mas, tudo bem. Todas as etapas foram vencidas, a empresa está lá funcionando, o produto é bom, vende bem, vida que segue. Segue? O administrador avisa que saiu uma nova regulamentação para marcar o ponto. Agora, toda empresa precisa ter uma máquina eletrônica que emite um recibo em papel com a hora de entrada e de saída do trabalhador.

Mais custos: com a nova máquina (pelo menos 4 mil reais) e com o papel dos recibos. Paciência, o diretor manda comprar o aparelho.

Não está disponível na praça. Talvez importando. (É como a cadeirinha de crianças para automóveis. A regra tornou-a obrigatória, mas não tinha no mercado).

Mas o bravo empresário importou a máquina, pagou ágio e está satisfeito com o rigor do controle de entrada e saída.

Está lá sossegado, achando que merece uma medalha ou um desconto nos impostos por cumprir tão bem a lei e as regras, quando aparece um outro fiscal. E essas tomadas que não foram substituídas? — Tomadas? — Ora, o senhor não sabe que saiu uma regra dizendo que todas as tomadas têm de ser brasileiras? — Como brasileiras? — É um modelo autêntico brasileiro, não tem igual em nenhum outro lugar, tem que trocar tudo.

— Caramba! O empresário ganha um prazo para trocar as tomadas, mas seu engenheiro eletricista diz que os aparelhos, internacionais, não são adequados à novas tomadas. Ora, compre adaptadores.

Não tem desse tipo na praça.

E depois reclamam quando ....

Bom, deixa pra lá.

MÍRIAM LEITÃO O esquecido

O Globo - 29/07/2010

Há um grande esquecido em todas as operações na telefonia brasileira: o usuário. Hoje, a Oi investe menos do que as empresas Telemar e Brasil Telecom investiam quando eram separadas.

O Brasil tem uma telefonia cujo serviço está se deteriorando, não tem cobertura de banda larga decente, e as telefônicas são campeãs de reclamação.

Os negócios anunciados ontem terão que ser submetidos à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

Hoje, as empresas entram com um pedido de anuência prévia na Agência.

A informação no órgão regulador é que a decisão será tomada olhando-se três critérios: qualidade do serviço, impacto na competição e interesse do usuário.

Mas tudo se passa no governo, e nas empresas privadas, como se o assunto não tivesse que passar pela Anatel. E tem. A Agência, se não quiser ser reduzida a um carimbador, terá que avaliar todos os negócios anunciados ontem dentro dessa perspectiva. Porque do governo já não se espera, a essa altura, que olhe o interesse público.

O governo só interfere em favor dos grupos empresariais.

Mudou o Plano Geral de Outorgas para permitir a compra da Brasil Telecom pela Telemar. Na época, o pretexto foi o de criar uma supertele de capital exclusivamente nacional, que agora será luso-brasileira.

Nada contra a empresa portuguesa, tudo contra esse delírio nacionalistóide de mudar regras de forma casuística, colocar dinheiro público, e financiar uma compra sem qualquer benefício palpável para o consumidor dos serviços.

A advogada especialista em telecomunicações Cláudia Domingues lembra que a compra da BrT pela Oi, em 2008, foi feita de forma tão apressada que a Oi não avaliou corretamente o passivo da BrT. Em janeiro deste ano, a empresa comunicou que o passivo, por conta de ações judiciais contra a BrT, não era de R$ 1,2 bilhão, mas R$ 2,5 bi. Um erro de análise de mais de um bilhão de reais. E um dos sócios é o BNDES.

— O mercado de telecomunicação no Brasil piorou muito desde essa operação.

Foi como se a Oi tivesse comprado uma fazenda sem contar quantos bois havia no pasto. Tudo foi feito apressadamente e por motivações políticas.

Ninguém pensa no bem do mercado. As empresas, por exemplo, não foram à Justiça contra a recriação da Telebras, que é claramente inconstitucional. Com a operação de hoje envolvendo Telefónica, Portugal Telecom, Vivo e Oi, percebe-se o porquê. Havia outros interesses em jogo — disse.

Antes da compra da Brasil Telecom pela Telemar, a soma do que as duas investiam nos serviços de telefonia fixa e celular era muito maior do que investe agora. Ela ficou sem capacidade de investir e o consumidor pagou a conta. Na opinião dos especialistas, isso é claramente incompatível com a necessidade de expansão e da melhoria da qualidade dos serviços em sua área de atuação. No final do ano, a Oi apresentou prejuízo e uma dívida de R$ 21,8 bilhões. Analistas de mercado acham que a entrada da Portugal Telecom ajudará a reduzir essa dívida e aumentar a capacidade de investimento.

Mesmo assim, a ação da empresa despencou 16% ontem. No caso da Vivo, a operação melhora a governança porque a Telefónica aumentará seu controle sobre a empresa, mas a empresa terá que investir muito dinheiro na compra da participação.

A venda da parte da Portugal Telecom na Vivo e o uso dos recursos na compra de uma participação de 22% na Oi têm o lado bom de mostrar que o mercado brasileiro é atraente. As empresas brigaram durante meses para garantir o direito de crescer por aqui.

Hoje, 15% da receita da Telefónica vem do Brasil. Após este negócio, será 20%, tornando o país o segundo maior mercado da empresa, depois da própria Espanha.

O problema é que o governo tem adiado questões regulatórias, como, por exemplo, a licitação da Banda H. No mercado, se diz com todas as letras que as questões que antes eram resolvidas pela agência agora nem mesmo são da alçada do Ministério das Comunicações.

As empresas vão direto à Casa Civil.

O caso da Oi foi espantoso em todas as etapas. Foi assinado um memorando de entendimento para a compra da Brasil Telecom antes mesmo de o governo mudar o Plano de Outorgas. Criou-se um fato consumado antes de a Anatel decidir. Tudo foi financiado pelo BNDES e Banco do Brasil, que deram empréstimos à empresa para que ela pudesse pagar aos acionistas controladores da Brasil Telecom.

Mesmo endividada e sem capacidade de ampliar seus investimentos, a empresa usou o fato de que era a tal “supertele nacional” para se oferecer como a operadora do Plano Nacional de Banda Larga. A proposta foi defendida pelo próprio Luiz Eduardo Falco, presidente da Oi, numa reunião na Casa Civil, em abril. O argumento usado por Falco é que a Oi teria direito a isso por ser quase empresa estatal, tem 49% do capital do BNDES e dos fundos de pensão de estatais.

Nas mudanças nas telecomunicações têm ocorrido favorecimento, preferência por uma empresa por motivos pouco transparentes, interferência direta do governo em negócios de uma empresa privada e com capital em bolsa.

O Brasil está em pleno retrocesso. Na reta final do governo Lula está havendo uma fúria estatizante, concessões descabidas a empresas privadas, distribuição de benesses a escolhidos, interferência indevida em assuntos de empresas de capital aberto. Com Brasília, a Oi tem linha direta; com seus minoritários, ela não consegue se entender. Eles já recusaram três vezes propostas da empresa e o processo, do ponto de vista societário, está incompleto.

De pai para filho - Dora Kramer

O Estado de S. Paulo - 29/07/2010

Obrigada a pedir demissão há dois anos da chefia da Secretaria da Igualdade Racial por causa dos gastos indevidos com o cartão corporativo a que tinha direito, Matilde Ribeiro muito provavelmente teria dificuldades para se eleger síndica de condomínio.



Mas, como segunda suplente do candidato a senador pelo PC do B de São Paulo, Netinho de Paula, com alguma sorte poderá vir ser senadora da República.

A suplência ao Senado é hoje um dos melhores negócios no mercado da política: quem tem dinheiro (muito), bom parentesco ou é bem relacionado no meio não precisa de voto para chegar ao que outrora já foi tido como a representação do Paraíso na terra.

Atualmente um tanto desmoralizado, mas ainda promete. Afora o renome, espaço na tribuna, microfones da Voz do Brasil, o salário, a verba indenizatória, passagens aéreas, carro, casa, assessoria e estrutura à disposição, há toda uma gama de benefícios tais como plano de saúde para o resto da vida caso o suplente assuma por um período de seis meses. Em mandato de oito anos, convenhamos, não é difícil.

Na atual legislatura mais ou menos 20% do Senado é ocupado por substitutos.

O suplente sempre foi, e continua sendo, um familiar, um financiador de campanha, um amigo, um funcionário, um correligionário ou um "sem tempo" como o presidente do PT, José Eduardo Dutra.

Ele é suplente do senador candidato à reeleição Antonio Carlos Valadares, do PSB de Sergipe. Dutra tem votos ? ou pelo menos teve quando foi senador em legislatura anterior ?, mas está sem tempo de fazer campanha porque é um dos coordenadores da campanha de Dilma Rousseff.

Antonio Palocci também é. Como Dutra desistiu da candidatura parlamentar para cuidar da presidencial, como o colega também teve oferta de ser suplente de senador. Não aceitou ou o PT não achou conveniente.

Mas, de todo modo, não trilhou esse atalho. José Eduardo Dutra encontrou uma maneira de conciliar mandato com ausência de delegação popular.

O único pré-requisito necessário é a unção do titular. Assim Edison Lobão repetirá a indicação do filho ? "senador" enquanto o pai ocupou a pasta de Minas e Energia ?, o ex-governador do Amazonas Eduardo Braga pôs na suplência a mulher, Sandra.

Mão Santa trocou a mulher Adalgisa pela filha Cassandra, o ex-governador da Paraíba Cássio Cunha Lima indicou o tio, o ex-governador do Tocantins Marcelo Miranda escolheu o pai e o ex-governador de Rondônia Ivo Cassol também nomeou o pai.

Os dois primeiros foram cassados pela Justiça Eleitoral e o terceiro renunciou em vias de.

Em abril de 2008 a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou emenda constitucional do senador Demóstenes Torres proibindo a indicação de parentes para a suplência. A ideia inicial era acabar com os suplentes ou fazer com que tivessem a legitimidade do voto.

O colegiado da CCJ não aceitou, manteve a figura do suplente que em caso de vacância assume até a eleição de um novo titular na eleição mais próxima. Mesmo desfigurado o projeto está na Mesa sem chance de ser votado.

Ao calejado leitor nem é preciso explicar a razão.

Prato típico. Até o fim da tarde de ontem eram oito os candidatos impedidos de concorrer às eleições pelos Tribunais Regionais Eleitorais de seus Estados, com base na Lei da Ficha Limpa.

Três são do Espírito Santo, três de Minas Gerais, um de Santa Catarina e um do Ceará.

Contrastando, o TRE do Maranhão autorizou quatro candidatos ? entre eles, José Sarney Filho ? a concorrer, argumentando que a lei não vale para condenações anteriores à sua aprovação, exatamente o oposto do que decidiu o Tribunal Superior Eleitoral.

O Ministério Público vai recorrer e, mantida a posição anterior, o TSE deve derrubar.

É de se perguntar: então para que o vexame, só para parecer que o Judiciário maranhense está submetido aos interesses do clã Sarney?

Linha justa. A política anda precisando de um Zico que chame o esquadrão aos costumes.

As apostas no câmbio - Celso Ming

O Estado de S. Paulo - 29/07/2010


Mais do que torcida, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, vai fazendo o que pode para empurrar o Banco Central a colocar em marcha operações cujo objetivo é aumentar a cotação do dólar no câmbio interno (desvalorização do real).
Trata-se da volta de leilões de contratos de swap reverso de câmbio. Essa expressão é bem mais fácil de entender do que parece para os leigos em finanças. Nesse caso, o Banco Central venderia contratos de dólares para entrega futura. Quem ficar com os títulos não tem de correr o risco cambial, que é o risco de queda ainda maior do preço da moeda estrangeira. Teria como rendimento os juros de mercado.
Antes de tudo, é preciso dizer qual é o problema da hora e, então, apontar o jogo de cada parte e as consequências.
Desde 2004, o Banco Central compra e vende moeda estrangeira no mercado interno (mais compra do que vende) com o duplo objetivo de formar reservas e de impedir bruscas flutuações das cotações. Em geral, o Banco Central não deixa nem sobrar nem faltar dólares. Neste ano, no entanto, acontece uma anomalia. De janeiro até agora, comprou nada menos que US$ 14 bilhões acima do fluxo líquido de moeda estrangeira. Apesar dessa operação firme de compra, as cotações do dólar não param de cair. Na outra ponta dessa corda estão os bancos com posições vendidas líquidas de US$ 13 bilhões no mercado à vista e de quase US$ 9 bilhões no mercado futuro.
Ou seja, os bancos estão apostando pesado na queda das cotações do dólar, provavelmente porque esperam que, em setembro, entrem cerca de US$ 20 bilhões correspondentes à subscrição já programada de ações novas da Petrobrás.
Essa posição vendida dos bancos preocupa o Banco Central porque distorce o jogo do câmbio e o comércio exterior. Os bancos praticamente não detêm mais estoques de moeda estrangeira para financiar exportações. O ministro Guido Mantega, por sua vez, está preocupado com o crescimento do rombo das contas externas. Ele gostaria muito de que o real se desvalorizasse, não apenas para estimular exportações e inibir importações, mas também para convencer os exportadores a trazer de volta ao Brasil alguma coisa entre US$ 15 bilhões e US$ 30 bilhões que eles mantêm depositados no exterior.
A retomada dos leilões de swaps reversos de câmbio viria com o objetivo de desmontar a posição excessivamente vendida dos bancos. Por enquanto, o Banco Central não passou das ameaças da retomada dessas operações destinadas a virar o jogo. Aparentemente, reluta em mergulhar de cabeça nessas águas porque poderia provocar em alguns bancos excessivamente expostos a posições vendidas no câmbio o mesmo efeito que em 2008 apanhou os grupos Sadia e Votorantim, que estavam pesadamente na aposta errada quando a crise puxou para cima as cotações do dólar.


Há uma conclusão (e lição) a tirar dessa situação. De repente, a economia brasileira ficou tão grande que operações de US$ 20 bilhões ou mais (como a que fará parte da esperada capitalização da Petrobrás) se tornaram comuns. A expectativa da entrada desses recursos já é suficientemente forte para provocar distorções no mercado interno de câmbio. Apenas um expressivo aumento da corrente de comércio exterior (exportações mais importações), que possa tornar relativamente menor o peso das operações financeiras com moeda estrangeira, parece capaz de reduzir esse impacto.

Brasileira até janeiro
O presidente Lula garantiu ontem que a Oi continuaria sendo brasileira. "Enquanto eu for presidente, a Oi continuará sendo uma empresa nacional", disse. Para quem está desinformado ou distraído: Lula deixará de ser presidente em cinco meses.

Portuguesa com certeza
A portuguesa da gema Portugal Telecom não comprou apenas 22,4% da Oi. Comprou também 35% das controladoras da Oi, a LF Tel (grupo Jereissati) e AG Telecom Participações (grupo Andrade Gutierrez).

Poder de veto
Mais ainda, arrancou direitos especiais nas decisões dessas duas acionistas da Oi. Entre os direitos estão o poder de veto e o poder de deliberação sobre questões importantes.


Veta quem pode

Ora, quem tem poder de veto e poder de deliberação sobre questões importantes nas empresas que controlam a Oi, controla a Oi. Ou essa lógica não vale para as empresas de Portugal?

Agricultura, um modelo Alberto Tamer

O Estado de S. Paulo - 29/07/2010


A agricultura brasileira pode ser chamada de "essa desconhecida". As atenções estão voltadas para a indústria, que fraqueja, e para outros setores, mas é a agricultura que tem evitado explosões inflacionarias e sustentado o crescimento econômico, principalmente nos anos de crise.
Um fato importante, diria mesmo, importantíssimo ao qual se dá pouco destaque: é também um modelo em que o setor privado responde por "toda" produção e comercialização no País. Tem o apoio técnico do governo, sim, pelo excelente trabalho realizado pela Embrapa, tem financiamento, mas não conta com a proteção dos escandalosos subsídios oferecidos pelos Estados Unidos e a União Europeia aos seus agricultores. Mesmo assim, os americanos estão perdendo terreno para o agronegócio brasileiro no mercado mundial. E repito, todos eles privados, multinacionais ou não.
Eis um modelo a seguir O Estado participa também por meio de um Ministério da Agricultura eficiente, que completa 150 anos, observa e age nas emergência, socorre os que precisam, estimula a agricultura familiar, mas fica distante. Não se mete nas decisões do que plantar, produzir e exportar. O mercado é que decide. A agricultura brasileira não precisa de estatais. Não quer intromissão do Estado.
Esse é um modelo de convivência entre Estado e setor privado que deveria ser estudado pelos dois candidatos a presidência, para que não inventem mais empresas estatais como se está fazendo hoje.
Mas a agricultura é isso mesmo? Sei que é essa a pergunta que o leitor deve estar fazendo. A resposta é sim. E baseada não só em dados do IBGE, mas também do governo americano. Mesmo sem subsídios, o Brasil é hoje o terceiro maior exportador de alimentos do mundo. Segundo dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), o Brasil é líder na produção e exportação de açúcar, café em grãos e suco de laranja. Além disso, é o primeiro exportador mundial de carne bovina, tabaco, álcool etílico e carne de frango.
Ocupa a vice-liderança na produção e exportação de soja em grãos (atrás apenas dos EUA. É o terceiro maior exportador mundial de milho e o quarto de carne suína. O Brasil depende hoje da importação de trigo, que somou apenas US$ 1,2 bilhão em 2009, e alguns outros derivados, além de cevada e arroz. As exportações do agronegócio, em 2009, totalizaram US$ 64,75 bilhões, representando nada menos que 42,5% das vendas externas. As importações foram de apenas US$ 9,8 bilhões, o que significa um superávit de US$ 54, 9 bilhões. Sustentou a balança comercial.
O que exportamos e para quem O complexo soja lidera (farelo, óleo e grãos); representou 26% das vendas. Seguem as carnes (bovina, aves e suína), que foram responsáveis por 18% das vendas externas do agronegócio. O complexo sucroalcooleiro (açúcar e etanol) respondeu por 15% das exportações agropecuárias.
A China vem se consolidando, há dois anos, como o principal país comprador de produtos do agronegócio brasileiro. Absorveu no ano passado 13,77% das vendas externas. Os chineses compraram quase US$ 9 bilhões. Vale destacar que o Brasil exporta para cerca de 200 países.
Com 7,67% na participação das vendas externas do agronegócio, os Países Baixos estão em segundo lugar, representando nada menos que US$ 5 bilhões. Mas é importante registrar que representa a importação da Europa, pois é na pequena Holanda que está localizado o importante Porto de Roterdã.
E os americanos? São grandes produtores e exportadores e importam do Brasil apenas US$ 4,5 bilhões. Nada mais de 7% das nossas vendas do setor. Os Estados Unidos lutam com o Brasil na OMC, nas falidas negociações de Doha, porque querem exportar mais produtos agrícolas a preços subsidiados. Mesmo assim, sozinhos, ainda compram quase o mesmo que os 27 países da União Europeia juntos. Mas será que vai dar para sustentar esse ritmo de exportações e ainda atender, neste ano, ao aumento da demanda interna por alimentos? Vai dar sim. É um assunto tão importante e vital para a economia brasileira, que vamos destinar uma segunda coluna para ele.
Uma sugestão Por que os professores de escolas e faculdades não pedem aos estudantes, neste início de semestre, trabalhos sobre a importância da agricultura brasileira no País e no mundo mostrando os pontos altos e baixos de uma realidade nacional quase esquecida e que só se lembra mesmo quando o Ministério completa 150 anos?

Apagão aéreo na Copa?: Josef Barat


O Estado de S. Paulo - 29/07/2010

Neste mês foram instalados, por iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Juizados Especiais Cíveis nos aeroportos mais movimentados do País. Diante da percepção do crescente descontentamento dos usuários do transporte aéreo e, provavelmente, vislumbrando o risco de um novo "apagão aéreo", o CNJ decidiu repetir a experiência de 2007/2008. Naquela ocasião, diante do caos que se abateu sobre o setor aéreo, o Judiciário instalou unidades de conciliação nesses aeroportos, o que ajudou a aliviar muitos dos efeitos da crise. O CNJ mostra-se ciente de que os problemas do transporte aéreo não dizem respeito só às companhias aéreas, uma vez que determinou também a instalação de Juizados Especiais Federais, competentes para intermediar conflitos relacionados à Infraero, à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), à Polícia Federal e à Receita Federal.


Dada a fragilidade da memória nacional, cabe lembrar que o "apagão aéreo", ocorrido no decorrer de 2006/2007, teve origem numa conjunção de fatores. Inédito na história da aviação civil brasileira, o caos evidenciou: a ausência de políticas públicas consistentes; a falta de planejamento para o sistema aéreo; os graves problemas de gestão aeroportuária; a fragilidade institucional; e as notórias deficiências físicas e operacionais que existiam nas infraestruturas aeroportuária e aeronáutica do País. O crescimento persistente da demanda por voos domésticos e internacionais em porcentuais acima de dois dígitos esbarrou nos fatores apontados. Tratando-se de um sistema complexo e altamente integrado, a limitação de capacidade em cada um dos segmentos interferiu no desempenho dos demais, tornando as responsabilidades difusas.

O conflito entre demanda crescente, de um lado, e aeroportos com notórias deficiências de pistas, pátios, terminais e equipamentos, de outro, já era perceptível. De início, a crise da Varig agravou o desequilíbrio entre demanda e oferta, já que as soluções encaminhadas por meio do processo de recuperação judicial só geraram mais problemas ao criar uma reserva de mercado intocável. Por determinação judicial, não foi possível redistribuir horários e slots autorizados para a Varig (e por ela não utilizados).

Em seguida, o acidente com a aeronave da Gol trouxe à luz o problema das carências da infraestrutura aeronáutica. As operações aéreas foram agravadas sobremaneira por uma reação descomedida dos controladores de voo e falhas do controle do espaço aéreo (operação-padrão, sequenciamentos desnecessários, falhas de equipamentos de comunicação, radar e falta de pessoal). Por fim, o acidente com a aeronave da TAM gerou compreensivelmente grave comoção nacional, que, todavia, foi explorada pelo governo no sentido de desviar as atenções dos verdadeiros problemas infraestruturais e de planejamento e gestão existentes no setor aéreo.

De lá para cá o mundo girou, a Lusitana rodou e o fato é que perdura uma contradição. Qual seja a de um sistema em que, de um lado, empresas aéreas passaram a operar com níveis elevados de produtividade (em aeroportos aglutinadores), buscando atender a uma demanda em crescimento acelerado, e, de outro, infraestruturas com graves limitações físicas, operacionais e de gestão. Continua-se sem políticas e diretrizes claras e consistentes para o setor aéreo, sem planejamento sistêmico, com papéis institucionais frágeis e investimentos dispersos e sem foco de prioridades. Para agravar, Guarulhos, Congonhas, Brasília e Manaus estão operando próximo do limite das suas capacidades.

Portanto, pode-se dizer que o risco de um "apagão" continua latente e deverá aumentar com o crescimento da demanda em decorrência da boa fase da economia. A iniciativa do CNJ mostra que há algo de muito errado na gestão dos aeroportos brasileiros. Basta fazer um voo regular para constatar o sofrimento com o tempo gasto com atrasos de voos, troca de locais de embarque, desembaraço de bagagem, informações desencontradas, etc. É esse o ambiente que queremos para a Copa?

PRESIDENTE DO CONSELHO DE DESENVOLVIMENTO DAS CIDADES DA FEDERAÇÃO DO COMÉRCIO DE BENS, SERVIÇOS E TURISMO DE SÃO PAULO, FOI DIRETOR DA ANACN

quarta-feira, julho 28, 2010

Miriam Leitão Refazer o erro

O Globo
O governo Lula resolveu repetir erros velhíssimos como a ideia de que o Estado deve decidir que empresas e setores precisam ser grandes. A notícia de que R$ 18,5 bi foram dados ao setor frigorífico ou a reportagem da “Época” sobre os benefícios fiscais direcionados a algumas obras recriam instrumentos que criaram no passado inúmeras distorções, prejuízos e estão na raiz do processo inflacionário
O cemitério dos ex-campeões nacionais ou a ala das empresas moribundas estão cheios dessa suposta boa intenção de que se investe agora o BNDES. O banco derrama dinheiro público em determinados setores e empresas. Essa ideia velha, e já comprovadamente errada, é a de que se o Estado der muitos empréstimos subsidiados e incentivos fiscais a determinadas empresas escolhidas, elas serão fortes e vão liderar o desenvolvimento nacional.

O economista Marcelo de Paiva Abreu lembra a lista de empresas mortas ou moribundas criadas exatamente neste tipo de proposta. A Coalbra faria álcool de madeira.

A Caraiba Metais acabou tendo que ser estatizada.

A Cobrasma seria a grande líder brasileira. Enfim, inúmeras.

— Em 1975, o BNDES criou três empresas com o objetivo específico de comprar ações de empresas privadas: a Embramec, Fibase e Ibrasa. A Embramec, por exemplo, tinha o objetivo de fortalecer as empresas de bens de capital comprando ações, a Fibase fazia o mesmo com o setor de insumos básicos. Tudo isso provocou um enorme prejuízo ao país, já queimamos os dedos. Houve também incentivos para o setor bélico, com a Engesa.

Fizemos até um tanque, o Osório, que pelos planos seria o grande tanque do Oriente Médio e que foi um grande fracasso. Podese argumentar que a Embraer foi um sucesso, mas antes ela fracassou e teve que receber novas injeções de recursos públicos — lembra Marcelo.

O “Estadão” fez a conta completa do que temos dado aqui na coluna com espanto: até agora, o BNDES já concentrou R$ 18,5 bilhões em empréstimos e participações societárias no setor de frigoríficos. E mais: escolhe alguns e recusa outros. O mais beneficiado é o JBS Friboi.

Do Independência, como já disse, o banco comprou ações, deu empréstimo numa operação total de R$ 450 milhões, e logo depois ele faliu.

Na reportagem da última edição da “Época” — cuja leitura recomendo — a jornalista Isabel Clemente analisou 324 obras do PAC que estão recebendo benefícios fiscais do Reidi (Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura).

As obras enquadradas não pagam PIS/Cofins. Foram encontradas várias irregularidades.

A ideia era atrair capital privado para investimento em infraestrutura, mas foi concedido até para obras que já estavam em andamento, como a Usina de Estreito. O benefício tem que ser suspenso dez dias após o fim do projeto, mas a revista encontrou várias obras encerradas há muito tempo que continuam enquadradas no benefício fiscal.

Tem que ser para o projeto em si e está sendo dado até para atividades de manutenção como troca de poste. O ministro Márcio Zimmermann admitiu o erro em um desses casos, e uma semana depois mudou de ideia. Enfim, a reportagem não deixa dúvidas de que está sendo recriado no Brasil o velho balcão de favores criado no governo militar e contra o qual se lutou tanto durante anos. Nesse balcão, algumas empresas, por razões sempre obscuras, conseguiam, de burocratas, vantagens fiscais que suas concorrentes não conseguiam. Criou-se uma enorme rede de burocracia, relações promíscuas, favores escusos, distorção.

É um risco e um retrocesso retomar esse caminho que só serviu no passado para criar empresas dependentes químicas do Estado, burocratas com poderes indevidos, privilégios que concentraram renda e muita corrupção.

Por que errar erro tão velho e tão comprovadamente distorsivo? Quando os privilegiados quebravam, a dívida era estatizada e muitos deles continuavam ricos. Foi assim que o Brasil foi alimentando o processo inflacionário.

Não é a única causa, mas certamente está na raiz do processo que inchou de forma descontrolada os gastos públicos e concentrou renda.

— Não é o caso de ser purista. Há momentos e situações que podem haver subsídios, como, por exemplo, o incentivo ao investimento na inovação tecnológica. A concessão generalizada e sem critério, em vez de estimular, inibe o desenvolvimento tecnológico. Se os benefícios vão ser distribuídos indiscriminadamente, para que fazer o esforço de inovação? — pergunta Marcelo de Paiva Abreu.

Os benefícios fiscais do Reidi são perigosos porque são nebulosos em si e, além disso, são distribuídos de forma obscura.

— São criticáveis em princípio e ainda têm problemas de implementação.

Nós estamos ressuscitando instrumentos que deram errado sem ao menos fazer um estudo dos nossos erros — disse o economista.

Há outro efeito que já vimos acontecer, empresas super protegidas e aduladas por recursos públicos não se firmam, pelo contrário, passam a depender eternamente dos mesmos favores.

— O risco é de criar uma indústria eternamente infantil — disse.

Com incentivos fiscais e dinheiro barato está se fazendo também uma grande cooptação do setor empresarial.

Quem não é beneficiado, tem esperança de ser. Mas o processo é insustentável a longo prazo.

Isso já vimos e nos custou muito caro.

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