O GLOBO - 04/07/10
Alguém precisa avisar ao presidente Lula, ao Congresso, à oposição que o mundo não acaba em 2010. As decisões tomadas, os projetos apresentados têm um alto poder corrosivo do que se conquistou nas últimas décadas. O presidente Lula quebra regras eleitorais com desenvoltura, o Congresso apresenta propostas que comprometem a estabilidade fiscal. Tudo pelas eleições.
O país recomeçará no ano que vem tendo que lidar com as sequelas do ano de 2010. O presidente Lula, pelo visto, concluiu que sua estratégia de afrontar as regras eleitorais é um mal necessário.
Até aqui, pode até dizer que o mal feito compensa, porque sua candidata deu um salto nas pesquisas, e ele tem “apenas” seis multas que certamente ficarão para as calendas. Lula deve pensar: o que são seis multas se o importante é garantir a eleição da sua candidata, pela qual ele já disse a diversos interlocutores que está disposto a fazer “tudo”? O “tudo” do presidente Lula ameaça a democracia.
Hoje, ameaças à democracia não são mais ações dos quartéis. Esse é um tempo superado. Agora, o risco é de se avacalharem regras com o desrespeito continuado.
Que ninguém se engane com o bom comportamento dos últimos dias. A estratégia do presidente é ele ficar quieto no período de Copa do Mundo e voltar à carga nos próximos meses.
Tudo está sendo usado: as cerimônias governamentais, as estatais, as datas comemorativas. Pessoas de diversos escalões estão sendo instadas a se manifestarem a favor de Dilma. O governo só faz campanha. O presidente nestes três meses finais está disposto a ignorar os limites impostos pela lei eleitoral, como o fez nos meses anteriores ao início oficial da campanha.
Quem vive no Rio acompanhou uma atitude assim nos governos Garotinho. O GLOBO fez um trabalho sério e determinado para mostrar o que hoje a Justiça Eleitoral reconhece como “abuso de poder” dos que estavam no governo.
O que Lula tem feito não tem outro nome. A única dúvida é se em algum momento a Justiça terá força para mostrar isso.
No Congresso, o que se faz é uma distribuição irresponsável de benesses que custarão caro aos cofres públicos caso sejam aprovadas. Como o “Estado de S. Paulo” publicou esta semana, os parlamentares estão tentando duas linhas de ataques aos cofres públicos: primeiro, restabelecer a aposentadoria integral de juízes, procuradores, defensores públicos e talvez de delegados; segundo, cancelar 55 mil aposentadorias incentivadas do setor público e recontratar 40 mil que saíram das estatais.
As mudanças nas regras de aposentadoria do setor público foram alteradas no começo do governo Lula.
Então quem as ataca agora é o PSDB. Ataca como se os tucanos não tivessem governado o país e constatado que as projeções das contas da Previdência no regime geral, e da pública, ameaçam o Tesouro.
O Brasil ainda não encontrou a fórmula para conviver com os cada vez mais explosivos números da Previdência. No caso dessa proposta, é uma concessão a um grupo que já está numa posição muito alta em termos de valores de aposentadoria, como alertou o economista do Ipea Marcelo Caetano.
Os senadores tucanos Eduardo Azeredo, autor da proposta, e Marconi Perillo, relator na Comissão de Constituição e Justiça da Proposta de Emenda Constitucional, deveriam conversar com ex-ministros da Previdência do governo Fernando Henrique para saber se tem cabimento uma proposta dessas. A Previdência tem sido fonte de reprodução de desigualdades, tem um inescapável desafio de lidar com uma população envelhecendo. O assunto exige mais responsabilidade dos parlamentares, mas está sendo usado como arma eleitoreira.
Como as demissões incentivadas no governo e nas estatais ocorreram no período Fernando Henrique, neste caso quem as ataca é a base do governo atual. Dois projetos da base governista querem cancelar demissões feitas dentro de regras, com a concordância de quem saiu e com grandes compensações financeiras, no único esforço já feito para diminuir o inchaço do setor público. O governo Lula inchou de novo a máquina e agora sua base no Congresso quer pôr de volta nas empresas e no governo mais de 100 mil pessoas quem saíram há 14 anos.
Os dois projetos, o dos tucanos atacando uma reforma do governo Lula e o dos governistas atacando um ajuste feito no governo Fernando Henrique, criam despesas permanentes e dão vantagens pontuais a grupos que já as têm. São retrocessos perigosos e caros. Tramitam no Congresso tendo a boa vontade de políticos que em período eleitoral querem fazer agrados mesmo que isso contribua no futuro para ameaçar a solvência das contas públicas. O curioso é que todos os candidatos à presidente prometem reduzir a carga tributária enquanto suas bases encomendam mais gastos que serão cobertos, se aprovados, pelos bolsos dos brasileiros.
Nas últimas duas décadas e meia, o Brasil consolidou a democracia e a estabilidade econômica. Nesta eleição, os políticos que nos governam ameaçam as duas conquistas.
O Congresso, com propostas que criam gastos permanentes; o presidente Lula e as autoridades do Executivo, com o uso abusivo da máquina pública em campanha eleitoral. O uso do governo desequilibra a disputa, favorece um dos candidatos em eventos em que há recursos públicos, abusa do poder conferido aos governantes. A democracia se fortalece com o respeito às regras. O desrespeito a ameaça.
O país recomeçará no ano que vem tendo que lidar com as sequelas do ano de 2010. O presidente Lula, pelo visto, concluiu que sua estratégia de afrontar as regras eleitorais é um mal necessário.
Até aqui, pode até dizer que o mal feito compensa, porque sua candidata deu um salto nas pesquisas, e ele tem “apenas” seis multas que certamente ficarão para as calendas. Lula deve pensar: o que são seis multas se o importante é garantir a eleição da sua candidata, pela qual ele já disse a diversos interlocutores que está disposto a fazer “tudo”? O “tudo” do presidente Lula ameaça a democracia.
Hoje, ameaças à democracia não são mais ações dos quartéis. Esse é um tempo superado. Agora, o risco é de se avacalharem regras com o desrespeito continuado.
Que ninguém se engane com o bom comportamento dos últimos dias. A estratégia do presidente é ele ficar quieto no período de Copa do Mundo e voltar à carga nos próximos meses.
Tudo está sendo usado: as cerimônias governamentais, as estatais, as datas comemorativas. Pessoas de diversos escalões estão sendo instadas a se manifestarem a favor de Dilma. O governo só faz campanha. O presidente nestes três meses finais está disposto a ignorar os limites impostos pela lei eleitoral, como o fez nos meses anteriores ao início oficial da campanha.
Quem vive no Rio acompanhou uma atitude assim nos governos Garotinho. O GLOBO fez um trabalho sério e determinado para mostrar o que hoje a Justiça Eleitoral reconhece como “abuso de poder” dos que estavam no governo.
O que Lula tem feito não tem outro nome. A única dúvida é se em algum momento a Justiça terá força para mostrar isso.
No Congresso, o que se faz é uma distribuição irresponsável de benesses que custarão caro aos cofres públicos caso sejam aprovadas. Como o “Estado de S. Paulo” publicou esta semana, os parlamentares estão tentando duas linhas de ataques aos cofres públicos: primeiro, restabelecer a aposentadoria integral de juízes, procuradores, defensores públicos e talvez de delegados; segundo, cancelar 55 mil aposentadorias incentivadas do setor público e recontratar 40 mil que saíram das estatais.
As mudanças nas regras de aposentadoria do setor público foram alteradas no começo do governo Lula.
Então quem as ataca agora é o PSDB. Ataca como se os tucanos não tivessem governado o país e constatado que as projeções das contas da Previdência no regime geral, e da pública, ameaçam o Tesouro.
O Brasil ainda não encontrou a fórmula para conviver com os cada vez mais explosivos números da Previdência. No caso dessa proposta, é uma concessão a um grupo que já está numa posição muito alta em termos de valores de aposentadoria, como alertou o economista do Ipea Marcelo Caetano.
Os senadores tucanos Eduardo Azeredo, autor da proposta, e Marconi Perillo, relator na Comissão de Constituição e Justiça da Proposta de Emenda Constitucional, deveriam conversar com ex-ministros da Previdência do governo Fernando Henrique para saber se tem cabimento uma proposta dessas. A Previdência tem sido fonte de reprodução de desigualdades, tem um inescapável desafio de lidar com uma população envelhecendo. O assunto exige mais responsabilidade dos parlamentares, mas está sendo usado como arma eleitoreira.
Como as demissões incentivadas no governo e nas estatais ocorreram no período Fernando Henrique, neste caso quem as ataca é a base do governo atual. Dois projetos da base governista querem cancelar demissões feitas dentro de regras, com a concordância de quem saiu e com grandes compensações financeiras, no único esforço já feito para diminuir o inchaço do setor público. O governo Lula inchou de novo a máquina e agora sua base no Congresso quer pôr de volta nas empresas e no governo mais de 100 mil pessoas quem saíram há 14 anos.
Os dois projetos, o dos tucanos atacando uma reforma do governo Lula e o dos governistas atacando um ajuste feito no governo Fernando Henrique, criam despesas permanentes e dão vantagens pontuais a grupos que já as têm. São retrocessos perigosos e caros. Tramitam no Congresso tendo a boa vontade de políticos que em período eleitoral querem fazer agrados mesmo que isso contribua no futuro para ameaçar a solvência das contas públicas. O curioso é que todos os candidatos à presidente prometem reduzir a carga tributária enquanto suas bases encomendam mais gastos que serão cobertos, se aprovados, pelos bolsos dos brasileiros.
Nas últimas duas décadas e meia, o Brasil consolidou a democracia e a estabilidade econômica. Nesta eleição, os políticos que nos governam ameaçam as duas conquistas.
O Congresso, com propostas que criam gastos permanentes; o presidente Lula e as autoridades do Executivo, com o uso abusivo da máquina pública em campanha eleitoral. O uso do governo desequilibra a disputa, favorece um dos candidatos em eventos em que há recursos públicos, abusa do poder conferido aos governantes. A democracia se fortalece com o respeito às regras. O desrespeito a ameaça.