Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, janeiro 02, 2009

Míriam Leitão Como reagir?

O governo acertou ao liberar compulsórios, ao atuar no câmbio de forma parcimoniosa, ao não combater a desvalorização do real. É o que pensam os economistas Edmar Bacha e Ilan Goldfajn, os dois organizadores do livro eletrônico da Casa das Garças “Como reagir à crise”. Apesar de todo o cenário cinzento para 2009, eles acham que o Brasil pode se fortalecer ao fim dessa crise.

O livro foi organizado em 20 dias. Tem o sabor do trabalho instantâneo: são artigos curtos e enfocam os vários desafios da política econômica. Tem também as inevitáveis controvérsias entre os autores. Entrevistei os dois organizadores no programa de ontem da Globonews. Para ler o livro, basta entrar em www.iepecdg.com. O programa repete hoje, às 8h30 e às 16h30.

Os juros devem começar a cair em janeiro, acredita Ilan. Ele tem uma previsão até otimista, perto de outras do mercado, sobre o crescimento do Brasil. Pensa que pode ficar entre 2% e 3%, mas alerta que este começo de ano será de muita notícia ruim, vinda lá de fora e até daqui de dentro. A crise é global, e afeta todos os países, mas isso não significa, diz ele, que o país não possa pensar como reagir.

“A ideia que o livro passa é que a crise é séria, profunda, mas temporária. O cuidado deve ser o de não adotar medidas excepcionais de caráter permanente, que não permitam a recuperação do Brasil mais adiante”, alertou Bacha.

Ilan passa a mesma ideia de que a melhor forma de reagir à crise é evitando erros. “Se o Brasil sair da crise menos afetado, se não fizer besteiras, pode se fortalecer como destino de capitais”, disse Ilan.

A ideia é que, somando-se todos os acertos passados – a manutenção da estabilidade de preços, do câmbio flutuante, da autonomia do Banco Central – a acertos presentes, o país pode passar por esta crise mantendo sua imagem de país previsível e com potencial de crescimento. Sendo assim, ele se firmaria como a potência emergente, o que significa fazer parte do clube dos Brics.

Por falar em Brics, Bacha enfatizou que o Brasil acertou ao deixar o câmbio se desvalorizar, ao contrário da Rússia, que tem tentado evitar a queda do rublo inutilmente. “O Brasil está usando os benefícios do câmbio flutuante. A desvalorização é uma proteção para a economia brasileira. Se o capital tentar sair, a porta é estreita, o capital sai, mas sai encolhido, e o nosso passivo diminui. Desta forma, o Brasil não financia a fuga de capitais, quando deixa depreciar.”

Nem todos pensam assim no livro. Gustavo Franco chega a dizer que a economia que “não” tem estabilidade é aquela em que a moeda se desvaloriza 45% em pouco mais de um mês. Há também a preocupação com o excesso de volatilidade cambial – não a desvalorização em si, mas a instabilidade das cotações, que provoca várias perturbações na economia, inclusive a dificuldade de formação de preços.

“De fato, isso é um problema, os empresários me perguntam sempre qual é o câmbio em 2009. Tudo depende dos preços das commodities, do nível de atividade mundial. A faixa hoje está entre R$ 2 e R$ 2,70. Mas a vantagem é que o Brasil já desvalorizou 40%, não vai ser possível a todas as moedas esse nível de desvalorização”, disse Ilan. Ele acredita que a alta do dólar poderá ter um efeito positivo sobre a economia este ano.

Um problema que o país terá que enfrentar em 2009 é a queda de arrecadação, e num contexto em que o governo desperdiçou o melhor momento para ajustar as contas. Quando a arrecadação estava aumentando, o governo não apenas manteve o crescimento das despesas acima do crescimento do PIB, como comprometeu-se com gastos com funcionalismo para os próximos anos. Por isso, Bacha considera que aquele remédio número um de todas as receitas do mundo para este momento, que é aumento dos gastos públicos, não pode ser indicado para o Brasil. Ilan acha que a grande dúvida em relação à política econômica é a fiscal.

“A arrecadação terá uma queda acentuada. Itens que davam grande retorno, como ganhos na bolsa, consumo, que rendiam dinheiro para os cofres públicos, não vão acontecer. A dúvida é para onde vai a meta de superávit primário, se o governo vai reduzir ou simplesmente não cumpri-la.”

Esse é o nó da questão no Brasil. Todo mundo, inclusive o FMI, recomenda estímulos fiscais. Mas no caso brasileiro, eles teriam que ser aumento de investimento. O país tem demonstrado pouca capacidade de investir e muita facilidade em aumentar gastos de custeio.

A recessão americana encomendada, diz Bacha, será de 1% a 2% do PIB. “O último trimestre de 2008 terá uma queda estimada em 5%, anualizada. No primeiro trimestre de 2009, o PIB americano também vai cair. A grande dúvida é o que acontece daí pra frente.”

No livro, o economista Chico Lopes estima que a recessão americana pode ter uma duração de 32 meses, sendo que ele toma como partida o começo de 2008. Bacha diz que, pelos últimos números, ela pode ter mesmo uma duração mais prolongada, que entre em 2010.

“Foram previstos números ruins para setembro e eles foram piores. Novas previsões ainda mais negativas para outubro e, de novo, os números foram piores. Está difícil prever”, admite.

Com Leonardo Zanelli

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