Entrevista:O Estado inteligente

sábado, janeiro 24, 2009

BNDES Mais 100 bilhões de reais para crédito às empresas

Saída de emergência

Com injeção extra de 100 bilhões de reais, o BNDES
surge como salvador de empresas em épocas de crise.
Pode funcionar, mas por muito pouco tempo


Lucila Soares

Davilym Dourado/Valor/Folha Imagem

LUCIANO COUTINHO, do BNDES: "O mercado vai retomar seu lugar"


Ao longo de seus 57 anos de existência, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) desempenhou papéis antagônicos. Financiou projetos de infraestrutura e viabilizou a criação de grandes e bem-sucedidas companhias brasileiras, como a Embraer. Patrocinou o atraso e a ineficiência como "hospital de empresas". Foi fundamental no processo de privatização iniciado nos anos 1990. Agora, com um reforço de caixa de 100 bilhões de reais em recursos do Tesouro Nacional, entra em 2009 com orçamento de 166 bilhões de reais e surge com a missão de salvar os investimentos das empresas no cenário de escassez de crédito provocado pela crise mundial. Esse montante de recursos, dos quais cerca de 20 bilhões de reais deverão ser destinados à Petrobras, é quase o dobro dos 91,5 bilhões de reais desembolsados pelo banco em 2008. Ao anunciá-lo, na quinta-feira, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, informou que os financiamentos serão condicionados à criação de empregos. E pôs em alerta os críticos do papel que os bancos públicos têm desempenhado na economia brasileira.

A nova investidura do BNDES tem virtudes e embute alguns riscos. O primeiro é o de desviar a atenção dos reais problemas estruturais do país. Essa montanha de dinheiro, apesar de permitir um bem-vindo alívio financeiro, não significa melhora real na vida das empresas. Elas se beneficiariam muito mais de medidas que vêm sendo sistematicamente adiadas, como a redução da carga tributária e trabalhista, além da queda nos juros básicos e de mercado. "A injeção de recursos nas empresas via BNDES vai estimular a economia, mas o governo perderá uma oportunidade histórica de trabalhar com juros mais próximos ao padrão internacional", diz o economista Armando Castelar, analista da Gávea Investimentos. O segundo é o risco fiscal da transferência de recursos do Tesouro para o banco. Pelas contas de Castelar, os 100 bilhões de reais equivalem a 9% de todo o crédito disponível no país e serão aplicados sem a transparência nem o controle externo que deveriam pautar a utilização de dinheiro público. A falta de transparência nos critérios é a principal crítica que se faz ao apoio que o BNDES deu à compra da Aracruz pelo Grupo Votorantim. Anunciada na semana passada, a operação resultará na maior empresa do mundo no setor de celulose e contará com recursos do banco de até 2,4 bilhões de reais. Mas envolve duas companhias que tiveram grandes prejuízos em 2008 no especulativo mercado de derivativos cambiais – o que remete inevitavelmente ao velho hospital. José Júlio Senna, sócio da MCM Consultores, um dos críticos da operação, lembra que o BNDES trabalha com subsídios, o que cria a necessidade de racionar os recursos disponíveis. Diz ele: "Isso torna a instituição excessivamente poderosa para escolher ganhadores".

Werther Santana/AE
Manifestação em São Paulo
O governo tenta condicionar financiamentos a criação e garantia de empregos

O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, informa que, para 2009, o banco já tem desembolsos previstos de 92 bilhões de reais em todas as áreas da economia. Segundo ele, o que está em curso é um esforço transitório. "A crise bancária está se estendendo por mais tempo do que se imaginava", diz. "Por isso, o banco tem de suportar provisoriamente os investimentos das empresas. Queremos que o mercado retome esse papel e que o banco possa se retirar desse lugar." Espera-se que o futuro confirme essa intenção. Ela confere ao BNDES o papel adequado, de funcionar como um instrumento que os economistas definem como anticíclico – ou seja, que entra em ação para compensar a retração de recursos privados para investimento e se recolhe quando a situação se normaliza. Isso já aconteceu no passado recente. Em 2006, o mercado de capitais tornou-se o maior financiador do setor produtivo, investindo mais que o dobro do crédito proporcionado pelo BNDES. É um cenário que não se verificará tão cedo. Mas é vital que as medidas tomadas para enfrentar a crise não criem o ambiente propício para a perpetuação de um intervencionismo que já se mostrou nefasto.

 

UMA MINA DE DINHEIRO*

Em 2008, o BNDES desembolsou 91,5 bilhões de reais, 40% mais que no ano anterior. A maior parte foi para projetos industriais 41% para a indústria

39% para infraestrutura
12% para comércio e serviços
6% para agropecuária
2% para outros projetos

*Dados setoriais até novembro
Fonte: BNDES

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