O empresário Jorge Gerdau gosta de números. Se você não tiver como anotar, vai se perder na conversa. No debate sobre se o Brasil está se desindustrializando ou não, ele está com o primeiro grupo. E tem um número para provar: o déficit comercial do setor de manufaturas foi de US$ 92 bilhões no ano passado, cinco anos atrás era de US$ 20 bilhões. Ele não culpa o câmbio, mas o complexo sistema de impostos embutidos.
Gerdau é um dos donos de uma siderúrgica que tem 49 usinas em 14 países e é também da Câmara de Competitividade, que no governo tenta implantar mais eficiência na gestão pública e um modelo de mais competitividade para a economia brasileira.
- O setor industrial brasileiro é muito produtivo e tem baixa competitividade - diz.
Parece contraditório, mas o que ele está dizendo é que, no caso que conhece bem, o aço, o Brasil é o terceiro mais produtivo do mundo, em termos de custos e eficiência de produção, mas é o segundo mais caro do mundo quando entra o preço final. E fica mais caro pelos impostos e preço de energia.
No custo da energia, nas várias usinas que a Gerdau tem na América do Norte - Canadá e Estados Unidos - o preço varia do menor nível por volta de US$ 31 e US$ 33 por MWh, em Cambridge e Midlothian, até US$ 76 em Jacksonville. No Brasil, os preços mais baixos são os da Siderúrgica Riograndense, US$ 76. O mais alto é US$ 126, em Divinópolis. As diferenças ficam ainda maiores quando se compara o custo do gás.
O aço brasileiro tem o terceiro menor custo de produção em bobina a quente e o quarto menor em vergalhão. Quando entram na conta os tributos em geral, inclusive impostos sobre investimento, o produto do Brasil fica mais caro do que os de China, Rússia, Turquia, Estados Unidos e Alemanha.
Dos impostos no Brasil, todos reclamam. Na sexta-feira, tomei café da manhã com Gerdau, na quinta-feira, passei seis horas no Morro Dona Marta em debates e entrevistas. O presidente da Associação de Moradores, José Mário Hilário dos Santos, apontou uma moradora que, no mesmo momento que eu, subia de bonde ao alto do morro. Ela carregava uma sacola com arroz e feijão que havia acabado de comprar.
- Ela pagou de impostos naquele arroz e feijão o mesmo que você, que é moradora da Gávea. Você acha justo? A sua rua é varrida, as árvores são podadas, você tem todos os serviços - disse.
Os impostos indiretos são injustos por serem exatamente o que José Mário falou: o mesmo para qualquer consumidor independentemente do nível de renda.
O empresário e conselheiro de competitividade do governo brasileiro acha que é injusto o exportador pagar tanto imposto escondido no produto e competir com outros países que desoneram a produção e o investimento. Por isso, encomendou estudo para saber quanto há de imposto num carro estrangeiro que chega ao país e num carro produzido e vendido aqui:
- Nós temos que decidir se queremos ter indústria ou não. Para muita gente não é tão visível esse processo, porque o empresário fecha a fábrica, importa, dá uma tropicalizada e vende aqui.
Transparência no que se paga de impostos é tão importante para um empresário quanto para o morador de uma área de periferia. Disse a Gerdau que seria importante ter transparência de todas as isenções que alguns setores industriais recebem e outros não, tarifas diferenciadas de energia, subsídios dos empréstimos do BNDES. Não se tem transparência no Brasil nem no que o Estado nos cobra nem no quanto ele nos dá. Em vez de uma reforma tributária, o governo tem distribuído favores e isenções para setores escolhidos. Isso é que tem criado mais distorção.
Gerdau admite que uma política industrial precisaria olhar para todos os fatores de competitividade:
- Educação, por exemplo, é fundamental. O que torna uma empresa ou um país competitivo é a cabeça do seu povo. Vou te dar um exemplo. Sabe quanto tempo os funcionários da Siderúrgica Rio Grandense levam para desligar, descarregar e religar o forno? Oito minutos. Quanto leva a siderúrgica da Colômbia? Vinte minutos. O processo é complexo, mas com método e mão de obra qualificada conseguimos reduzir esse tempo. Não podemos ter uma população educada no nível que o mundo exige hoje com apenas 2,7 horas de aula efetiva por dia. O brasileiro tem que estudar mais porque eu quero competir com a Ásia.
Depois da educação, o segundo fator mais importante de competitividade é, na opinião de Gerdau, a logística. Segundo a conta dele, o custo da logística brasileira é de 14% a 15% do PIB. Nos Estados Unidos, é 6,5%.
A hora em que a gente se perde na conversa com ele é quando começa a desfilar números do impacto de imposto sobre imposto em cada produto, como PIS, Cofins, IOF, ICMS, INSS. Enfim, a lista é grande, os números se acumulam. No caso dos custos trabalhistas, ele lembra que é preciso diferenciar o dinheiro que vai para o trabalhador, como FGTS, do imposto mesmo que incide sobre a folha.
- Não faz sentido cobrar imposto sobre intermediação financeira, como há no Brasil. Do spread, 27% é IOF. Pense no imposto embutido no empréstimo para capital de giro. Se contar o tempo que leva da retirada do minério até ficar pronto o produto final são quase seis meses que a empresa leva para ver de volta o dinheiro.
Gerdau acha que tudo isso tem que ficar mais claro para todos os contribuintes. E nisso estamos todos de acordo.