O Estado de S.Paulo - 19/04/12
As recomendações do FMI para o Brasil, divulgadas no seu Panorama Econômico Mundial, são pouco inovadoras e estão no mínimo atrasadas. O Fundo pede cautela com a política monetária para evitar um superaquecimento da economia, que não existe e só ele vê. Há ainda a contradição de recomendar ao Brasil e aos países emergentes maior concentração de esforços na expansão do mercado interno, pois não devem contar com um crescimento de apenas 3,5% da economia e do comércio mundial este ano, mas, ao mesmo tempo alertam para os riscos do "superaquecimento"...
"Os emergentes devem estimular a demanda interna, mas evitar um "superestímulo" à atividade econômica," diz o Fundo, textualmente.
Cabem aos países desenvolvidos crescer, acrescenta, mesmo sabendo que, à exceção dos Estados Unidos, eles não estão fazendo nada; ao contrário, adotaram políticas que levam à recessão.
E nós? Vejam só. No caso do Brasil, o FMI recomenda cautela com o corte de juros porque podem exacerbar a demandar e provocar "reaquecimento..." "O crédito elevado e o crescimento das importações sugerem que os riscos de superaquecimento não estão completamente sob controle e poderiam ressurgir se o fluxo de capital retornar aos níveis anteriores,"afirma textualmente o Fundo.
Mas ele não está prevendo um crescimento do PIB de apenas 3% este ano? Onde está o risco de "superaquecimento?" Há muita contradição nisso tudo.
Atrasado. Tudo indica que a análise e alertas do FMI se baseiam em fatos passados que há muito deixaram de existir. Não há no segundo trimestre do ano, nenhum, absolutamente nenhum sinal de "superaquecimento" no Brasil. Ao contrário, está evidente que as políticas monetária e fiscal no fim do ano passado foram de tal forma restritivas, que a economia simplesmente estagnou nos últimos meses.
A previsão do BC, quase sempre correta, é de que, em fevereiro, o PIB "cresceu" apenas 0,23%; no bimestre janeiro-fevereiro de 2011 e 2012, nada mais que 0,08%. Onde estão os riscos de "superaquecimento"que os economistas do Fundo estão vendo no Brasil?
É evitar a recessão. Ao contrário do que eles afirmam, o desafio atual do governo é crescer um pouco mais para evitar a recessão. Já estamos tendo um trimestre negativo, como mostram os indicadores preliminares de março.
O próprio Fundo admite em seu relatório que as taxas agora estimadas para este ano e o próximo são apenas 0,1% (erro estatístico como aquele 0,08%?) acima das projetadas em janeiro. Ou seja, estagnação.
De novo a pergunta que não se cala: onde estão os riscos de superaquecimento que exigem "cautela?" A inflação? Ora, ela até desacelera auxiliada pelo câmbio. Não deve passar de 5% este ano, está em torno de 4,5%, o que, afirmam economistas respeitáveis como Paul Krugaman, não é de todo indesejável em economias ameaçadas pela recessão, nas quais a proridade é crescer.
É preciso ousar mais. Ao contrário do que o FMI preconiza, a equipe econômica precisa ousar mais. É evidente que as medidas tributárias e fiscais adotadas nos últimos meses não foram suficientes para retomar o crescimento. A redução dos juros sozinha não bastou.
O que falta? Mais investimentos do governo para complementar os do setor privado, que enfrenta crescentes probelmas internos. Falta uma política comercial e industrial menos dispersiva que não podem estar separadas. E aqui o papel do Estado é essencial. Tudo indica que os governos federal, estadual e municipal investem pouco não tanto por fata de recursos, mas pelos entraves burocráticos.
Que venham os tsunamis. O que o Brasil precisa no momento é mais incentivo não só à demanda interna, que ainda sustenta a economia, mas investimentos internos e externos também. Que venham os tsunamis de dólares que irrigam a economia, criam empregos e produção. Estariam muito mal sem eles, agora que a outra fonte de recursos, a balança comercial, definha.
E continuarão vindo, sim, não por causa do aumento de liquidez externa, mas simplesmente porque o Brasil se imunizou contra crises financeiras e tem há anos uma política econômica consistente e confiável.