O Estado de S.Paulo - 15/04/12
Fora o desastrado encontro entre a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e o ministro Guido Mantega, na terça-feira, o corte nas taxas de juros anunciado pela Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil (BB) ainda não produziu efeito nos bancos privados. O presidente da Febraban, Murilo Portugal, entregou documento com 20 propostas e avisou: "A bola agora está com o governo". Ou seja, se seus pedidos não forem atendidos, não haverá queda nos juros. No dia seguinte, Mantega deu bronca, falou grosso, chamou os bancos de "campeões do spread" e avisou: o governo não vai reduzir os impostos e o corte dos juros terá de sair da margem de lucro dos bancos. Se nenhum dos lados cede e o clima hostil predomina, não há entendimento e tudo fica como antes.
A não ser que a estratégia anunciada pela Caixa e o BB produza o efeito pretendido: correntistas migrem em massa para os dois bancos públicos e pressionem os privados a também cortar juros para não perder mercado. O que não é fácil, mas também não é impossível.
Vez por outra o governo usa os bancos públicos para forçar a queda de juros nos privados, mas sem êxito. Justamente porque as taxas baixas funcionam temporariamente e, mesmo assim, de forma seletiva, aplicadas a uns poucos, deixando de fora a maioria dos clientes - empresas e pessoas físicas. Para essa nova estratégia vingar, é fundamental que o corte seja para valer, não de mentirinha, e que seja abrangente, não excludente. Do contrário, quando a poeira baixar e o assunto morrer, tudo volta a ser como antes e todos os bancos - privados e públicos - continuarão com lucros tão altos quanto seus spreads. Já ocorreu mais de uma vez.
Só que agora a estratégia trouxe uma boa novidade: pela primeira vez a Caixa alardeou a decisão de baixar juros em campanha publicitária na TV, comprometendo-se explicitamente com um público mais amplo. Se aplicá-la de forma massiva, pode, sim, tirar clientes dos bancos privados, aumentar o faturamento e compensar a queda da taxa com ganhos de escala. Mas, se repetir o passado, restringir o corte a poucos felizardos e fazer da exceção a regra, o banco e o governo ficarão desmoralizados e desacreditados diante dos correntistas. E aí continuarão ganhando todos os bancos - públicos e privados - no campeonato mundial de spread.
Sempre que o Banco Central (BC) altera a taxa Selic, a imprensa publica o ranking de juros no mundo e o Brasil figura no primeiro lugar em juros altos. A Selic cai, mas as taxas dos bancos não. O ministro Mantega lembrou, na quinta-feira: os bancos captam dinheiro a 9,75% ao ano e emprestam a 30%, 40%, 50% e até 80%, dependendo das linhas de crédito. É realmente exorbitante. Mas o ministro omitiu a responsabilidade do governo nisso: entre impostos e compulsório (dinheiro que os bancos são obrigados a recolher ao BC), o governo é responsável por 26,04% do spread. Só que a margem de lucro dos bancos é mais gorda (toma 34,15% do spread) e tem espaço para baixar. Mas será com pressão política de Dilma e Mantega?
Empresas e bancos tomam decisões pressionados por fatores de mercado, de queda ou aumento das vendas, de perdas ou ganhos diante da concorrência. A pressão política pode até funcionar, mas por pouco tempo, logo volta ao que era antes. Por isso a estratégia da Caixa e do BB tem chance de sucesso. Se levada com competência, reforçar a campanha publicitária e impuser perdas aos bancos privados, aos poucos ela pode reverter a posição do Brasil de rei de juros altos. Mas o governo precisa ajudar, saindo da cena e deixando as forças de mercado agirem. Tem razão o presidente da Febraban ao dizer que o tema juros precisa "sair da agenda política" (faltou acrescentar "eleitoreira"). Mas ele perde a razão quando condiciona o corte nas taxas ao atendimento dos interesses dos bancos.
Antes os banqueiros condicionavam a queda dos juros à aprovação do cadastro positivo pelo Congresso. Cadastro aprovado, desde 2010, os juros não caíram, até subiram. Aí eles passaram a responsabilizar os impostos, a inadimplência, o compulsório...