O ESTADÃO - 23/04/12
Como a presidente Dilma pode ter popularidade tão elevada se a população desaprova a gestão do governo na maioria dos setores essenciais? É a questão levantada a partir da pesquisa Ibope divulgada neste mês. Nada menos que 77% dos brasileiros (mais de três em cada quatro) aprovam o modo como a presidente Dilma leva o país. O pessoal também considera a presidente melhor que seu governo, este com 56% de ótimo/bom (20 pontos a menos do que avaliação pessoal de Dilma).Mas o governo tem aprovação maior que a desaprovação em apenas três áreas. Vai bem no combate ao desemprego (53% positivos), à pobreza (59%) e no controle do meio ambiente (53%). Em outras, é reprovado. Nada menos que 65% dos pesquisados desaprovam o sistema de impostos 63% condenam os serviços de saúde e 61% reprovam a segurança pública. E mais: 50% reprovam o combate á inflação (33% aprovam) e 55% condenam os juros (isso medido antes da ofensiva presidencial pela redução das taxas).
O que explica isso? ? A melhor hipótese é simples: falta oposição. Se a população considera ruins os serviços que recebe e, ao mesmo tempo, aprova a presidente amplamente, só pode ser porque não considera Dilma responsável por aqueles problemas. Ora, carimbar a culpa na presidente e no governo é o papel da oposição, em qualquer lugar do mundo.
No caso brasileiro atual, a oposição nem precisa mostrar que setores essenciais não funcionam ? o povo percebe isso. Nem precisa mentir ou fazer uma propaganda enganosa. A responsabilidade é, de fato, do governo federal e da presidente. Por exemplo: juros altos e inflação elevada, isso é política econômica, área exclusiva Ministério da Fazenda e do Banco Central.
Mas neste departamento, a acusação exige que se apresente a alternativa. Não basta apontar um problema que a população já sente. É preciso convencê-la de que há outro caminho para o que ela quer, juros menores e inflação baixinha. E aqui já se vê por que a oposição fracassa. Qual a proposta do PSDB, do DEM ou do PPS?
Líderes e associados desses partidos mostram idéias aqui e ali, mas não se vê nada construído em torno do nome forte da oposição, o candidato à presidência. Este, aliás, quem é? A vez é do senador Aécio Neves, mas vá dizer isso a Serra ....
Além disso, muita gente da oposição até gosta da política econômica de Dilma. O caso do dólar, por exemplo. Nos últimos tempos, ampliou-se muito a classe média que viaja ao exterior, beneficiada pelo dólar barato e pelo crediário farto. Para esse pessoal, ficou quase normal fazer compras em Miami e N.York. Agora, o dólar está subindo - por ação do governo Dilma - e incomodando essa classe média. E não se ouve uma palavra da oposição.
Nos outros quesitos condenados nas pesquisas ? saúde e segurança ? e em educação (48% de reprovação), a coisa é ainda mais complicada. Nessas áreas, a responsabilidade não é apenas de Brasília, mas também dos governos estaduais, muitos dos quais em mãos da oposição. Aqui, portanto, não basta um bom discurso, é preciso mostrar serviço, fazer a diferença.
Por exemplo: as escolas públicas de S.Paulo ou de Minas, os dois mais importantes estados administrados pelo PSDB, há anos, deveriam ser percebidas como muito melhores do que as demais. Idem para polícia, para os hospitais e postos de saúde, mas não é o que se vê. Ou que a população perceba. Não se define uma opção efetiva de gestão diferente e melhor, que possa ser apresentada como o modo tucano (ou democrata) de governar naquelas áreas.
Nem há consistência partidária. Em S. Paulo, por exemplo, o governador Alckmin abandonou políticas educacionais modernas da anterior gestão tucana.
No Brasil, no geral, fica tudo muito parecido, inclusive nas boas iniciativas, sempre isoladas, e que se encontram em gestões dos diferentes partidos.
Tudo considerado, assim como o presidente Lula fazia, sua sucessora consegue capitalizar as coisas boas e escapar das ruins. Capitaliza com intensa propaganda, como no caso do programa Brasil Sem Miséria ? nem começou e já é apresentado na mídia como estrondoso sucesso. Já de uma fila do SUS, não há propaganda que salve, mas como não há oposição que condene, a presidente pode fazer o que faz: bom, o problema é de todos ou dos outros.
Juros? A culpa é dos bancos privados. Dólar? A culpa é do tsunami americano e europeu.
Até com a corrupção. Lembram-se o que Lula dizia do mensalão? É coisa que todo mundo faz.
E que tal a CPI do Cachoeira? Parece que vai pelo mesmo caminho: a corrupção é de todos.
Juros bancários . A coluna da semana passada ? Guerra aos banqueiros ? trouxe algumas imprecisões nos cálculos sobre os componentes do spread bancário, a diferença entre o que os bancos pagam pelo dinheiro e quanto cobram nos juros ao cliente final.
A base dos cálculos está correta, mas cabem algumas correções, a partir de dados oferecidos por especialistas do setor financeiro.
Assim, numa taxa de juros de 50% ao ano, para o cliente final, o lucro do banco, a margem líquida, nas condições atuais, ficaria em torno de 13,2%. Ou seja, dos juros pagos pelo cliente, 13,2% vão os donos dos bancos. (Na coluna da semana passada, havíamos calculado um pouco mais, 16,3%).
As taxas de juros variam de maneira muito ampla, conforme as diversas modalidades. Podem ir de 0,8% (no consignado) para 9% ao mês (no cheque especial, por exemplo). Os spreads, portanto, variam da mesma maneira.
Mas segundo cálculos do BC, o spread médio em fevereiro passado foi de 28,4%. Nesse caso, a margem líquida dos bancos é de 9,3% - que é mais ou menos o valor informado pelos bancos em seus balanços.
Outro dado, não uma correção, mas um adendo. O compulsório, dinheiro que os bancos obrigatoriamente deixam depositado no BC, está hoje em torno de 10% do Produto Interno Bruto (PIB). Nunca foram tão altos. Isso é uma limitação à queda dos juros, claro, pois reduz a capacidade de empréstimo do sistema financeiro como um todo.
As correções reafirmam o conteúdo de nossa argumentação: que a culpa pelos juros não é só dos bancos, mas também do governo. Impostos e compulsórios elevados limitam a queda dos juros.