Esta edição de VEJA retrata em cores dramáticas as contradições do Poder Judiciário no Brasil, uma hierarquia imperfeita encarregada de interpretar e aplicar leis que, como mostrou a última capa de VEJA, formam um cipoal de abstrações, quando não de absurdos. A revista foca agora os bastidores da Justiça, onde, longe dos olhos dos brasileiros, se trava uma diuturna luta do bem contra o mal, de juízes honestos e heróicos contra seus pares reféns ou cúmplices do crime organizado. Essa contradição chegou ao ápice com a discussão aberta e corajosa sobre a honestidade dos juízes brasileiros sendo feita publicamente pelas mais altas autoridades do Judiciário em Brasília.
"A magistratura hoje está com gravíssimos problemas de infiltração de bandidos que estão escondidos atrás da toga", disparou Eliana Calmon, corregedora nacional de Justiça. "Em quarenta anos de magistratura nunca li coisa tão grave. É um atentado ao estado democrático de direito", reagiu Cezar Peluso, presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que desafiou
a corregedora a citar casos e nomes, sob o risco de fazer generalizações injustas sobre toda uma classe.
Ainda na semana passada, talvez para evitar decidir no calor da polêmica entre Eliana Calmon e Cezar Peluso, o Supremo Tribunal Federal (STF) resolveu postergar sua decisão sobre quais devem ser os poderes do CNJ no trabalho de vigiar e punir juízes, cujas entidades de classe defendem a tese de que o mau comportamento deles só pode ser punido pelas corregedorías de cada instância.
A reportagem de VEJA investigou o que ocorreu com juízes brasileiros flagrados
de maneira inconteste em escândalos de corrupção na última década. Os repórteres rastrearam o andamento de processos criminais de 39 magistrados pegos em operações da Polícia Federal. Dos 39 envolvidos, 31 foram denunciados à Justiça e apenas sete foram julgados. Dos sete, apenas dois foram condenados, mas ainda recorrem da decisão. Só um está preso, Nícolau dos Santos Neto, o Lalau, mesmo assim domiciliarmente. A reportagem nos leva à conclusão de, que, se a impunidade é regra geral para os parlamentares, ela é lei no Judiciário.
Estava passando da hora de o Brasil encarar essa questão, e é ótimo que ela tenha entrado em ebulição. O Poder Judiciário é o garantidor da ordem, do cumprimento dos contratos e da harmonia social mínima necessária para que uma nação marche na direção correta, rumo ao progresso material e social para a maioria de seus cidadãos. Sem justiça funcional, não existem prosperidade nem democracia. Sem juízes honestos e imparciais, não existe justiça.