Mas o plano de Annapolis não levava em consideração a instabilidade do governo israelense e as profundas divisões internas do movimento palestino. Em junho do ano passado, o governo do primeiro-ministro Ehud Olmert, enfraquecido por uma onda de escândalos, ficou sem condições de negociar com os palestinos concessões que os partidos radicais de oposição consideravam inaceitáveis. Preferiu congelar as conversações de paz a ser derrubado por um voto de desconfiança do Knesset.
A Autoridade Palestina, por sua vez, foi enfraquecida pela disputa interna que culminou com o Hamas expulsando o Fatah da Faixa de Gaza, o que obrigou Mahmoud Abbas a transferir a sede do governo palestino para a Cisjordânia. Ao contrário do Fatah, que negocia diretamente com Israel, o Hamas jamais aceitou as premissas básicas do plano de Annapolis - o reconhecimento do Estado de Israel e a renúncia ao uso da violência.
Com as conversações em ponto morto, Israel e Egito fecharam as fronteiras da Faixa de Gaza e o Hamas ficou isolado. Em novembro do ano passado, o governo egípcio tentou promover a união dos movimentos palestinos. Mas, no último momento, o Hamas se recusou a ir ao Cairo, o que aumentou o isolamento do movimento terrorista entre os próprios países árabes, que apoiavam a iniciativa egípcia.
Com o fechamento das fronteiras, as condições de vida de cerca de 1,5 milhão de palestinos que vivem na Faixa de Gaza se deterioraram ainda mais, e isso se refletiu no apoio popular ao Hamas. Uma pesquisa feita em novembro passado mostrou que apenas 16% dos palestinos apoiavam o Hamas, enquanto cerca de 40% apoiavam o Fatah. O problema é que o apoio popular ao governo da Autoridade Palestina também é pequeno. Apenas 20% da população da Cisjordânia apoia a administração de Mahmoud Abbas, considerada frágil tanto por não ter conseguido manter a união do movimento palestino como por não ter avançado nas negociações com os israelenses.
A ofensiva aérea de Israel contra a Faixa de Gaza, provocada pelo recrudescimento dos ataques com foguetes às cidades do país, está provocando uma consequência indesejada pelo governo israelense. Aumenta não só a adesão interna ao Hamas, como amplia a solidariedade dos países árabes ao movimento terrorista.
O governo israelense está mais preocupado com esse efeito do que com o repúdio da comunidade internacional ao que considera uma resposta desproporcional aos atentados terroristas. Reluta, assim, em desencadear uma operação terrestre contra a Faixa de Gaza, necessária para a destruição dos arsenais do Hamas. O Gabinete teme que suas tropas acabem "atoladas" nos acampamentos de refugiados, envolvidas em uma guerra pouco convencional que a campanha contra o Hezbollah mostrou não ser o forte do Exército israelense - o que acabaria numa matança indiscriminada de civis. Esse seria um preço político alto demais a pagar por uma improvável derrota militar do Hamas.
É por isso que, nos últimos dias, a retórica do governo israelense mudou. O ministro da Defesa, Ehud Barak, por exemplo, não descarta qualquer tipo de ação, mas observa que Israel nada tem contra a população palestina. Seu objetivo declarado é anular a capacidade ofensiva do Hamas. Indo das palavras à ação, abriu as fronteiras para a passagem de ajuda humanitária e os ataques aéreos estão sendo precedidos de avisos à população local para que abandone as imediações dos alvos visados.