Blog Noblat
Antes mesmo de 2009, começa a ressaca das compras que o governo incentivou a população a fazer para fingir que a recessão mundial é, claro, coisa do mundo e, como o Brasil não é desse mundo, está livre.
Na última terça-feira, no Recife, o presidente Lula atribuiu a "proeza" ao fato de não ter morrido antes de completar 5 anos de idade e, assim, se tornado "uma coisa encrenqueira" a impedir que a crise desembarque por aqui.
Os contêineres da encrenca já passaram pelo cais, conforme comprovam índices que vêm sendo divulgados nos últimos dias, inclusive o de que industriais estão pessimistas e esperam menos negócios nos próximos meses.
A concatenação de fatos sem qualquer elo visível se tornou normal nos discursos presidenciais. Ao misturar mortalidade infantil com a quebradeira planetária e o messianismo de a tudo derrotar apenas pela virtude individual de ser "uma coisa encrenqueira", zombou do mar de carnês a fazer marolas nas contas das famílias.
Rememora o "Plante que o João garante" com o "Finja que sou um ninja". O Super-Encrenca vai reavivar os mercados através da força do pensamento, salvar montadoras com estrelas mágicas e vitaminar o setor imobiliário americano por raios. Afinal, o herói anticrise é o sol, o sal da terra, o céu da popularidade, o super.
Os chistes divertem a platéia de comissionados, fazem gargalhar os autores das obras inacabadas, mas não alcançam quem está pendurado nos bancos.
O casal que passou meses economizando para viajar ou o empresário que precisa quitar dívidas em moeda estrangeira não acha a menor graça no valor verdadeiro do dólar, bem acima da cotação oficial.
Os bordões não incomodam os agiotas, estabelecidos ou clandestinos, que tanto lucraram nesse 2008 que demorou demais a acabar e termina com nova anedota presidencial, contada também no Recife.
Lula se comparou a Barack Obama. Um havaiano, um pernambucano.
Tudo bem. Ninguém riu. Aí, exagerou. Incluiu na comparação Evo Morales, o que garfou a Petrobras. Ninguém entendeu. Só os comissionados riram.
No mundo sem crise, as utopias vão se realizar em 2009, conforme Lula lembrou: estarão no poder o primeiro negro a presidir os Estados Unidos, o primeiro índio no comando da Bolívia e o primeiro metalúrgico presidente do Brasil.
Enquanto isso, na sala de justiça, a barafunda do herói foi deglutida como os demais pronunciamentos. Não se perguntou que relação existe entre governar um país, com todas as complexidades, e pertencer a determinada etnia ou, numa época da vida, ter exercido certa profissão.
Durante a campanha, Obama não se vangloriou de ser afrodescendente, por não ver mérito ou demérito nisso. O próprio Lula passou mais tempo ao microfone que ao redor de um torno. Portanto, estão no poder políticos, não minorias raciais, operários ou heróis.
O que tudo isso tem a ver com sua prestação que vence no início de janeiro? Nada. Mas a barafunda se disseminou tanto que pode até ter tudo.