Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, janeiro 02, 2009

Autorretrato Durão Barroso


Petr David Josek/AP
"Há no Brasil uma visão injusta sobre os subsídios agrícolas
da Europa"


O presidente da Comissão Europeia (braço executivo da União Europeia), José Manuel Durão Barroso, tem laços afetivos com o Brasil. Seu pai nasceu no Rio de Janeiro, onde seu avô tinha um armazém, no início do século XX. Representante dos interesses de 27 países, Barroso defende maior participação do Brasil nas decisões globais, como disse, em viagem pelo país, ao editor Ronaldo França, da sucursal de VEJA no Rio de Janeiro.

O senhor, filho de um brasileiro, se sente ligado ao Brasil?
Muito. É uma coisa única o tipo de relação humana que se estabelece no Brasil. Tenho um primo que mora no Rio e vejo que ele conhece todo mundo, quando vamos a um botequim. É como se fossem aldeias dentro de uma cidade. Não há esse tipo de convivência nas cidades europeias, embora sejam menores do que o Rio. Gosto tanto daqui que ainda acabo me candidatando a prefeito do Rio...

O senhor chegou a morar no Brasil?
Não, meu pai voltou para Portugal antes disso. Mas eu e meus irmãos sempre líamos as revistas O Cruzeiro e Manchete, que ele assinava. Tivemos sempre uma ligação profunda.

Qual sua visão pessoal do país?
O Brasil tem suas dificuldades no aspecto social, mas também uma atitude de confiança, de querer ultrapassar as dificuldades. A miscigenação racial lhe confere um encanto, e também uma posição mundial que pode ser valiosa. O Brasil é uma ponte. Estabelece uma ligação entre o norte e o sul. Há duas grandes democracias nas Américas: Estados Unidos e Brasil.

Como o senhor vê a pretensão brasileira de entrar para o Conselho de Segurança da ONU?
A União Europeia não tem uma posição definida sobre a reforma do Conselho. Portanto, não temos uma opinião sobre a entrada do Brasil. Pessoalmente, fui o primeiro não-brasileiro a defender a entrada do Brasil no Conselho, em 1993. Posso dizer apenas que existe uma boa vontade geral em relação ao país.

Pode-se dizer o mesmo em relação ao fim dos subsídios agrícolas e às barreiras de importação?
As pessoas não se dão conta, mas somos o principal parceiro comercial do Brasil no mundo. Cerca de 25% das exportações brasileiras são para a Europa. Investimos mais no Brasil do que em todos os demais países do Bric juntos. Há no Brasil uma visão um pouco injusta nesse tema. Não se comenta que nossas tarifas industriais, por exemplo, são mais baixas. Veja o caso do vinho. Enquanto Portugal cobra apenas 8%, o Brasil taxa em 35%. Por isso os preços são tão proibitivos aqui.

O etanol tem melhores chances?
Houve um grande debate na Europa, em razão dos problemas que alguns biocombustíveis causam ao meio ambiente. O caso mais citado foi o do que é feito a partir do milho, nos Estados Unidos. Mas nós adotamos uma posição favorável. Os combustíveis renováveis serão 10% de nossa energia nos transportes a partir de 2020, desde que com base em critérios de sustentabilidade.

São recorrentes as críticas à ineficiência brasileira para proteger a Amazônia. O senhor as partilha?
Tenho certeza de que o país quer dar uma resposta a essa questão da proteção à Amazônia. Nossa posição é de respeito integral à soberania. Não quero que pareça saudosismo colonial, mas custou muito aos portugueses manter intacta toda aquela imensa área. Então ela é brasileira. É surpreendente um país pequeno como Portugal estar na origem da definição do território deste imenso país que é o Brasil.

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